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Janja quer regular redes como na China e isso é ainda pior do que você imagina

Em meio a escândalos e viagens, governo Lula é desaprovado pela maioria dos brasileiros
Em meio a escândalos e viagens, governo Lula é desaprovado pela maioria dos brasileiros (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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Na entrevista publicada ontem pela Folha de S.Paulo, Janja verbalizou de forma explícita o desejo que há anos é sugerido nos bastidores: o governo Lula quer importar o modelo chinês de regulação das redes sociais. A primeira-dama afirmou que, no país asiático, “se não seguir a regra, tem prisão” e questionou: “Por que é tão difícil a gente falar disso aqui?”. A frase, dita sem rodeios, é mais do que uma opinião pessoal, é a admissão de um projeto político que está em curso. Durante anos, o petismo disse que seu modelo de regulação das redes era o inglês.

Em 18 de outubro de 2019, neste mesmo espaço da Gazeta do Povo, alertei sobre esse risco na coluna “Black Mirror: como a China vigia cidadãos e o que o Brasil está fazendo”. Na ocasião, mostrei como o governo brasileiro já preparava o terreno legal para implementar mecanismos semelhantes aos do regime comunista chinês, como a coleta de dados biométricos, o armazenamento da forma de andar de cada pessoa e outras informações sensíveis. Eram mudanças aparentemente técnicas, escondidas sob camadas de linguagem burocrática. Mas o objetivo sempre foi claro: controle.

A diferença entre democracia e ditadura não está apenas na existência de eleições. Está na liberdade de cada cidadão de falar, pensar, discordar e ser ouvido. Quando essa liberdade é substituída por algoritmos estatais, pontos sociais e censura preventiva, o que se tem é um sistema de controle total

A China não tem apenas uma regulação severa sobre conteúdos e plataformas. Tem um sistema de vigilância e punição social baseado em pontos, como se fosse um videogame macabro. Milhões de chineses são impedidos de viajar, matricular os filhos em boas escolas, conseguir empregos ou mesmo usar o transporte público por terem dito algo “errado” na internet. E não apenas eles. Suas famílias também sofrem consequências, mesmo que concordem com o governo. É esse modelo que a primeira-dama quer trazer para cá.

Se antes o governo Lula fingia buscar um “modelo europeu” ou “britânico” de regulação, agora a máscara caiu. Janja quer censura com prisão. Não estamos mais diante de um debate sobre moderação de conteúdo ou proteção à infância. Estamos falando de uma proposta que, se levada adiante, transformará o Brasil em um laboratório de autoritarismo digital. A justificativa, como sempre, é a proteção das crianças. Mas o problema que ela aponta não será resolvido pelo modelo que defende. Só será resolvido um outro problema: o da impopularidade do governo.

O grave é que as bases jurídicas para que se construa algo assim estão sendo plantadas há anos e em todos os governos, de forma silenciosa. Em 2019 se flexibilizou o nosso direito a dados biométicos importantes. Como a maioria não entendia do que se trata, simplesmente calou. Os políticos sabiam, mas sempre estiveram mais preocupados em defender políticos do que em defender a liberdade dos cidadãos. Assim foram se sedimentando as bases para o PT deitar e rolar agora que voltou ao poder.

Janja conta com dois tipos de aliados. O primeiro é o militante luloafetivo: tudo o que Lula diz é automaticamente racionalizado. Se Janja propõe censura, é pela proteção das crianças. Se ela fala em prisão, é pela vida. Esse tipo de militância é incapaz de diferenciar crítica democrática de ataque político. Acredita que a liberdade de expressão é um obstáculo e não um pilar da democracia.

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O segundo grupo é mais nocivo: é a bancada do “eu já sabia”. São aqueles que se dizem críticos do governo, mas relativizam cada novo avanço autoritário com frases como “o PT sempre foi assim”, “isso não vai dar em nada”, “eu já sabia lá atrás”, “eu avisei”, “faz o L”. Fingem que não há novidade e, com isso, ajudam a banalizar o inaceitável. Transformam a exceção em regra e a ameaça em tédio. Creio que alguns têm boa intenção mas esbarram na própria precariedade intelectual ao tentar compreender o mundo e expressar ideias. No entanto, todos sabemos onde está cheio de boas intenções.

A diferença entre democracia e ditadura não está apenas na existência de eleições. Está na liberdade de cada cidadão de falar, pensar, discordar e ser ouvido. Quando essa liberdade é substituída por algoritmos estatais, pontos sociais e censura preventiva, o que se tem é um sistema de controle total. E, como disse naquela coluna de 2019, uma vez entregue a liberdade, não há devolução. Não se perde liberdade aos poucos: ou se luta por ela todos os dias, ou ela desaparece.

A sociedade brasileira precisa escolher agora. Não estamos mais no campo das suposições. A proposta está colocada com todas as letras. E o que está em jogo é simples: ou mantemos a liberdade de todos, ou aceitaremos viver sob a vigilância permanente de quem se acha mais iluminado que o resto da população.

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