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Enquanto o país se concentra nas importantes discussões sobre segurança pública após a megaoperação no Rio, o governo Lula avança a passos largos para controlar a internet e, com ela, a liberdade de expressão. No momento em que escrevo este artigo, o Congresso se prepara para votar o PL 8.889/2017, o antigo “PL da Globo”, que tratava da taxação de serviços de streaming como Netflix, Prime Vídeo e Disney+, mas agora foi transformado em algo muito mais perigoso: um projeto de censura disfarçada de regulação cultural.
De autoria do petista Paulo Teixeira, o PL nasceu com o propósito de criar novas fontes de financiamento para o setor audiovisual, alimentando o velho sistema de “incentivos” públicos que sustenta artistas militantes e produtores de conteúdo ideológico sob o pretexto de valorizar a cultura nacional. Até aí, seria apenas questionável. Mas o governo atual conseguiu algo pior: meteu as mãos no texto e transformou o que era um projeto de taxação em um mecanismo de controle sobre toda a internet brasileira.
O novo texto amplia a definição de “serviço de streaming audiovisual” e cria uma categoria inédita: o “serviço de compartilhamento de conteúdos audiovisuais”, definido assim no art. 4º, inciso X do PL: “X - serviço de compartilhamento de conteúdos audiovisuais: serviço de streaming audiovisual por meio do qual terceiros podem hospedar, gerenciar e compartilhar conteúdos audiovisuais e cujo provedor não é responsável pela seleção dos conteúdos disponibilizados”. Traduzindo: as redes sociais foram incluídas como um jabuti no projeto.
O resultado é previsível: conteúdo doutrinário empurrado goela abaixo do público desinteressado nesse tipo de conteúdo
Facebook, Instagram, YouTube, X (antigo Twitter) — todas entram no bolo. Pela redação proposta, esses serviços passarão a ser fiscalizados e regulamentados pela ANCINE, a Agência Nacional de Cinema, hoje inteiramente aparelhada pela esquerda. E é aí que mora o perigo. O texto exige que as plataformas peçam autorização da ANCINE para funcionar no Brasil. Ou seja: uma agência controlada pelo governo passa a ter o poder de decidir quem pode ou não existir na internet brasileira.
Mais: o projeto impõe uma cota obrigatória de 50% de obras nacionais produzidas por empresas “independentes”. Na prática, isso significa obrigar os serviços de streaming a veicular produções de baixo apelo comercial — em geral, marcadas por ativismo identitário, ideologia progressista e uma boa dose de militância política travestida de cultura. O resultado é previsível: conteúdo doutrinário empurrado goela abaixo do público desinteressado nesse tipo de conteúdo.
Como se não bastasse tudo isso, o PL cria um novo imposto progressivo sobre a receita bruta das empresas, que pode chegar a 4% para receitas acima de R$ 70 milhões. A consequência é óbvia: aumento de preços para o consumidor, mais dinheiro público canalizado para financiar produções alinhadas ao pensamento do governo. O ciclo se fecha: você paga a conta da propaganda ideológica que não quer assistir. De quebra, isso reduzirá os incentivos para produção de conteúdos veiculados em plataformas como o YouTube.
Mas o golpe de mestre está escondido nas entrelinhas. O projeto prevê que as plataformas se submetam às sanções impostas pela ANCINE — que poderão incluir advertência, multa, suspensão ou cancelamento do credenciamento. Em outras palavras, se uma plataforma publicar um vídeo, documentário ou até mesmo uma live que desagrade o governo, a agência poderá puni-la e até retirar sua autorização de operar.
Nada será feito de forma ostensiva, é claro. Ninguém vai dizer que é porque desagrada o governo. Tudo será feito sob o pretexto de “proteger o consumidor”, “combater a desinformação” ou tutelar direitos das minorias. Vão “usar a criatividade”, como já se tornou comum em Brasília para realizar a censura. É o mesmo roteiro que já vimos antes em outros países: primeiro vem a “regulação”, depois o “controle” e, por fim, o silêncio.
A ironia é que o projeto nasceu para regular o streaming, mas foi distorcido até virar o PL da Mordaça, uma ferramenta autoritária que ameaça a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão. Com a inclusão das redes sociais, o governo poderá sufocar qualquer voz que desafie a narrativa oficial — algo que regimes autoritários fazem desde sempre, agora com a bênção da lei.
Informações de bastidores indicam que o Centrão embarcou na votação, e que o governo já teria cerca de 300 votos para aprovar o texto. O alerta é urgente: se aprovado, o PL 8.889/17 dará ao governo poder para decidir quem fala, o que fala e onde fala na internet. E a história nos ensina que, quando o Estado ganha esse poder, ele nunca mais devolve.
Não é sobre cultura. É sobre controle. Não é sobre proteger o consumidor. É sobre proteger o governo. E não é sobre fake news. É sobre calar quem denuncia abusos, escândalos e mentiras. O Brasil já vive um clima de intimidação judicial e censura política. Se este projeto passar, a mordaça será oficial. E quando a liberdade de expressão é perdida, nenhuma outra sobrevive.




