Opinião

Dos soldados de Napoleão aos Alpes Suínos

13/10/2022 20:01
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A pilhagem aos cofres públicos no Brasil é ampla, geral e irrestrita porque os partidos políticos sobrevivem no poder sendo autossustentáveis através da corrupção. Sem nenhuma exceção. Embora os “bem intencionados” se justifiquem com o argumento de que a lei é para os fracos e desprovidos de poder, sendo tolerável passar por cima da ética e da moralidade se existir um fim mais elevado.
A questão da autossustentação dos partidos políticos no Brasil se parece com a extrema penúria do exército de Napoleão Bonaparte quando invadiu a Itália em 1796. Muitos de seus 42 mil soldados marchavam sem sapatos e se vestiam em trapos roubados dos camponeses locais. Sem recursos, a estratégia de Napoleão para vencer a guerra era tornar o seu exército autossustentável, com a pilhagem altamente organizada. Para se ter uma ideia, os franceses também elevaram o roubo de obras de arte a um nível até então incomparável: Napoleão tinha especialistas qualificados para avaliar que pinturas os soldados deviam roubar. Telas famosas de Ticiano, Rafael, Rubens e Leonardo da Vinci foram enviadas ao Museu do Louvre. Em cidades incapazes de fornecer obras de arte, joias, dinheiro e ouro deixaram os soldados de Napoleão com uma vida de nababos. Se antes passavam fome, agora os achacadores exigiam as melhores carnes e os melhores vinhos da Toscana. Tinham mais dinheiro do que podiam gastar.
Os partidos políticos no Brasil aprenderam tudo o que sabem com Napoleão Bonaparte. Não com o Código Napoleônico – o código civil francês que regulamenta, entre outras coisas, os bens e a aquisição de propriedades -, mas com os métodos de dominar o poder de forma autossustentável.
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Nos altos dos Campos Gerais, acima de São Luiz do Purunã, os falatórios da campanha eleitoral no rádio e na televisão não chegam muito bem sintonizados. Principalmente quando se trata de corrupção, com muitos dos nossos cofres públicos do Brasil sendo enterrados na Suíça.
— Tesouro escondido nos Alpes Suínos? – pergunta o caboclo, que não entendeu bem a fala do locutor da Rádio Central de Ponta Grossa.
— Alpes Suíços! – corrige outro peão, mais letrado e rodado.
Com as chamas aquecendo a água para o chimarrão, os peões envoltos em capas, sentados em banquinhos, vão proseando enquanto sorvem o mate. Com o rádio ligado, um assunto puxa outro e a caboclada começa a desenterrar tesouros do fundo da imaginação.
— Não entendo porque andar tão longe para esconder tanta riqueza. Aqui perto de Castro, lá no Capão do Cemitério é que tem um lugar bem ajeitado pra enterrar o dinheiro.
– Não é nenhum cofre de banco, não tem chave nem senha, mas só a pessoa certa é que pode desencavar a fortuna.
– Nos Campos Gerais sempre foi assim. Os tesouros têm uma guarda, uma visagem. É um escravo da guarda que despista os procuradores de panela.
— Aqui perto tem uma panela enterrada na antiga Fazenda da Viúva, no caminho da tropa que ligava Ponta Grossa a Curitiba.
— Diziam os antigos que a viúva era muito rica e, quando por lá passavam os tropeiros, todos queriam roubar a fortuna da dona da casa.
— Pois eu sei um pouco diferente. Muito bonita, vinham viajantes do Brasil e do mundo para casar com a viúva. Daí que o “dinheiro da viúva” entrou na boca do povo como se fosse dinheiro do governo.
— Vocês acreditam em tudo...!
Essas visagens de riqueza não prestam.
— Pois eu sempre soube que não presta é compadre dormir com comadre, senão vira boitatá!
— São histórias pra criança dormir. Quando eu era piá, também diziam que não prestava andar de costas, nem brincar com terra, senão morria a mãe da gente!
— O que não presta mesmo é roubar dinheiro da viúva e esconder nos Alpes Suínos.
— Alpes Suíços, compadre! Suíços!