Saúde e Bem-Estar

Larissa Roso, Agência RBS

Falta de sexo na velhice contribui para depressão, dizem médicos

Larissa Roso, Agência RBS
27/07/2018 12:00
Thumbnail

Satisfação na intimidade é essencial para a qualidade de vida dos idosos. Foto: Bigstock.

Desfez-se há tempo a ideia de que homens e mulheres que ultrapassavam os 60 anos já eram considerados vovôs e vovós — aposentavam-se, vestiam abrigos e aguardavam o tempo que lhes restava absortos em certa resignação. Hoje, a população, cada vez mais longeva e ativa, busca qualidade de vida para esse tempo extra na terceira idade — que, muitas vezes, estende-se por décadas. Um elemento essencial é a manutenção das práticas sexuais, tratando-se os problemas que vão surgindo. A satisfação nas relações íntimas é fundamental para a saúde física e mental dos idosos.
Mais precoce nos sinais de envelhecimento, o corpo feminino passa pela menopausa (interrupção da menstruação e da produção de estrogênio nos ovários) perto dos 50 anos. Mais tarde, provavelmente antes dos 60 anos, pode ser diagnosticada a síndrome genitourinária, cujo principal sintoma é a secura vaginal, além de infecções urinárias de repetição, ardência para urinar e perda de urina. Segundo a professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Maria Celeste Osório Wender, chefe do Serviço de Gineco-obstetrícia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), a falta de lubrificação é a consequência mais comum da menopausa – contornável com a reposição hormonal. Utilizam-se comprimidos, adesivos, cremes, cápsulas ou géis, dependendo do caso.

Desejo em baixa

A diminuição da libido é outra queixa que se multiplica entre as mulheres mais velhas. Pode estar relacionada a uma discreta queda na produção do hormônio masculino, a testosterona, mas geralmente as causas mais comuns são a falta de parceiro ou um parceiro não estimulante, doenças limitantes dela ou dele, uso de medicações como alguns antidepressivos e baixa autoestima.
“É normal haver uma diminuição na frequência de relações sexuais. O homem tem a libido superior à da mulher ao longo da vida inteira. A redução é proporcional, vai acontecer nos dois, mas como ele tem mais, não fica tão baixa quanto a dela” explica Maria Celeste, participante da mesa-redonda Sexualidade no Idoso da 20ª Jornada de Inverno da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – na Seccional Rio Grande do Sul (SBGG-RS).
“A sexualidade da mulher está muito mais na cabeça, é muito mais complexa, não é como a do homem, que toma um remédio para ficar com ereção e está tudo resolvido. Tem que estar tudo bem com ela, tudo bem com a família, tudo bem com a situação financeira para estar tudo bem” completa a médica.
Há solteiras ou viúvas que, na velhice, optam por não se relacionar mais com ninguém e convivem bem com essa decisão. A falta de desejo sexual, salienta a ginecologista, só é considerada uma disfunção sexual quando a pessoa se sente incomodada e procura ajuda.

Entre os homens, dificuldade de ereção

Entre a parcela masculina da população acima de 60 anos, estima-se que 50% enfrentem algum tipo de problema relativo à atividade sexual. A mais comum entre os latino-americanos, aponta o urologista Claudio Telöken, é, disparado, a disfunção erétil (incapacidade de conseguir ou manter uma ereção).
“Ainda estamos tratando de pessoas com uma educação parca na sexualidade. Sexo, para essa faixa etária, ainda é coito (penetração vaginal). Eles não exploram outras possibilidades. Um dos fatores de risco para a disfunção é a falta de educação” explica Telöken, professor livre-docente da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFSCPA) e chefe do programa de residência médica em Urologia da UFSCPA e da Santa Casa.
Na sequência de problemas mais frequentes, vêm ejaculação precoce, ejaculação retardada, anorgasmia (ausência de orgasmo) e não percepção de comemorativos eróticos (o homem não observa pessoas que poderiam atraí-lo ou não assiste a vídeos de conteúdo sexual, por exemplo, em muitos casos como consequência de uma educação repressora).

Impactos da falta de autocuidado

Essas alterações estão diretamente ligadas a seu estilo de vida no decorrer do tempo — sedentarismo e mudanças metabólicas têm um grande impacto. Maus hábitos, vícios, alimentação não balanceada, obesidade, insônia, ronco com apneia ou doenças não tratadas adequadamente, como o diabetes, podem afetar diretamente a saúde sexual. Como as mulheres, eles também precisam checar os níveis de hormônios e, se necessário, submeter-se a uma regulação.
Encarar um urologista ou andrologista para falar de problemas sexuais é um desafio — até mesmo intransponível — para alguns homens. Muitas vezes, o paciente não se abre, e o médico, por outro lado, não pergunta nada. Uma boa avaliação do médico da família deve incluir a apalpação da genitália e dos mamilos.
“Estamos subdiagnosticando e subtratando” constata o urologista.
Questões de origem sexual também levam à abdicação do convívio social e ao isolamento. Um homem que antes frequentava festas e jantares pode desistir de ir a esses eventos pelo receio de conhecer alguém e a relação evoluir para um estágio de maior intimidade. A repressão familiar — os filhos que rejeitam a ideia de o pai voltar a namorar depois da morte da mãe, temendo uma eventual necessidade de partilha de bens com a madrasta, por exemplo — também contribui para abalar o idoso.
Estar em ambientes onde possa encontrar diferentes gerações, ressalta a sexóloga Carmita Abdo, coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, é altamente benéfico. “Se ele não se mantém ativo, acaba vivendo em torno de uma monotonia, de uma mesmice, não está se atualizando. Isso é muito importante para que ele se sinta fazendo parte da sociedade, e não uma figurinha já fora do álbum, embora, às vezes, prefira ficar em casa vendo um filminho a sair para a festa de aniversário do neto”.

