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Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado| Foto:

A “janela partidária”, tempo em que deputados têm o direito de mudar de partido (ou, melhor dizendo, de legenda), foi ocasião de mais de 80 trocas. Isso acontece porque na verdade o pertencimento a partidos é uma palhaçada sem qualquer sentido político (no bom sentido) ou social. O que se diz serem partidos, no Brasil, nada têm a ver – com raras e desonrosas exceções na extrema-esquerda – com as aglomerações de pessoas unidas pelo pertencimento a um determinado ponto de um espectro ideológico que, na teoria, eles seriam. Já tivemos partidos de verdade, mas os governos militares fizeram o desfavor de desmontá-los todos. Assim, apenas os de extrema-esquerda ainda infernizam a vida nacional, mormente por terem forte apoio da mídia e da academia, que – ainda por culpa dos militares, conforme escrevi semana passada – estão firmemente na mão desses extremistas.

Hoje essas aglomerações, politicamente falando, são uma fantasia. Pior ainda: são um meio de conseguir mais e mais verbas públicas, desde dinheiro derramado fartamente para propaganda e outros fins, favorecendo os mais poderosos e desfavorecendo os menores – o que por si já seria o oposto da justiça –, a mecanismos indecorosos de favorecimento imoral de um candidato sobre outro, como o tempo de televisão proporcional ao poder do partido e o nefando voto de legenda. Hoje é perfeitamente possível, numa eleição proporcional, ser de longe o mais votado e não levar o cargo, pela simples razão de não estar no partido “certo”. Por outro lado, um puxador de votos monumental, como costumam ser os raríssimos candidatos de direita a que se permite participar da política (lembro do finado dr. Enéas) e os atores e demais artistas (Clodovil, Tiririca…), leva consigo uma boa meia dúzia de eleitos, muitos dos quais sem ter nem sequer um punhado de votos. O Enéas levou consigo até mesmo uma nulidade completa que se fazia chamar de “Senhorita Suely”, que se não me engano não teve mais que cinco votos. Eleger uma deputada federal com cinco votos é um escárnio à população votante.

Quando aparece um partido de verdade, na política do Brasil de hoje, há sério risco de ele se tornar, como ocorreu com o PT, uma quadrilha antes que um partido. Outros, como o PMDB e a chusma de legendinhas de aluguel que vive de sugar as fartas tetas do erário, são a seu modo quadrilhas, só que de outro tipo. Existem apenas para fazer coligações e garantir mais verbas, mais tempo de tevê, mais privilégios imorais, indecências pelas quais paga o contribuinte, no bolso, e o país, na moralidade pública que se desmancha como bruma pela manhã. “Posição no espectro ideológico” para eles é uma piadinha de que se ri nas reuniões, e olhe lá. Provavelmente muitos políticos nem sabem que deveriam ter uma, na teoria do século passado que ainda orienta a lei brasileira. Para eles, política é puxar e emendar ao orçamento para satisfazer o próprio eleitorado e ter bastantes pontes e bicas d’água para inaugurar, enquanto se enche os próprios bolsos e se conquista uma gorda aposentadoria para passar o resto da vida servindo-se dos bolsos aparentemente inesgotáveis da viúva. Como teria dito um bispo renascentista europeu, “os pobres são uma mina de ouro”…

Por outro lado, temos bancadas informais que funcionam. A heroica bancada antidesarmamentista, que corre contra a corrente das verbas vindas das multinacionais e dos megacapitalistas, a bancada evangélica, a bancada ruralista, a bancada dos direitos humanos e muitas outras existem e funcionam. Pois é isso que os partidos políticos deveriam se tornar. A legislação brasileira deveria parar de reconhecer partidos, parar de dar privilégios a partidos (salinha maior e carro extra pra “líder de partido”? Por favor!), parar, em suma, de fingir que eles existem de verdade. Nosso espectro político, na verdade, não tem representação real no Legislativo federal, que dirá no espectro pseudoideológico partidário. Temos uma população majoritariamente conservadora, e não há um partidinho conservador que seja, nem pra remédio. Por outro lado, os aderentes porcentuais da extrema-esquerda contam-se nos dedos de uma mão, e há vários partidos dedicados a esse público (ainda que eles sejam muito dados a brigar entre si, o que ajuda a explicar a situação). Para piorar, a maioria de picaretas (como cantaram os Paralamas do Sucesso, citando um presidiário hoje famoso, há na Câmara dos Deputados “300 picaretas”) adere sem pudor algum até mesmo a partidos de extrema-esquerda, como foi o caso do PT no seu auge, desde que seus interesses, muitas das vezes escusos e opostos aos do próprio eleitorado, sejam beneficiados.

