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Francisco Razzo

Francisco Razzo

Francisco Razzo é professor de filosofia, autor dos livros "Contra o Aborto" e "A Imaginação Totalitária", ambos pela editora Record. Mestre em Filosofia pela PUC-SP e Graduado em Filosofia pela Faculdade de São Bento-SP.

Preconceito antirreligioso

O pobrezinho inquisidor do secularismo

frei gilson
Live de frei Gilson na madrugada na última semana foi assistida por mais de 1 milhão de pessoas. (Foto: Reprodução/YouTube/Frei Gilson)

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Vocês devem ter acompanhado os ataques a frei Gilson; não entrarei em detalhes. Aqui, gostaria de destacar um específico que me chamou a atenção. Trata-se de uma série de postagens que o jornalista Helder Maldonado fez para atacar fiéis cristãos que acordam cedo para rezar com frei Gilson.

Fato é que Helder Maldonado tem o espírito de um inquisidor. Sua recente investida contra frei Gilson é um espetáculo digno do secularismo mais dogmático: a mesma rigidez dogmática que ele acredita combater na religião, ele reencena com fervor. Eis o que ele escreveu:

“Acordar cedo para lavar uma calçada, estudar ou ir correr no parque ninguém quer. Aí morre burro, sedentário e com a casa sebosa e a culpa é do capeta ou do Lula. Detalhe: esse careca é padreco vinculado ao Brasil Paralelo. Compreenderam o sucesso?”

Diante da repercussão, dobrou a aposta:

“O post gerou polêmica entre essa galera que tem o costume de chamar todo mundo de bostileiro QI 83. Cês tão ligados que nenhum país deu certo metendo 4 milhões em missa online de madrugada, né? Inclusive é isso mesmo que se espera de um bostileiro QI 83.”

Helder Maldonado é a caricatura do secularismo vulgar: um sujeito incapaz de compreender a religião para além de suas antipatias ideológicas

Frei Gilson não é o fanático. O fanático é Maldonado, que se porta como um sacerdote da seita do secularismo. O frade, por sua vez, apenas faz aquilo que qualquer manual de sociologia da religião explica: canaliza angústias, oferece sentido e estrutura existencial em um mundo fragmentado e carente de propósito. Não é possível que um jornalista tão sabichão ignore uma das mais importantes mensagens de Cristo: “Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4,4).

Cristo diz isso no deserto, após 40 dias de jejum, quando Satanás, percebendo sua fome, sugere que ele transforme pedras em pão. A vida humana não se sustenta apenas pelo alimento material. O espírito vale mais que o estômago.

A lógica de Maldonado, no entanto, é a do tentador (para não dizer outra coisa): só importam as necessidades imediatas, o consumo, o conforto e a satisfação física. Tudo o que ultrapassa essa ordem lhe parece uma tolice. O que ele não percebe é que, ao zombar dos fiéis que acordam de madrugada para rezar, está apenas repetindo o erro mais antigo da humanidade: tratar o homem como um mero animal que se nutre de pão, sem perceber que o que realmente sustenta civilizações inteiras é aquilo que está em seu coração.

Mas o problema de Maldonado vai além da intolerância intelectual. Sua limitação é sociológica. Ele deprecia o fenômeno frei Gilson porque é incapaz de enxergar o papel da religião na organização da vida social. Max Weber, um dos maiores sociólogos de todos os tempos, mostrou que os sistemas religiosos são, antes de tudo, formas de racionalização da existência. A religião não é apenas um círculo de oração; é a âncora lançada ao céu para sustentar e dar sentido a toda estrutura: a moral, a rotina, o código de conduta, a economia.

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Ora, o próprio espírito do capitalismo, segundo Weber, foi forjado pela ética protestante, pelo princípio de que o trabalho árduo, a disciplina e a sobriedade são também, e sobretudo, caminhos de salvação. O ethos cristão, sintetizado na máxima beneditina ora et labora, estrutura a existência religiosa e econômica, conectando fé e ação no mundo muito antes da própria reforma. Não à toa São Bento é considerado o patrono do Ocidente.

Maldonado, refém do materialismo burro, só consegue ver manipulação ideológica e ignorância coletiva. Ele trata a popularidade de frei Gilson como um símbolo de retrocesso político. Para um crítico cultural minimamente comprometido com a memória e a dignidade das pessoas, o sucesso do frade não é um espasmo medieval em pleno século 21. Mais do que isso, é uma resposta sincera ao vácuo de significado produzido pelo próprio secularismo radical. No deserto espiritual contemporâneo, a audiência procura redenção. Maldonado, no entanto, não tolera essa busca porque sua própria pregação não oferece nada além do escárnio medíocre.

Ele mesmo acredita piamente que isso é um deboche: "Nenhum país deu certo com 4 milhões de pessoas acordando de madrugada para uma missa on-line”. Nada além do que a velha ladainha iluminista radical que decretava a religião como um estorvo ao progresso. O detalhe é que nenhuma sociedade se tornou próspera simplesmente substituindo a fé por sarcasmo. As grandes civilizações sempre foram atravessadas por experiências religiosas que davam sentido ao esforço humano. O trabalho não é em vão, não somos como Sísifo condenado ao esforço inútil eterno.

No fim das contas, Maldonado é a caricatura do secularismo vulgar: um sujeito incapaz de compreender a religião para além de suas antipatias ideológicas. Ele não age por inveja de frei Gilson, mas porque é um papagaio do materialismo economicista, incapaz de oferecer qualquer leitura minimamente sofisticada sobre o fenômeno religioso humano. Sua crítica é pouco mais que um reflexo condicionado, uma resposta automática de quem acredita que ridicularizar a fé alheia é sinal de inteligência. Pobrezinho…

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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