Menos sexo, mais depressão

Assim como a depressão atrapalha a sexualidade, uma vida sexual insatisfatória ou inexistente também acarreta humor depressivo.
“O idoso começa a ficar caseiro, triste. A prevalência de suicídio na idade avançada tem muito a ver com essa parte sexual” alerta Telöken.
A utilização de medicamentos que estimulam a ereção deve ser discutida no consultório, para que interações com outras drogas que o paciente já toma não tragam mais prejuízos — como hipotensão e bradicardia (diminuição da frequência cardíaca) — do que benefícios. Injeções no pênis e próteses penianas ainda são utilizadas, de acordo com a situação.
“Ninguém vai ficar sem tratamento. Existe alternativa para rigidez peniana, melhora de libido e controle ejaculatório. O indivíduo não pode se conformar, ele está neste mundo para ser feliz. Do ponto de vista instintivo, um orgasmo adequado para um idoso de 80, 85 anos é a glória, devolvendo-lhe a alegria de viver” diz Telöken.

Relacionamentos longos; dedicação também

Décadas e décadas de casamento não podem desobrigar o casal de investir na relação. Um relacionamento respeitoso, baseado em trocas, carinho e atenção, é pré-requisito básico para manter a vontade de transar e obter satisfação na cama. Mágoas e ressentimentos que se acumulam e crescem durante os anos, segundo a sexóloga Carmita Abdo, fazem com que os parceiros percam o interesse no sexo.
‘Se casais trabalham essas questões ao longo da vida, vão chegar a uma idade mais madura com o ganho da intimidade. Quem não envelheceu com uma qualidade boa no relacionamento se distancia” afirma Carmita, que também palestrou na jornada da SBGG-RS.
A idade avançada não deve causar constrangimento para que os companheiros procurem um terapeuta, caso não consigam dissolver suas desavenças sozinhos.
“Os pontos de discórdia vão se tornando, às vezes, intransponíveis. ‘Ah, mas já estamos velhinhos, para que fazer terapia?’. Porque a vida vai até os cem” encoraja a sexóloga.
Além de problemas musculares e de articulações, que comprometem a mobilidade e a agilidade, outras mudanças do corpo tornam a relação sexual diferente na terceira idade. Por mais que existam recursos, há de se ter uma certa dose de conformismo para lidar com a queda no desempenho de maneira geral.
Tudo que tem a ver com os sentidos — visão, audição, tato – interfere na sexualidade, pontua Carmita. A menopausa provoca não apenas a secura vaginal destacada pela ginecologista Maria Celeste, do HCPA, mas também a diminuição da sensibilidade da pele, e as parceiras respondem menos às carícias que outrora foram extremamente excitantes. O homem terá necessidade de estímulo tátil para conseguir uma ereção, as ejaculações não serão tão volumosas, e o jato ejaculatório ficará bem mais curto. A duração do intercurso pode diminuir — por desconforto, falta de fôlego ou de potência — ou até mesmo aumentar, já que a mulher talvez leve mais tempo para se excitar. A musculatura das partes íntimas também muda: a vagina fica menos túrgida e mais flácida.
“São mudanças físicas naturais. Às vezes, é difícil as pessoas entenderem que o aparelho genital também envelhece” aponta Carmita.

O que fazer para ter uma vida sexual mais saudável:

– Envelhecer não significa abdicar do sexo. Doenças podem ser tratadas e ter seus efeitos amenizados, e a incorporação de novos hábitos à rotina também contribui para melhorar a prática sexual.
– Procure um médico especialista ou o profissional que o acompanha há mais tempo e tenha uma conversa franca sobre o que está acontecendo. Levar o parceiro ou a parceira ao consultório pode ser um recurso eficiente para os mais retraídos.
– Um casal não deve guardar ou alimentar mágoas, e nunca é tarde para resolvê-las. Sessões de terapia podem ser altamente benéficas.
– Solteiros e viúvos precisam procurar atividades que lhes interessem e estimulem o convívio social, evitando o isolamento. Além dos compromissos familiares, que tal participar de clubes de livros, bailes, grupos de carteado e rodas de chimarrão?
– Manter-se ativo fisicamente é fundamental. Converse com seu médico sobre os exercícios que você pode praticar.
– O uso de remédios para disfunção erétil deve ser precedido de orientação médica.
LEIA TAMBÉM: