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Em recente artigo publicado no jornal O Estado de S.Paulo, o ex-presidente Michel Temer disse, com razão, que o povo está cansado da radicalização. Quer a discussão das ideias. “Quer saber o que o candidato pensa sobre o país e o mundo. Quer projeto de poder. Quer programa. Quer poder dizer, por meio do voto, se concorda ou não com o projeto político oferecido. No fundo, quer respeito pela cidadania”.
Temer captou a demanda da sociedade. O Brasil está preso a um círculo vicioso de radicalização que tem pouco a ver com ideias, programas ou projetos de longo prazo. O que se observa, com desalentadora frequência, é uma disputa personalista, onde figuras políticas se tornam totens de devoção cega ou alvos de demonização absoluta. A cada eleição, os embates se intensificam, as redes sociais inflamam-se, e a paixão militante atropela a necessidade de um debate racional sobre o futuro do país. Vive-se um clima de crispação ruidosa, mas estéril.
O Brasil atravessa um momento delicado de sua história política e social. A polarização, mais do que uma saudável divergência de ideias, tornou-se um campo minado de ressentimentos, paixões exacerbadas e maniqueísmo rasteiro. A lógica do “nós contra eles” empobrece o debate, sufoca o pensamento crítico e impede o florescimento de soluções eficazes para os desafios estruturais que assolam o país. Mais do que nunca, precisamos de estadistas que pensem grande, que projetem o Brasil do futuro, e não de políticos de ocasião que se alimentam da discórdia e da divisão.
O Brasil se fragmenta em bolhas de pensamento homogêneo, onde a discordância é tratada como traição e o debate é reduzido a um jogo de soma zero. Isso enfraquece o tecido social
A política, quando reduzida ao embate personalista, perde seu caráter essencial de serviço público. Em vez de projetos e programas de longo prazo, o que se vê é a construção de narrativas populistas, baseadas no medo e na indignação seletiva. Isso gera um círculo vicioso no qual os extremos se retroalimentam, impedindo qualquer possibilidade de consenso mínimo em torno de pautas estruturais. A disputa política deveria ser travada no campo das ideias, mas, lamentavelmente, tornou-se uma guerra de torcidas organizadas, onde a verdade importa menos do que a fidelidade a líderes personalistas.
O Brasil precisa urgentemente de uma agenda de país, de um planejamento sólido que vá além do calendário eleitoral. Investimentos em educação, ciência e tecnologia, infraestrutura, segurança pública, o desenvolvimento sustentável da Amazônia, devem ser tratados como políticas de Estado, e não como meros instrumentos de barganha política. A polarização cega impede que o país avance nesses temas cruciais, pois qualquer iniciativa vinda do lado oposto é automaticamente rejeitada, não pelo seu mérito, mas por sua origem. Isso é um desserviço à nação.
O que se observa, na prática, é uma política pautada pelo espetáculo e pela superficialidade. A ascensão das redes sociais exacerbou esse fenômeno, transformando o debate público em uma arena de likes, memes e frases de efeito, onde o radicalismo rende mais engajamento do que a argumentação séria. O pensamento reflexivo e a busca pelo entendimento dão lugar a linchamentos virtuais e cancelamentos seletivos, sufocando qualquer possibilidade de diálogo produtivo. É o triunfo da retórica beligerante sobre a argumentação sólida.
Mais preocupante ainda é o fato de que essa radicalização não se restringe ao campo político. Ela se infiltra nas famílias, nas amizades, nos ambientes de trabalho e nas universidades, criando muros onde deveriam existir pontes. O Brasil se fragmenta em bolhas de pensamento homogêneo, onde a discordância é tratada como traição e o debate é reduzido a um jogo de soma zero. Isso enfraquece o tecido social e mina a possibilidade de construção de consensos mínimos para o progresso do país.
O verdadeiro estadista é aquele que compreende que governar exige diálogo, negociação e a busca incessante por pontos em comum. Infelizmente, essa figura tem se tornado rara na política nacional. O que se vê são líderes que apostam no divisionismo como estratégia eleitoral, preferindo manter seus seguidores em permanente estado de alerta contra um inimigo fabricado. Esse tipo de liderança não constrói, apenas destrói.
O Brasil precisa de estadistas, e não de incendiários. Precisa de construtores, e não de demolidores
Mais do que nunca, o Brasil precisa de maturidade política. Isso significa abandonar o culto a personalidades messiânicas e focar na construção de um país que ofereça oportunidades reais para todos. O desenvolvimento sustentável e a justiça social não virão de slogans ou da simples negação do outro, mas da capacidade de trabalhar juntos, superando diferenças em nome do bem comum.
A polarização exacerbada é um entrave ao progresso. Enquanto persistirmos nesse jogo de extremos, perderemos tempo precioso que deveria ser empregado na formulação de políticas públicas eficazes e na construção de um futuro próspero para as próximas gerações. Como bem lembrou Aldo Rebelo, “é preciso retomar o desenvolvimento econômico, científico, tecnológico, social, combinados com a projeção de poder diplomático e militar em harmonia com nossas legítimas aspirações nacionais”.
O Brasil precisa de estadistas, e não de incendiários. Precisa de construtores, e não de demolidores. O tempo da polarização estéril precisa chegar ao fim. O futuro do país depende disso.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos




