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O humorista Paulo Souza foi entrevistado pela coluna e pelo programa Entrelinhas. Conhecido pelo conteúdo crítico ao governo Lula e ao Supremo Tribunal Federal, Paulo tem mais de 1,6 milhão de seguidores no Instagram. O comunicador destacou que ele e os colegas do antigo Canal Hipócritas foram processados por vídeos que citavam o STF. Seu ex-sócio, Bismark Fugazza, chegou a ser preso no ano passado por suposto envolvimento em "atos antidemocráticos". O ministro Alexandre de Moraes determinou a Fugazza o uso de tonozeleira eletrônica e proibiu o humorista de deixar a cidade onde mora, bem como de usar as redes sociais, além de cancelar seu passaporte.
Na entrevista, Paulo Souza revela que a limitação à liberdade de expressão no Brasil gera autocensura em suas produções. O artista também comenta sobre a sentença ao humorista Léo Lins, condenado a oito anos e três meses de prisão pela Justiça Federal. Souza compara o caso de Lins à fala da jornalista Eliane Cantanhêde, que questionou a "mortezinha" de judeus no conflito entre Irã e Israel.
Entrelinhas: Paulo, você costuma abordar temas políticos e sociais com humor. Como é fazer piada num Brasil polarizado e com tantos casos de censura?
Paulo Souza: O Brasil está vivendo um momento tão absurdo que, às vezes, a única coisa que me resta é fazer piada. Mas até isso está ficando perigoso. A gente está num período muito sombrio da história do país. Não pode nem mais dizer que está vivendo um “período negro”, porque vão te cancelar só por usar a palavra. O Léo Lins é um exemplo recente disso — foi censurado, perseguido, e ele não foi o único.
Entrelinhas: Você também teve experiências pessoais com esse tipo de repressão, certo?
Paulo Souza: Sim. Meu ex-sócio no canal Hipócritas, o Bismarck, está até hoje com tornozeleira eletrônica. Ele ficou três meses preso. Eu também fui processado. A gente viveu isso de perto. A censura não é só para calar. Ela também prende. Então, quando a gente fala em censura no humor, não é exagero nem teoria da conspiração. É real.
Entrelinhas: Recentemente, você comentou o caso da jornalista Eliane Cantanhêde. O que te chamou atenção ali?
Paulo Souza: Aquilo foi surreal. Ela fez um comentário do tipo “por que não está morrendo muito israelense?”. Aí depois veio pedir desculpa, mas sem se desculpar de fato. Eu fiz até um vídeo sobre isso. Fiquei pensando: se essa frase fosse dita num show de humor, com certeza daria cadeia. Mas como ela falou sério, numa emissora grande, nada acontece. E olha que parecia até piada de humor negro, estilo Léo Lins mesmo. A diferença é que ela está protegida pela posição que ocupa.
Entrelinhas: Você vê essa seletividade como um sintoma no país?
Paulo Souza: Totalmente. Isso mostra o quanto a censura é seletiva e o quanto o humor está sendo criminalizado. A jornalista da mídia tradicional pode falar atrocidade e ninguém faz nada. Mas se for humorista conservador, a coisa muda. É como se o tom fosse mais importante do que o conteúdo. E isso é muito perigoso, porque vai calando todo mundo.
Entrelinhas: Como isso tem afetado o trabalho de vocês?
Paulo Souza: A gente pensa duas, três vezes antes de escrever uma piada. É como se a gente estivesse o tempo todo pisando em ovos. Mesmo falando a verdade, você pode ser acusado de “levar a conclusões falsas”. Olha o absurdo disso: falar que o Lula é ex-presidiário — que é um fato — já virou problema, porque dizem que pode gerar interpretações perigosas. Como assim?
Entrelinhas: Você acha que isso tende a piorar nas eleições de 2026?
Paulo Souza: Infelizmente, sim. Agora, com a esquerda no poder, com a máquina pública na mão, com novos ministros indicados pelo Lula no STF… Eu sinceramente acho que o cenário pode ser ainda pior. E o humor vai sofrer mais.
Entrelinhas: Você acredita que há alguma esperança de reação? Talvez com o que tem acontecido no exterior, como nos Estados Unidos?
Paulo Souza: Eu até tento ser otimista. Tem gente dizendo que o Alexandre de Moraes vai sofrer sanções nos Estados Unidos, que o Trump voltando pode influenciar algo… Mas, para ser bem sincero, eu tenho dificuldade de ver impacto real aqui no Brasil. Por enquanto é só esperança. A gente vê os movimentos lá fora, mas aqui nada muda. O jogo continua sendo deles.
Entrelinhas: Como você vê a reação da mídia conservadora a esse ambiente?
Paulo Souza: A Jovem Pan é um exemplo claro. Em 2022, ela teve que se censurar preventivamente. Mudou completamente. Hoje já não é mais a mesma. Isso mostra como até veículos grandes estão se adaptando para sobreviver. Porque se você fala tudo o que quer, ou mesmo tudo o que é verdade, corre o risco de perder sua voz — ou pior.
Entrelinhas: E como continuar fazendo humor nesse cenário?
Paulo Souza: Sendo estratégico. Eu ainda acredito que o humor tem um papel. É uma forma de resistência. Mas o jogo está pesado. A gente precisa driblar a censura, rir onde dá para rir, mas sabendo que tem gente que quer calar a gente de qualquer jeito. No fim das contas, é rir para não chorar.





