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Destrava PME | O que aprendi sendo mentor

James Cichy

Mentoria

O que aprendi sendo mentor

12/01/2023 16:04
Recentemente, escrevi aqui na coluna sobre o perfil dos mentores, que costumam ser executivos ou empreendedores que já atingiram o ápice que almejavam para suas carreiras e agora querem construir um legado, buscam a satisfação no sentido de saber que ajudaram outros empresários a crescer, evoluir e até mesmo a salvar seu negócio.
Hoje, meu texto se voltará, novamente, àqueles que desejam ser mentores, mas para compartilhar aprendizados que absorvi em minha trajetória e que se eu soubesse de pronto teriam me “evitado a fadiga”, como se diz por aí, em diversos momentos.
Não apenas no Brasil, mas no mundo todo, vários mentores são executivos C-Level – esse não é o meu caso, já que vim do empreendedorismo, mas vários mentores com quem trabalho e convivo são pessoas que chegaram a cargos de liderança em grandes empresas. E é comum que esses profissionais sejam pautados por terminologias, jargões, regras e um modo de pensar muito norte-americano.
Ocorre que quando vamos mentorar empresas brasileiras, em especial pequenos e médios negócios, mesmo os que já estão se encaminhando para se tornar grandes, a comunicação resta prejudicada, porque esses conceitos não fazem sentido, na maioria das situações, na realidade nacional. E isso não se refere apenas ao modo de falar, mas até mesmo a ferramentas. A metodologia Scrum, por exemplo, que propõe a realização de pequenos ciclos de atividades num projeto, bastante utilizada em multinacionais, não é conhecida de todo o público. Quando o mentor, de cara, quer aplicar um método como esse, mais atrapalha do que ajuda os mentorados.
Às vezes, é preciso “ensinar” questões que para o mentor podem parecer óbvias, mas que, em realidade, são completamente novas para as PMEs. Antes, eu acreditava que essa etapa poderia ser pulada, mas a vivência me mostrou que não é bem assim. Afinal de contas, cada processo de mentoria tem suas particularidades, é dinâmico.
O mentor deve buscar formas mais didáticas para transmitir seu conhecimento, porque o objetivo é que o mentorado aprenda de forma efetiva. Já aconteceu, mais de uma vez, de mentores comentarem comigo que o mentorado ficou com cara de “interrogação” diante de determinado conceito – e uma das primeiras perguntas que eu faço é se o especialista usou conceitos norte-americanos –, mas acabou não comentando nada talvez por não se sentir confortável. Necessário, portanto, que o mentor se certifique de que os ensinamentos estão fazendo sentido.
Um segundo aprendizado diz respeito às expectativas do mentorado. Não raro, são criadas expectativas do tipo “o mentor vai me trazer clientes, o mentor vai fazer eu vender mais, o mentor vai aumentar meu faturamento”, como se pudéssemos desenvolver o mentorado num “passe de mágica”. Não é assim que funciona e é necessário deixar claro – preparar, de certa forma, emocionalmente o mentorado – que se trata da um processo de médio a longo prazo. Eu mesmo ignorei isso durante um tempo e aí, quando chegava na terceira ou quarta sessão da mentoria, era inundado por questões como “e quando é que vamos falar sobre ter mais clientes?”, sendo que a empresa sequer tinha funil de vendas, não tinha estrutura operacional.
Precisei, então, começar a transmitir isso de maneira clara e objetiva para o mentorado, porque é um caminho com etapas. A mentoria não é uma ferramenta de geração de leads. E aqui volto a reforçar a necessidade de fazer da mentoria um processo dinâmico, para que as sessões não se tornem monótonas. Ela pressupõe evolução e demanda ações que complementem as fases anteriores. Levar cases para debate e benchmarking, promover interações, convidar outros mentores para participar... Tudo isso é extremamente válido. Trabalhar só conceitos e dar ordens para o mentorado não funciona e em alguns meses ele não vai aguentar mais.
Ainda, o mentor tem que tomar o cuidado para não se envolver emocionalmente com o mentorado. Na maioria das vezes, os empresários procuram a mentoria porque estão com um problema financeiro e, quando é feita uma análise mais aprofundada, percebe-se que a situação é muito grave e o mentorado quer emprestar mais dinheiro, endividar-se. Se o mentor está muito apegado, vai querer fazer mais do que lhe cabe. Sem contar que, ao agir com emoção, pode aconselhar de maneira errada.
Ademais, como as PMEs brasileiras costumam ter dois ou três sócios, geralmente da mesma família, é importante que o mentor não tome partido. Se ele escolhe um lado embasado na emoção – e não ligado à hierarquia do negócio –, gera-se um problema.
Não significa, entretanto, que o mentor não possa ter uma relação de confiança com o mentorado. Aliás, deve, porque uma relação direta, saudável e próxima é extremamente positiva para o processo. É muito gratificante quando o mentor consegue destravar o negócio, fazê-lo crescer. A sensação de trabalho bem-feito, de construção de legado, acontece porque as empresas reconhecem isso. Limites, porém, são fundamentais.

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