
Já falei algumas vezes que a intenção do blog é discutir as velharias, clássicos e cults do cinema. Mas reconheço que ficar alheio ao que está rolando atualmente na telona é difícil. Por isso, a cada semana vou trazer um post de um filme que está em cartaz. Assim, ao menos o valor do ingresso vale mais a pena. 🙂
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Alguns meses atrás terminei de ler Cidades da Planície, do escritor norte-americano Cormac McCarthy. O livro, em resumo, trata da rotina quase banal de um grupo de vaqueiros em uma fazenda no Texas e integra a chamada “trilogia da fronteira” do autor. Como de praxe na obra de McCarthy, antes do fim do livro algum personagem – ou vários – vai sofrer. E muito. Sem que, na última página, haja um suspiro de redenção, para oferecer ao leitor um final feliz típico. E foi isso que me incomodou quando devolvi Cidades da Planície à estante. O desfecho foi, realmente, um baque. Fiquei quase deprimido ao dar de cara com o destino de certo personagem que havia acompanhado nas últimas semanas. O que, ao meu ver, é positivo. Mostra que o livro “me pegou” mesmo. Despertou alguma emoção real. Mesmo que tenha sido desesperança.
Assim, não foi por coincidência que lembrei de Cidades da Planície ao assistir na telona O Conselheiro do Crime (The Counselor), obra dirigida por Ridley Scott com roteiro original de Cormac McCarthy. Scott, não custa lembrar, é o diretor de filmes consagrados como Alien, o Oitavo Passageiro (Alien, 1979), Blade Runner, o Caçador de Androides (Blade Runner, 1982), Thelma & Louise (1991) e Gladiador (Gladiator, 2000). O Conselheiro do Crime foi o primeiro roteiro escrito por McCarthy diretamente para o cinema, o que, antes do lançamento, jogou as expectativas quanto ao filme para o alto — o escritor, de 80 anos, é uma das poucas unanimidades atuais entre os críticos, sendo considerado um dos maiores autores americanos vivos. Outras de suas obras já foram adaptadas — com sucesso, diga-se de passagem — para a telona, como o oscarizado Onde os Fracos Não Têm Vez (No Country for Old Men, 2007) e A Estrada (The Road, 2009).
Em entrevistas, Ridley Scott reconheceu que O Conselheiro do Crime é um filme mais de McCarthy do que do próprio diretor — o que, desde os primeiros minutos, fica evidente. Os longos e inspirados diálogos, que às vezes desbancam para profundas conversas filosóficas — que até parecem deslocadas levando em conta os personagens que as proferem — são marca registrada do escritor. Estes mesmos diálogos, também recheados de relatos verbais sobre violências quase inconcebíveis, ajudam a instaurar no filme uma permanente sensação de tragédia anunciada, como se, a qualquer momento, o universo glamourizado dos personagens vá desmoronar e levar todos para um abismo de dor e arrependimento. Trágico, não? Em se tratando de McCarthy, não poderia ser diferente.
“Pela força bruta do material, deixei McCarthy ser o meu mestre. Segui o roteiro como se eu fosse um músico executando uma partitura”, relatou Scott em entrevista à jornalista Elaine Guerini, do Estado de São Paulo — leia o interessante artigo aqui. Em resumo, o filme trata da história de um advogado (o tal “conselheiro” do título) que, motivado pela ganância e também pela ingenuidade, se envolve com o narcotráfico, colocando em risco não só a si mesmo, mas às pessoas ao seu redor. O elenco é grandioso. O advogado é vivido por Michael Fassbender, sua noiva, por Penélope Cruz. Javier Bardem faz o parceiro de negociata do advogado, Brad Pitt é o intermediário na negociação e Cameron Diaz é a mulher do personagem de Bardem, uma autêntica e perigosa dama fatal como há tempos não se via no cinema.
A opção de Scott em se manter fiel ao roteiro original tem seu lado bom e ruim. O clima de tensão permeia todo o filme, por meio de uma violência que é muito mais sugerida do que explícita. Há quase uma fórmula aí. Em dado momento, os personagens conversam sobre as barbaridades que os cartéis mexicanos são capazes de fazer. E, logo, tais atos são evocados em parte na prática, restando ao espectador recorrer à imaginação para completar o quadro macabro que a conversa anterior evocava. Por outro lado, a trama é bastante linear: não há nem sequer um clímax visível ao final, como é comum em outras produções do gênero. Não espere reviravoltas, explicações ou, muito menos, um hapy ending. Ao fim, a tal tragédia anunciada desde o início se cumpre, como era esperado. E é isso.
O crítico Paulo Camargo, da Gazeta do Povo, relatou que O Conselheiro do Crime acabou longe de ser o grande filme que todos esperavam – incluindo aí público, críticos e a própria indústria. “É uma obra desigual, imperfeita, ainda que tenha momentos brilhantes – com o tempo, talvez até ganhe aura cult”, escreveu, em um artigo para a Gazeta. O crítico Alexandre Fernandez, da Folha, foi mais ácido, chamando o filme de um “thriller vazio, cheio de inverossimilhanças“, com “inúmeros diálogos pouquíssimo convincentes sobre sexo ou decisões morais”.
A impressão que tenho é que O Conselheiro do Crime será execrado por quatro em cada cinco espectadores. Justamente por não ser um thriller convencional e despertar, como falei lá no início, uma inevitável sensação de desesperança após a sessão. Uma pena, porque aí também reside a principal força da obra. Saímos do cinema tensos, chocados até. E com o filme na cabeça. O que, por si só, já é raro hoje em dia.
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E aí, já foi conferir O Conselheiro do Crime no cinema? Qual seu veredicto sobre o filme? Comente aqui no blog!
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