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Alan Ghani

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Tarifas

Governo brasileiro não tem moral para falar do protecionismo de Trump

O presidente dos EUA, Donald Trump: protecionismo para defender trabalhador americano. (Foto: Ludovic Marin/EFE/EPA/POOL)

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Não há dúvidas dos ganhos de produtividade da globalização. A teoria econômica, a experiência internacional e a evidência empírica acadêmica mostram como a globalização torna os preços das mercadorias mais baratos e traz ganhos na atividade econômica, ao fomentar o comércio internacional e o investimento entre as nações.

Mesmo com esses ganhos, muitas empresas e governos passaram a repensar seus processos produtivos, principalmente após a pandemia e a eclosão da guerra entre Rússia e Ucrânia.

No caso da pandemia, a disrupção das cadeias produtivas levou muitas companhias a migrarem suas fábricas para mais perto de seus mercados consumidores (nearshoring). A ideia é: se ocorrer novamente uma pandemia, ou qualquer problema de restrição ao comércio internacional, as empresas estarão mais próximas de seus consumidores, enfrentando com menos dificuldade a falta de insumos de produção ou os desafios logísticos.

Evidentemente, tirar uma fábrica da China, cuja mão de obra é bem barata, traz elevação de custos para a multinacional. No entanto, a empresa não pensa apenas em custos, mas também leva em conta a minimização dos riscos logísticos e da cadeia de suprimentos. 

Com relação ao conflito entre Rússia e Ucrânia, a motivação de se “produzir dentro de casa”, em vez de importar, foi menos econômica, e mais estratégica e geopolítica. 

Por exemplo, para a Alemanha, do ponto de vista econômico, era extremamente vantajoso importar gás natural barato da Rússia. No entanto, num conflito geopolítico, a falta de energia pode se tornar uma arma poderosa contra outro país, como de fato ocorreu entre Rússia e Alemanha. 

Nesse contexto, alguns países procuram formas de produzir bens dentro de casa, principalmente aqueles considerados mais estratégicos, como energia e alimentos, em vez de importar de outra nação, mesmo com a consequência negativa de elevação de preços ao consumidor final.

Porém, independentemente da motivação, seja ela econômica ou geopolítica, produzir internamente pode trazer elevação de custos manufatureiros, elevando o preço da mercadoria para a população.

Sob essa lógica, ocorrem os acordos de livre-comércio entre as nações. Cada país se especializa na produção daquilo que ele tem vantagens comparativas em relação aos demais, importando mercadorias dos outros países a preços mais competitivos. 

Considerando um comércio entre Brasil e Alemanha, o Brasil exportaria avião e produtos agrícolas, enquanto importaríamos carros e produtos farmacêuticos.

A ideia é que cada país canalize recursos e se especialize naquilo que faz melhor, fomentando o livre comércio entre as nações. Essa troca, que tem suporte na teoria econômica e na evidência empírica, traria ganhos para os países envolvidos, como aumento da atividade econômica (geração de renda e emprego), e produtos mais baratos e acessíveis para os consumidores de cada nação. 

É claro que, para os acordos de livre comércio prosperarem, é necessário não ter barreiras protecionistas, e nem subsídios internos, para determinados setores da economia.

Apesar do avanço da globalização ao longo da história, materializado no aumento do comércio internacional, migração de capitais e empresas entre países, e formação de blocos econômicos, esse processo está longe de ser um jogo justo entre as nações.

Sob esse contexto, Trump tem reclamado de barreiras protecionistas contra os EUA, elevando taxas de importação para o México, Canadá e China. De fato, vários países, como o Brasil, adotam tarifas superiores às taxas praticadas pelos americanos.

Por outro lado, as menores barreiras de importação nos EUA possibilitaram ganhos extraordinários para o consumidor norte-americano ao longo de décadas. Mesmo com o dólar alto, é mais barato comprarmos alguns produtos nos EUA (roupas, eletrodomésticos e eletrônicos) do que aqui no Brasil.  

Como explicar essa diferença de preço se ambos importam as mesmas mercadorias da China? A diferença é que um celular montado na China chega com muito menos imposto nos EUA do que no Brasil, tornando os valores mais acessíveis no varejo americano. 

Mas não é somente a tarifa de importação que explica os preços mais elevados no Brasil comparativamente a outros países. Mesmo os produtos fabricados no Brasil, por vezes, conseguem ser mais caros do que os importados internamente ou adquiridos nos EUA. 

Não é para menos. A produção brasileira é muito cara.

Impostos elevados, excesso de burocracia, altas taxas de juros, insegurança jurídica e encargos trabalhistas tornam o processo produtivo oneroso no Brasil

E todos esses problemas passam pelo tamanho gigantesco do Estado.

Assim como não há dúvidas de que as mercadorias brasileiras são caras, também é certo que a adoção de tarifas protecionistas nos EUA encarecerá os produtos para os consumidores norte-americanos. Porém, este é um problema deles. 

O que é inadmissível é o Brasil, sendo um dos países mais protecionistas do planeta, reclamar das tarifas de Trump, quando o governo por aqui não faz a sua própria lição de casa.

Em vez de reclamar de Trump, a classe política poderia agir para reduzir o tamanho do Estado. Com um Estado mais enxuto e menos endividado, seria possível reduzir impostos e juros, tornando os preços dos produtos brasileiros mais competitivos no Brasil e no exterior. 

Infelizmente, esse governo caminha na direção contrária ao desenvolvimento econômico. A maioria das políticas tende a aumentar a arrecadação, inchar o Estado, conceder subsídios setoriais para os amigos do rei, e mais protecionismo, como ficou evidente no caso da taxação das “blusinhas da China”. Enquanto isso, é o consumidor brasileiro quem paga a conta do atraso da mentalidade estatizante.

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