
Ouça este conteúdo
O governo brasileiro anunciou um pacote de medidas para apoiar empresas atingidas pelo tarifaço americano. O carro-chefe é um programa de crédito de até R$ 30 bilhões, acompanhado de ações para buscar novos mercados e de um programa de compras governamentais para produtos afetados.
O problema começa na concepção. Toda vez que a área econômica precisa reagir a um choque, a falta de um verdadeiro formulador de política econômica no Ministério da Fazenda salta aos olhos. O presidente Trump anunciou o tarifaço em 9 de julho; a equipe econômica teve mais de um mês para se preparar e, ainda assim, apresentou uma resposta tímida, mal desenhada e atrasada.
O pacote prevê R$ 30 bilhões em crédito, mas não informa qual será a taxa de juros. Isso é amadorismo. Como empresas podem planejar o acesso ao crédito sem saber o custo do financiamento? Além disso, o acesso só será concedido a quem se comprometer a não demitir — medida já testada e fracassada no início da pandemia. Em momentos de crise, empresas precisam ajustar custos para sobreviver. Impedi-las de fazê-lo apenas dificulta a adaptação, prolonga a dor e, no fim, não preserva empregos.
Toda vez que a área econômica precisa reagir a um choque, a falta de um verdadeiro formulador de política econômica no Ministério da Fazenda salta aos olhos
Outro equívoco é o programa de compras diretas pelo governo. Ficam dúvidas: qual preço será pago? Quem arcará com transporte e estocagem? Em vez disso, o governo poderia simplesmente compensar temporariamente parte da diferença entre o preço internacional e o nacional, evitando custos logísticos e incentivando a busca por soluções de mercado.
Há ainda questões técnicas sem resposta: os recursos que retornarem dos empréstimos voltarão ao Tesouro ou permanecerão nos fundos para novos financiamentos? Essa decisão tem implicações fiscais relevantes e deveria estar clara.
Preocupa também a tentativa de retirar os gastos do arcabouço fiscal — expediente próximo à “contabilidade criativa” usada entre 2008 e 2015. Na prática, analistas e investidores calcularão o déficit real, ignorando o número “maquiado” pelo governo. O roteiro é conhecido, e o desfecho, previsível.
Em resumo, o pacote tem tudo para gerar pouco impacto positivo:
- Não define os juros dos empréstimos.
- O governo proíbe que empresas obrigadas a se ajustarem a nova realidade façam uso do socorro estatal no momento que mais precisam.
- Desenha um programa de compras ineficiente e potencialmente oneroso para a sociedade.
Medidas mal planejadas não protegem empresas — apenas desperdiçam recursos públicos.




