Saúde e Bem-Estar

Sandrah Guimarães, especial para Gazeta do Povo

Pelo SUS e planos de saúde: o que muda com as novas regras do atendimento médico online

Sandrah Guimarães, especial para Gazeta do Povo
05/02/2019 15:36
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Veja o que muda com novas regras para consultas, diagnósticos e cirurgias à distância. Foto: Pixabay

Diagnósticos à distância já são autorizados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) no Brasil, mas a nova resolução (2.227/2018) do conselho, que será publicada nas próximas semanas, amplia o leque de possibilidades e permite que os profissionais médicos realizem consultas, diagnósticos e até mesmo cirurgias online.
A regra entra em vigor dentro de três meses e a mudança visa reduzir a distância entre os médicos e os pacientes, especialmente porque a maioria dos profissionais especialistas está concentrada em grandes centros urbanos.
O médico e representante no Paraná do Conselho Federal de Medicina, Donizete Dimer Giamberardino Filho, reforça que a última resolução sobre o tema era de 2002. Nesses 17 anos, as mídias e a comunicação evoluíram muito em tecnologia, com médicos e pacientes usando consultas online sem modelamento. A regulamentação da telemedicina era, portanto, mais do que necessária.

“A nova resolução foi discutida durante 18 meses antes da publicação para melhorar e adaptar o exercício da medicina. O Brasil é um país de muitas desigualdades e a telemedicina traz melhorias como mais acessibilidade, redução do tempo de  diagnósticos e tratamentos com maior precisão. Os encaminhamentos online evitam que pacientes fiquem indo de um lado ao outro”, afirma o médico. 

Quando a bancária Adalgiane Borges da Silva Gondek, de 30 anos, precisou de atendimento para a filha, Isabella, de um ano e nove meses, que estava com febre alta, a única alternativa foi buscar pelo atendimento presencial — embora a telemedicina, na opinião da bancária, poderia ser melhor.
“Eu acho que o atendimento à distância é uma opção maravilhosa e facilita por você não precisar se deslocar para receber atendimento. No ano passado, por exemplo, minha filha estava com 38° de febre e a gente teve que sair daqui de Araucária e  ir a uma clínica em Curitiba para esperar mais de uma hora e meia pelo atendimento. Isso é muito frustrante porque quanto maior é a demora, maior é o tempo de diagnóstico e maior o perigo. Essa oportunidade de falar com um médico sem sair de casa ou até na hora que chegar à clínica já facilita muito.”
Adalgiane Borges da Silva Gondek, mãe de Isabella, concorda com o atendimento médico à distância . Foto: Arquivo pessoal.
Adalgiane Borges da Silva Gondek, mãe de Isabella, concorda com o atendimento médico à distância . Foto: Arquivo pessoal.

Telemedicina: como funciona?

No Brasil, a Telecárdio foi primeira empresa a atuar com diagnósticos à distância. Começou em 1993 e hoje tem sedes em São Paulo e no Rio de Janeiro. A ideia foi trazida de Israel, onde o atendimento era prestado diretamente ao paciente. Por aqui, o serviço é prestado por meio de clínicas, unidades de saúde e hospitais. Ao receber os pacientes, médicos plantonistas enviam laudos e exames para cardiologistas, pneumologistas, neurologistas e oftalmologistas da Telecárdio. O diagnóstico é repassado em minutos.
Era uma mudança muito importante e necessária. Muitos países da Europa e dos Estados Unidos já deram essas permissões para o atendimento à distância. Mas a velocidade na mudança na lei brasileira nos surpreendeu. Esperávamos  para daqui dois ou três anos. Isso vai permitir um atendimento completo,  com consulta, diagnóstico e prescrição, inclusive em  procedimentos de emergência”, avalia Alexandre Pimentel, diretor da Telecárdio.
Às vezes, quando acha que é um AVC, a pessoa busca o posto de saúde em primeiro lugar. Neste caso, é importante que vá direto ao hospital para que o tratamento. Foto: Bigstock.
Às vezes, quando acha que é um AVC, a pessoa busca o posto de saúde em primeiro lugar. Neste caso, é importante que vá direto ao hospital para que o tratamento. Foto: Bigstock.
Pimentel programará o início das consultas online assim que a resolução começar a valer. “Mas na outra ponta será necessária uma estrutura com acessórios médicos de qualidade, câmera de alta resolução e internet de qualidade, tanto em clínicas particulares como em Unidades Básicas de Saúde”, diz ele.
A estratégia é atender a população carente sem acesso a médico, principalmente em localidades mais remotas, indiferente se for particular ou pelo SUS”, ressalta Alexandre Pimentel.
Mas, Donizete Dimer Giamberardino Filho, representante do CFM, reforça que a telemedicina não vai substituir médico presencial por virtual.

