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Entrelinhas

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Entrevista

Ex-ministro de Bolsonaro, Sachsida defende “anistia geral para evitar o pior”

(Foto: Fabio Rodrigues/ Agência Brasil)

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Economista de carreira do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e ex-ministro de Minas e Energia no governo Jair Bolsonaro, Adolfo Sachsida tem se consolidado como uma voz ativa da oposição a Lula e crítica ao Supremo Tribunal Federal (STF). Com passagem também pela equipe econômica de Paulo Guedes, ele combina experiência acadêmica e prática na formulação de políticas públicas. Nesta entrevista exclusiva, Sachsida faz uma análise do cenário internacional marcado pela disputa entre Estados Unidos e China, comenta a política tarifária de Donald Trump e compara a estratégia do atual presidente americano à de Ronald Reagan. O ex-ministro analisa a condução econômica do governo Lula 3, que, segundo ele, “só encontra como saída o aumento de tributos”. Sachsida defende ainda uma ampla anistia para presos políticos ligados ao 8 de janeiro como caminho para a pacificação nacional e alerta que, sem isso, o país pode ver surgir um outsider em 2026, à semelhança de Javier Milei na Argentina.

Entrelinhas: Quais são os riscos para o Brasil nessa tensão com os Estados Unidos?
Sachsida:
A leitura que eu tenho difere da maior parte da mídia. Eu enxergo o presidente Trump como alguém parecido com o presidente Reagan. Assim como Reagan acreditava que era função da América ser guardiã do mundo livre, Trump também vê os Estados Unidos dessa forma. Reagan partiu para cima da União Soviética, que era o grande inimigo do mundo livre. Hoje, Trump enxerga esse risco na China. É nítido o embate geopolítico entre Estados Unidos e China, e o Brasil está entrando nisso. Em abril, o Trump anunciou as menores tarifas para o Brasil. Mas, em agosto, tudo mudou, após declarações do presidente Lula contra o dólar e contra aliados históricos dos Estados Unidos, além da aproximação com Irã, China, Cuba e Venezuela. O Brasil tomou decisões infelizes e chamou a atenção dos EUA, que usam seu poder para defender a agenda do mundo livre. A leitura econômica que eu tenho é que o Brasil está procurando problema para si mesmo.

Entrelinhas: Muitos liberais criticam a política tarifária de Trump como desincentivo ao comércio internacional. Como o senhor vê essa estratégia e o objetivo das tarifas americanas?

Sachsida: Reagan foi um grande presidente liberal: reduziu tributos e adotou medidas pró-mercado. Mas também aumentou muito o gasto público com a “Guerra nas Estrelas”, usando o orçamento militar como arma contra a União Soviética. Vejo Trump de forma parecida. Ele reduziu impostos, diminuiu gastos e avançou na desregulamentação, especialmente no setor de energia. Mas, assim como Reagan usou o gasto público para pressionar a União Soviética, Trump usa tarifas como instrumento geopolítico. Não é só economia. Ele está usando o hard power, assim como Reagan fazia. É claro que tarifas são ruins do ponto de vista econômico, mas também foi ruim aumentar gasto público na época do Reagan — e mesmo assim ele é considerado liberal. Então, é preciso analisar dentro de um arcabouço maior.

Entrelinhas: O senhor foi ministro do ex-presidente Jair Bolsonaro. Como recebeu a notícia dos últimos indiciamentos?

Sachsida: Existe uma clara perseguição no Brasil hoje. Eu até contei uma parábola: era uma vez um país que começou prendendo um bode expiatório, depois outro, depois um padre, um pastor e, por fim, um judeu. Todos sabemos onde essa história acaba. Será que vamos permitir que isso ocorra no Brasil?

Entrelinhas: Qual sua visão sobre a postura dos governadores de direita, alguns deles considerados presidenciáveis?

Sachsida: Respeito muito os governadores de oposição, são competentes e sérios. Mas a leitura que faço é que o Brasil não está pacificado. O inquérito das fake news já dura mais de seis anos. O país está mais em harmonia ou mais em conflito? Claramente em conflito. Quem acredita que será eleito com posturas de apaziguamento está enganado. O momento de pacificar é agora, e isso passa pela Anistia. Temos que soltar imediatamente essas pessoas simples, caminhoneiros, donas de casa, idosos. Há uma senhora de 72 anos presa, doente, isso é desumano. Essa deve ser a pauta principal do país. Se não pacificarmos, em 2026 pode surgir um outsider. Outsiders são sempre um risco, às vezes dá certo e aparece um grande estadista, como Milei, mas na maior parte das vezes pode dar muito errado. Para quê correr esse risco? Precisamos de uma grande anistia geral e irrestrita. Em 2026, acredito que Bolsonaro vencerá Lula e fará um governo de transição, com teto para a dívida pública, reformas microeconômicas e pacificação nacional.

Entrelinhas: As pesquisas apontam que a maioria da população desaprova o governo Lula, em parte pela má gestão econômica. Qual sua análise sobre o Lula 3?

Sachsida: O governo Lula 3 tem um problema sério no Ministério da Fazenda: não há formuladores de política econômica. Sempre que surge um problema, a única solução é aumentar tributos. Já foram 25 medidas nesse sentido. A equipe é inexperiente. Vimos erros como o decreto do IOF, que precisou ser revogado logo em seguida. Houve também o anúncio de crédito às empresas sem informar a taxa de juros. Como alguém pode contratar crédito sem saber os juros? É uma equipe mal qualificada, que improvisa o tempo todo.

Entrelinhas: Como o senhor vê a transformação econômica da Argentina sob Javier Milei?

Sachsida: Parabenizo o presidente Milei pelos resultados. A Argentina estava em situação desesperadora, exigindo medidas radicais. E ele tem obtido sucesso. No Brasil, a situação é diferente. Entre 2016 e 2022, aprovamos reformas importantes: trabalhista, Previdência, autonomia do Banco Central, novo marco do saneamento, garantias, securitização. A economia já estava decolando no fim de 2022. Por isso, defendo que 2026 a 2030 seja um governo de transição, focado em pacificação nacional, teto de dívida e reformas microeconômicas, sem grandes choques. O Brasil precisa é de paz.

Entrelinhas: Quando parte da elite brasileira vai se afastar do STF, diante da tensão com os bancos e o setor produtivo?

Sachsida: Elites sempre se protegem, em qualquer lugar do mundo. Quem move a história é a classe média. O pobre precisa pensar na sobrevivência imediata, e o rico, se der errado aqui, pega um avião e vai embora. Mas a classe média não tem para onde ir. Ela paga a conta e sofre com a perda de liberdade. A elite brasileira já largou o governo Lula, mas acredita que pode empurrar a situação até 2026 e então eleger um candidato do sistema. Estão enganados. Se a tensão continuar, a população vai rejeitar candidatos do sistema e apoiar um desconhecido com discurso duro, o que pode dar certo, mas também pode dar muito errado. Para que correr esse risco? Precisamos pacificar o Brasil já.

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