Eliminar o reconhecimento legal de partidos implicaria de imediato em uma boa economia para os cofres públicos. Não há razão alguma para pagarmos pela propaganda de quem já está no poder! Em um segundo momento, na primeira eleição superveniente já teríamos uma representação proporcional menos desproporcional, ao retirar do voto de legenda o poder de entortar os resultados em benefício de quem tem o rabo mais preso. Seria talvez possível, pela primeira vez em muitos anos, eleger deputados que não estivessem já de antemão envolvidos nos conluios medonhos da sujíssima política intrapartidária brasileira. No longo prazo, imagino, ocorreria uma cristalização das atuais bancadas, em torno de interesses reais, que, aliás, no mais das vezes pouco têm a ver com as ideologias que tanto estrago fizeram no século passado.

Não faz sentido algum dar força ao fenômeno ideológico, que enquanto durou foi superficial no nosso país. O que se tem hoje de ideológico na política partidária são alguns poucos dinossauros mal enterrados da extrema-esquerda, que não se conformam com o fim das ditaduras do Leste Europeu e querem instaurar o mesmo modelo falido aqui. Não funciona e nunca vai funcionar, pela própria cultura do país. Não se faz uma revolução comunista, não se instaura uma ditadura do proletariado sem uma massa crítica ideologizada que aqui nunca houve e nunca haverá. Se tomássemos todos os adeptos da extrema-esquerda, no Brasil inteiro, e déssemos – o horror! – um fuzil para cada um, eles continuariam sem capacidade nem sequer de enfrentar os policiais militares de folga naquele momento. Eles são poucos, e nossa cultura não ajuda, graças ao bom Senhor Deus, a cair no engodo deles. O estelionato político de um Lula é demasiadamente superficial para gerar guardas de campo de concentração ou milicianos em quantidade bastante para expurgar gente como eu e, imagino, caro leitor, como você.

Há ainda, quase como piada, uma ou outra tentativa de criar um partido liberal, do extremo oposto do espectro ideológico, pregando um capitalismo puro e duro. O finado Álvaro Valle tentou por muitos anos; seu partido exigia até mesmo cursinho da ideologia liberal para os membros, mas acabou sendo vendido ao Edir Macedo para servir de legenda de aluguel. Agora temos o Partido “Novo” (“novo”, a palavra “novo”, é o nome do partido. O marqueteiro deles deve ser parente do monoglota que inventou o nome de outro partidúnculo que tenta surgir, o “Cons”, que em francês é um palavrão grosseiramente equivalente ao nosso “babacas” e em inglês significa “estelionatários”). Mas tudo isso não apenas é uma piada, na prática, como revela apenas que há, sim, muita gente que quer entrar para a política, que quer fazer uma diferença, e não consegue devido à barreira composta pelos partidos políticos. Para se candidatar ao que quer que seja hoje em dia a pessoa precisa entrar para uma dessas sujas aglomerações. Muitas vezes os chefetes partidários exigirão pagamentos por fora; mesmo que não o façam, ao participar do mesmo partido que figuras nefastas da política o próprio candidato potencial já atrela o nome e a reputação aos deles. Só isso já basta para afastar muita gente boa. E poucas coisas ajudariam mais a política brasileira, neste momento de dificuldade, que tentar eleger apenas gente de fora, gente que não esteja metida com os crápulas que dominam a política federal e, no mais das vezes, estadual. Para isso é preciso tirar do caminho essa palhaçada imoral que faz chamar de “partidos”. Chega. Vamos para a frente; deixemo-los no século 20, onde eles fizeram algum sentido.

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