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O ministro Alexandre de Moraes finalmente fez o que tanto desejava: decretou a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Prisão domiciliar, é verdade, mas, ainda assim, uma prisão. A decisão é uma aberração jurídica sob todos os ângulos possíveis, a ponto de tirar do silêncio vários advogados e juristas garantistas envergonhados, que estavam convenientemente calados diante dos abusos, cada vez mais escandalosos, de Moraes no Supremo Tribunal Federal (STF). Desta vez, muitos não conseguiram mais passar pano.
A seguir, listo as 4 principais ilegalidades da decisão de Moraes que mandou prender Bolsonaro:
1) Prisão decretada de ofício
Moraes decretou a prisão de ofício, sem qualquer pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), o que é flagrantemente ilegal e deveria causar um escândalo midiático. O art. 311 do Código de Processo Penal é claro: a prisão só pode ser decretada “a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial". As medidas cautelares diversas da prisão, às quais Bolsonaro estava submetido, também só podem ser aplicadas a pedido do Ministério Público, conforme o art. 282, §2º, do CPP. Moraes decidiu de forma frontalmente contrária à lei.
2) As medidas cautelares impostas a Bolsonaro são ilegais
A base para a prisão domiciliar de Bolsonaro foi o suposto descumprimento da medida cautelar que o proibia de usar redes sociais, inclusive por intermédio de terceiros. Antes de discutir o mérito, é preciso destacar a (má) qualidade das decisões de Moraes: confusas, mal escritas e repletas de erros de português. É difícil compreender o que o ministro quer dizer, e ele frequentemente se contradiz, seja dentro da mesma decisão, seja entre decisões distintas. A segunda decisão, que tentou esclarecer o alcance das medidas após Bolsonaro mostrar a tornozeleira à imprensa, continuou confusa e mal redigida.
Além disso, o art. 319 do CPP prevê um rol taxativo de medidas cautelares alternativas à prisão. No entanto, Moraes tem criado medidas sem amparo legal, como a proibição do uso de redes sociais — o que é duplamente ilegal e inconstitucional: ilegal por ausência de previsão legal (violando o princípio da legalidade), e inconstitucional por violar a liberdade de expressão e impor censura prévia. Outro problema dessas medidas é que não foram fundamentadas individualmente em relação à sua necessidade, adequação e proporcionalidade. Está tudo errado.
Na nova decisão, Moraes também proibiu Bolsonaro de usar celular e de receber visitas, exceto a de advogados e de pessoas previamente autorizadas por ele. Mais uma vez, não houve fundamentação específica para cada medida. Falta pouco para proibir Bolsonaro de existir - e quando vier essa proibição, virá, é claro, sem fundamentação. Basta querer. O império da lei e o Estado de Direito que se danem. Constituição? Nem se recorda mais o que é isso. O que importa é a vontade de quem manda. Obedece quem tem juízo e ainda assim pode ir pra cadeia - de um jeito ou de outro, não há mais liberdade.
3) Prisão domiciliar sem respaldo legal
Moraes criou um novo paradigma jurídico ao decretar prisão domiciliar sem que houvesse antes uma prisão preventiva. O art. 318 do CPP estabelece que a domiciliar substitui a preventiva em casos excepcionais, como grave enfermidade ou idade avançada. Mas como decretar a domiciliar sem ter decretado a preventiva antes? A opção direta por uma modalidade de prisão não prevista em lei escancara o caráter político da decisão. Moraes provavelmente evitou mandar Bolsonaro para um presídio temendo inflamar ainda mais o país e aumentar a tensão em Brasília. Moraes está “cozinhando o sapo” lentamente, aumentando a temperatura da água lentamente, para evitar uma reação.
4) Ausência de provas de descumprimento intencional
Deixando de lado a redação problemática das decisões e as medidas cautelares confusas, não há provas de que Bolsonaro tenha violado as restrições de forma intencional. Em uma decisão, Moraes afirma que era evidente que Bolsonaro estava proibido de dar entrevistas se fossem divulgadas nas redes sociais; na seguinte, diz que nunca o proibiu de conceder entrevistas ou de fazer discursos, privados ou públicos — exatamente o que havia feito.
Na decisão que decretou a prisão, Moraes acusa Bolsonaro de “instrumentalizar” discurso público com material pré-fabricado para posterior publicação em redes sociais por terceiros previamente coordenados. Qual é a prova disso? Nenhuma. Moraes não apresenta sequer uma linha que fundamente essa acusação. A decisão é baseada em suposições e impressões pessoais do ministro, que parece considerar como prova o simples fato de o discurso de Bolsonaro ter sido postado por seu filho Flávio e pelo aliado Nikolas Ferreira.
Basta dizer “a justiça não é tola”. Não, ela é astuta como as serpentes. Para Moraes, não são necessárias provas: basta que o investigado faça algo que ele desaprove para que encontre uma forma de incriminá-lo. A coerência foi para o brejo: Moraes diz que Bolsonaro endossa os ataques do povo ao STF, mas ninguém do povo é investigado… então por que Bolsonaro seria?
Outra incoerência: o fato de que Flávio Bolsonaro apagou a postagem usada para prender Bolsonaro, o que foi um claro sinal de medo da interpretação que a corte poderia dar à ação, tornou-se para Moraes uma tentativa de ocultar a suposta violação - um argumento ridículo, pois a imprensa já havia noticiado a postagem. É o já infame “use sua criatividade”.
Agora, Bolsonaro está preso, incomunicável, censurado e silenciado de todas as formas — como nunca antes ocorreu na história deste país, e certamente não durante a Lava Jato com Lula. Um silenciamento que não ajuda o processo, mas ajuda outra coisa: a enfraquecer a direita nas eleições de 2026, por meio da neutralização forçada e injustificada do seu maior cabo eleitoral.
E ainda há quem diga que o Brasil é uma democracia. Me poupem.




