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Agora temos “pobreza energética”. Pode até parecer, mas não foi a Janja quem inventou o termo durante a COP 30; ele existe desde os anos 1990. O fato em si sempre existiu, embora esteja diminuindo; a diferença é que agora temos um termo para “problematizar”! Já há alguns anos se fala também de “racismo ambiental”, “refugiados climáticos” (embora a literatura científica mostre que as causas do fenômeno são muito mais complexas que o clima e envolvem pobreza, guerras, ditaduras, etc.) e “justiça climática”.
Também já inventaram “racismo lúdico” (as piadas sobre negros), “racismo hídrico”, “democracia racial” (a ideia segundo a qual nossas democracias não segregam racialmente), “branquitude crítica” (a análise da posição social de pessoas brancas em sociedades racializadas, reconhecendo privilégios) e “fragilidade branca” (a reação defensiva dos brancos quando confrontados com temas ligados a racismo) e “letramento racial” (cursos dos militantes sobre o tema). Tudo, claro, porque você tem de se “descontruir”. Afinal, você já sabe, “racismo reverso” não existe.
O debate público virou uma metralhadora de blablablá, um gerador automático de sinalização de virtudes
A lista não termina aí: também se fala em “gender pay gap”, “safe space”, “pobreza menstrual” (uma onda que Tábata Amaral surfou), “masculinidade tóxica” (por sorte ainda não nos consideram todos tóxicos a priori), “estuprador potencial” (nesse caso, sim, é a priori mesmo, e vale para todos os homens) e “fragilidade masculina” (é como a “fragilidade branca”, mas para homens). Os mais velhos devem se lembrar da “pink tax”, a ideia – errada – segundo a qual os produtos femininos seriam mais caros por culpa do patriarcado. Nem comento, porque não tenho “lugar de fala”!
De forma geral, temos “apropriação cultural”, “invisibilidade social”, “capacitismo”, “etarismo”, “violência simbólica” (ah, essa insistência dos neomarxistas de chamar tudo de “violência” exceto a verdadeira violência...), “gentrificação” e sua variante “gentrificação cultural” (quando elementos culturais de grupos periféricos são apropriados, despolitizados e transformados em produto por grupos mais privilegiados).
É bom você se atualizar sobre “colonialismo digital” (a ideia de que grandes empresas e países tecnologicamente dominantes exercem colonialismo, controlando plataformas, infraestrutura e dados), “extrativismo de dados” (empresas que coletam e monetizam dados pessoais sem transparência nem compensação) e “desigualdade algorítmica” (como sistemas de contratação que desfavorecem grupos minoritários, algoritmos de crédito que penalizam bairros pobres, e sistemas de reconhecimento facial que erram mais com pessoas negras).
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Na economia, de forma geral, temos “green economy” e “economia circular” – o reaproveitamento sempre existiu, mas faltava um nome bonito. Lembram-se da “economia compartilhada”? Como se antes ela não fosse compartilhada... e não se esqueça do “capitalismo consciente” e da “economia solidária”, sempre partindo do pressuposto de que a economia e o capitalismo são egoístas e malvadões.
A direita inventa pouco, falta-lhe imaginação. Às vezes até tentou, como no caso das “fake news”: o termo foi inventado por Donald Trump, mas tomado pelos outros e revertido! Ao contrário, a direita roubou o termo “politicamente correto”, que hoje é usado como crítica.
O debate público virou uma metralhadora de blablablá, um gerador automático de sinalização de virtudes em que essas expressões são usadas à vontade e cada militante adolescente ao redor do mundo inventa uma por mês! Mas o impacto disso na sociedade é enorme.
O trabalho de desmentir é mais custoso que o de inventar, e ficamos na defensiva contra uma enxurrada de lero-lero militante
Já vi gente procurar no Google o que é “racismo lúdico” e “racismo ambiental” (claro, caíram nesses grandes portais cujas redações estão cheias de militantes) como se fossem fatos objetivos. As pessoas não entendem a diferença entre conceitos científicos e palavras de ordem. Esses slogans delimitam e condicionam o pensamento, que se destrincha como quando, em uma revista de passatempos, as crianças ligam os pontinhos e surge uma imagem! Junte os pontinhos da “justiça climática”, do “gender pay gap”, do “colonialismo digital” e das “fake news”, e aparece o socialismo como solução!
O nível da discussão está baixíssimo, eu sei, mas é assim que o debate público é pautado: o trabalho de desmentir é mais custoso que o de inventar, e ficamos na defensiva contra uma enxurrada de lero-lero militante.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos




