Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Adriano Gianturco

Adriano Gianturco

Dados públicos

Comitiva no Vaticano, salário de juízes, sigilos e falta de transparência

lula funeral papa transparencia
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante os funerais do papa Francisco, em Roma. (Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República)

Ouça este conteúdo

Lula levou a maior de todas as comitivas ao funeral da papa Francisco, em Roma, mas a lista divulgada está incompleta. O PL 4.015/2023 permite ocultar salários de juízes e procuradores. Desde 2023, o governo ofereceu várias vezes aviões da FAB para ministros do STF, e colocou parte da lista dos passageiros sob sigilo de cinco anos; Lula aumentou os gastos ocultos e colocou sigilo de 100 anos em seu cartão corporativo. Informação é poder, e o valor das informações é assimétrico: está no fato de tê-las e não compartilhá-las.

Desde as civilizações antigas, os Estados estiveram interessados em coletar e armazenar informações sobre os povos que controlavam. “Todos os Estados foram sociedades de informação”, escreve Peter Burke em Uma história social do conhecimento, pois a geração do poder de Estado pressupõe a reprodução reflexivamente monitorada do sistema, envolvendo a coleta, armazenamento e controle regulares da informação aplicada para fins administrativos.

Informação é poder. É por isso que dispositivos que obrigam o Estado a dar acesso às informações encontram resistência e são de difícil aplicação

A própria escrita nasce exatamente para registrar tudo; os censos também foram criados para coletar informações (no Brasil, é obrigatório responder a ele). Como as paróquias tinham registro de todos os nascimentos, casamentos e mortes dos fiéis, vários Estados como a Holanda, a Espanha, a República de Veneza e a Inglaterra começaram a forçar as igrejas a coletar e repassar informações. Com o surgimento do Estado-nação, houve um enorme aumento do número de burocratas para exercer tais funções. Inicialmente, esses funcionários não tinham “escritórios”; trabalhavam na rua e em casa, e reportavam suas informações aos palácios. Gradualmente, nascem lugares específicos para armazenar essas informações – o prédio onde é hoje o museu dos Uffizi, em Florença,servia para isso originariamente. Embaixadores iam e voltavam; a República Marítima de Veneza criou os embaixadores fixos exatamente para fazerem Relazioni e reportar informações sobre os outros países.

Em 1661, Jean-Baptiste Colbert determinou o censo detodas as árvores para saber quantos navios a Marinha francesa podia construir; explorações geográficas e mapas também se inseriam nesse contexto. O rei Felipe II, da Espanha, era chamado “El Rey Papelero” pelo tempo que gastava lendo documentos. Luís XIV se vangloriava de estar informado sobre todos os afazeres do reino. Afinal, “o que diriam de um pastor que não soubesse a quantidade de suas ovelhas?”, dizia François Fenelon.

Nasceu assim toda uma literatura técnica especializada, chamada political arithmetics na Inglaterra e calcules politiques na França, para gerenciar todas essas informações. Nascem também os Arcana Imperi (segredos de Estado). Ou seja: as informações são coletadas para adquirir poder. Isso quando o Estado não coleta informações sobre a população exatamente para melhor dominá-lo. É por isso que, por exemplo, como lembra James Scott em Against the grain, os primeiros atos das antigas rebeliões eram sempre tomar e queimar os palácios onde ficavam guardados os documentos e os registros. E é por isso que, por exemplo, responder ao Censo no Brasil é obrigatório (pela Lei 5.534/1968).

VEJA TAMBÉM:

Mas quando, por outro lado, os súditos querem informações sobre o Leviatã, a coisa muda completamente!

A ideia de que cidadãos tenham direito a essas informações é bastante recente. O princípio do acesso público às informações foi declarado só com a Revolução Francesa. No Brasil, o Portal da Transparência do governo federal foi criado em novembro de 2004; a Lei de Transparência é de 2009; e a Lei de Acesso à Informação (LAI), de 2011.

Sempre notamos a tendência da política a esconder informações. É natural: informação é poder. É por isso que dispositivos que obrigam o Estado a dar acesso às informações encontram resistência e são de difícil aplicação. É uma luta infinita; a transparência é um ideal, mas o normal é a opacidade.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.