Saúde e Bem-Estar

New York Times, por Matt Richtel

Infecções urinárias estão cada vez mais resistentes e tratamentos no futuro ainda são incertos

New York Times, por Matt Richtel
06/08/2019 13:00
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Tratamentos para as infecções urinárias, antes fáceis, agora estão cada vez mais escassos (Foto: Bigstock)

Há incontáveis gerações, a infecção urinária, um dos problemas de saúde mais comuns do mundo, é curada fácil e rapidamente com a simples administração de antibióticos.

Entretanto, crescem as evidências de que o problema que afeta milhões de norte-americanos por ano, na maioria mulheres, está se tornando cada vez mais resistente aos remédios.

Com isso, transformam o que já foi um diagnóstico rotineiro em um motivo para hospitalizações mais frequentes, gatilho para doenças mais graves e desconforto prolongado devido à sensação horrível de queimação que o mal gera.
O Departamento de Saúde de Nova York está tão preocupado que, em julho, lançou um aplicativo móvel que dá a médicos e enfermeiros acesso a uma lista de variações da infecção e os remédios a que cada uma é resistente.

A pesquisa que o órgão promoveu descobriu que um terço das variações mais simples, causadas pela bactéria E. coli ou Escherichia coli, o tipo mais comum no momento, já é resistente ao Bactrim, um dos medicamentos mais usados, e que pelo menos 20% delas já eram resistentes a outros cinco tipos comuns de tratamento.

“É uma loucura. E extremamente chocante”, alerta Lance Price, diretor do Centro de Ação à Resistência Antibiótica da Universidade George Washington, que não se envolveu com a pesquisa. A ampicilina, que já foi uma das bases de tratamento dessas infecções, foi deixada de lado, por não ser mais considerada infalível, já que se tornou ineficaz para inúmeras variações. Algumas exigem tratamento intravenoso com antibióticos pesados. Em um estudo publicado no ano passado, pesquisadores afirmaram que um terço de todas as variações infecciosas no Reino Unido é resistente aos “principais antibióticos”.

Infecção urinária: não tão simples mais

Sem dúvida, a experiência de desenvolver uma infecção urinária está cada vez mais distante do que costumava ser para muitas mulheres.
Carolina Barcelos, uma pesquisadora de pós-doutorado de 38 anos de Berkeley, na Califórnia, conta que, quando adolescente, tinha tido diversos episódios de infecção, todos tratados eficientemente com Bactrim. E quando voltou a desenvolver a doença, em fevereiro, seu médico optou pela mesma solução – só que não funcionou.
Quatro dias depois, ela voltou ao consultório para pegar uma nova receita, para um remédio chamado nitrofurantoína – que também não teve efeito. A dor piorou e, dias depois, ela tinha sangue na urina.
O médico então receitou uma terceira opção, a ciprofloxacina, última das três medicações mais comuns para o problema, e fez cultura de sua urina. O resultado comprovou que a infecção era suscetível ao novo remédio, mas não aos dois anteriores.

“Da próxima vez já peço uma cultura logo de cara. Fiquei oito dias tomando antibióticos que não fizeram efeito nenhum para mim”, diz Barcelos.

Vulnerabilidade

Geralmente, as pessoas que estão com o sistema imunológico enfraquecido ou que sofrem de alguma doença crônica são as mais vulneráveis a infecções resistentes, mas a urinária se destaca por ser o maior risco causado por germes resistentes a pessoas saudáveis.

A resistência aos antibióticos se tornou uma das questões de saúde pública mais graves do mundo. O uso excessivo de remédios por humanos e nos animais que consumimos levaram os germes a desenvolver defesas para sobreviver, tornando um número cada vez maior de medicações inócuas no tratamento de vários males – e o fenômeno é recorrente em âmbito mundial com as infecções urinárias.

A Organização Mundial de Saúde (OMS), apesar de afirmar que os dados sobre as infecções urinárias e a resistência aos remédios são “escassos”, diz que o fato de as primeiras serem tão frequentes sugere que a segunda leve a males mais graves e até a fatalidades.
A solução, segundo pesquisadores e médicos, inclui a recomendação contínua do uso mais comedido dos antibióticos. Uma solução parcial seria o desenvolvimento de ferramentas rápidas e baratas que permitissem uma cultura de urina instantânea, para que se pudesse receitar a solução mais adequada.

Resposta está na urina

Uma das soluções alternativas contra a infecção urinária é fazer um exame de urina antes da indicação do antibiótico para escolher o remédio mais adequado ao combate daquela bactéria (Foto: Bigstock)
Uma das soluções alternativas contra a infecção urinária é fazer um exame de urina antes da indicação do antibiótico para escolher o remédio mais adequado ao combate daquela bactéria (Foto: Bigstock)
Esperar ou não os vários dias necessários para a obtenção dos resultados do laboratório é um dilema crucial para médicos e pacientes, geralmente desesperados à procura de alívio. Além disso, dependendo do plano de saúde da pessoa, a cultura pode sair bem cara.
Geralmente, ela não é pedida antes da receita do antibiótico. “Antigamente, a lista de opções era curta, mas, de modo geral, todas funcionavam”, explica James Johnson, professor de doenças infecciosas e principal pesquisador de infecções no trato urinário da Universidade de Minnesota.

Algumas mulheres têm infecções que são combatidas pelo próprio organismo, sem necessidade de remédios; outras podem desenvolver um mal diferente, que parece uma infecção leve, mas não é. A opção mais segura é consultar o médico e tomar uma decisão bem pensada, baseada nas opções e na eficácia dos antibióticos. A ciência não garante a eficiência de remédios caseiros como suco ou comprimidos de cranberry.

O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA diz que as infecções urinárias desenvolvidas por pessoais saudáveis, embora sejam uma preocupação crescente, não são bem estudadas.
Em pessoas mais velhas, elas podem ser fatais, mas o monitoramento nos EUA é tão pífio que não há nem estimativas confiáveis sobre o número de mortes que causam. O CDC publicou uma estimativa de 13 mil por ano, mas esse dado vem de uma publicação que se refere a dados de 2002 e somente às versões adquiridas em hospitais.
Segundo o Clifford McDonald, diretor associado para ciência na divisão de promoção da qualidade de cuidados com a saúde do CDC, o governo dos EUA planeja expandir a pesquisa. “Se não fizermos algo logo, teremos de basear nossos tratamentos em antibióticos mais avançados, o que pode pressionar ainda mais as opções de últimos recursos.
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