“A consulta à distancia não é consulta por rede social. A relação médico- paciente é o valor fundamental da medicina. Não há nada mais importante do que esse contato. A telemedicina é algo complementar para facilitar vida do cidadão e do profissional de saúde.”

“Outro aspecto é a transmissão de informações e conhecimento entre centros maiores e regiões remotas do Brasil. Entre as exigências da nova resolução está uma plataforma de prontuário médico eletrônico com assinatura digital do médico e sigilo das informações. Essa plataforma deve conter dados clínicos, conduta que foi seguida, e os termos de consentimento assinado, tanto pelo médico quanto pelo paciente”, afirma Donizete Dimer Giamberardino Filho.

Diagnóstico rápido

A assistente administrativa, Eloyse Mota Pereira, 36 anos, conta que o pai, de 62 anos, passou dez dias internado, sete deles na UTI. Para ela, é possível o médico ter um diagnóstico e recomendar um tratamento, mesmo à distância:
“No cuidado com meu pai, no hospital, a ajuda de algum especialista para chegar ao diagnóstico mais rápido e acertado teria sido muito importante. Era muito difícil chegar ao hospital e cada médico dar um diagnóstico diferente. Dava a impressão de que não sabiam o que meu pai tinha e que não sabiam o que estavam fazendo. Um médico especialista com um diagnóstico preciso, independentemente de onde ele estivesse, nos deixaria muito mais tranquilos. Ele passou dez dias internado e no final disseram que era pneumonia.”

Para que o governo possa ampliar o atendimento de telemedicina em Unidades Básicas de Saúde, UPAS e hospitais, deverá haver investimentos em estrutura nesses locais para possibilitar o primeiro atendimento com médico presencial, os exames necessários dentro de cada especialidade e um sistema de comunicação eficiente e integrado.

A telecirurgia também será regulamentada. O cirurgião poderá operar mesmo não presente no local. Isso é possível com equipamentos robóticos e tecnologia que pode ser manipulada à distância. A nova resolução também estabelece a teleconferência durante cirurgias, que pode ser feita para fins de ensino ou treinamento de profissionais de saúde.
Para usar os serviços e novas possibilidades na saúde pública, o governo terá obrigatoriamente que se adaptar às exigências e às necessidades apresentadas pela nova resolução.

Críticas das entidades médicas

Apesar do posicionamento favorável do CFM diante da telemedicina, algumas entidades regionais questionam a resolução:
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul, ao lado dos conselhos de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, divulgou uma nota no site que reitera a não participação da entidade na elaboração da medida e que “tem inúmeras críticas e sugestões para a melhor incorporação dessa tecnologia à boa prática médica para a saúde da população”.
Além dessa orientação, o Conselho Regional de Medicina de São Paulo reforça que “discutirá as críticas à resolução com outros conselhos regionais nesta semana, sempre com o objetivo de defender a boa prática médica e a assistência de qualidade a população.”
Já os Sindicatos dos Médicos do Ceará e da Paraíba divulgaram uma nota no site onde solicitam a suspensão imediata da resolução. Dos argumentos, as entidades manifestam preocupação com as “graves consequências à saúde que poderão advir a partir da resolução (…) Os critérios adotados, hoje, durante uma consulta presencial garantem segurança aos profissionais e, sobretudo, aos pacientes, os quais são a verdadeira razão da Medicina.”
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