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Culto na Igreja Oceânica, em Niterói (RJ).
Culto na Igreja Oceânica, em Niterói (RJ).| Foto: Facebook/página oficial Igreja Oceânica

Em vários textos publicados nessa coluna venho alertando sobre a infiltração dos chamados “cristãos progressistas” em igrejas cristãs. Mais recentemente, a Gazeta do Povo fez matéria investigativa primorosa, documentando como organizações “progressistas” como o Coletivo Bereia, o Pão Para o Mundo (PPM), a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (Cese), a Paz e Esperança (PHI), a Koinonia, o Instituto de Estudos da Religião (Iser) e o Tricontinental infiltram suas ideias no meio evangélico brasileiro, inclusive aborto e ideologia de gênero. Recentemente, a Igreja Oceânica e o pastor Henrique Callado Bensimon sofreram uma tentativa de linchamento virtual devido à acusação de um jovem que alegou ter sido expulso dessa igreja por ter votado em Lula. Foram dias difíceis, mas o episódio não se deu como alguns imaginam ou como foi noticiado pela dita imprensa. Quem esclarece tudo em entrevista é o pastor Bensimon, que plantou e pastoreia a Oceânica há 22 anos, e é membro da Acts 29 Network.

É verdade que a Igreja Oceânica expulsou um jovem por ele ter votado no Lula?

De modo algum! Jamais faríamos algo assim. Nossa igreja procura ser bem cuidadosa ao tratar da relação entre o Evangelho e a política. Uma cautela que, não podemos esquecer, remonta à Reforma Protestante do século 16, que passou a defender uma clara separação entre Igreja e Estado.

A aversão ao proselitismo político-partidário é algo levado tão a sério na Igreja Oceânica que, neste ano, tivemos uma irmã candidata a deputada estadual e pouquíssimos dos nossos membros tomaram conhecimento desse fato. Em nenhum momento o propósito dela ressoou na boca dos pastores ou dos líderes em nossas celebrações. Considero uma traição ao Evangelho ceder o púlpito da igreja para candidatos ou expor seus nomes em período eleitoral para, ainda que de maneira velada, induzir o chamado “voto de cabresto”. Esse cuidado, no entanto, não retira de nós, como pastores, a responsabilidade que recebemos de Deus de ensinar a igreja de acordo com a Escritura Sagrada, nossa base de fé.

Em 4 de setembro, a Gazeta do Povo publicou a coluna “Igreja não tem partido, mas tem doutrina – e pode orientar seus fiéis de acordo com ela”, de autoria de Thiago Rafael Vieira e Jean Marques Regina, respectivamente presidente e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Religião. O título diz tudo: aquela é “a” questão! A igreja cristã tem valores e princípios que regem todas as áreas de nossas vidas: a maneira como devemos constituir nossas famílias, a forma como nos relacionamos, como devem ser desenvolvidas as relações entre patrões e empregados, o modo como lidamos com a justiça social, como agimos com os mais pobres e os mais fragilizados, e até mesmo como devemos nos portar no trânsito ao dirigirmos nossos automóveis. A Bíblia aborda todas as questões da vida; nada em nossa existência está excluído de seu alcance. Ela nos fornece, inclusive, os critérios para escolhermos nossos governantes. A ideia não é dizer em quem o crente deve votar, mas ensinar os princípios bíblicos que regem essa área tão importante da vida para que suas escolhas sejam coerentes com a fé que professa e com a Escritura Sagrada.

“Política é um assunto mais espiritual do que muitos são capazes de supor. Ela irá definir a forma como viveremos.”

Henrique Callado Bensimon, pastor da Igreja Oceânica

Sob essa ótica, quando Deus exerceu seu juízo sobre Israel e permitiu que fosse dominado pela Assíria, no século 8.º a.C., o povo clamou a Deus, que lhe respondeu por intermédio do profeta Oseias: “Eles instituíram reis sem o meu consentimento; escolheram líderes sem a minha aprovação”. Israel deixou de consultar a Deus e de buscar a Sua vontade para definir seus líderes, e isso ofendeu sua majestade. Uma vez que o nosso Deus não muda, a pergunta que fica é: por que ignorar a direção de Deus na escolha de um governante era condenável naquela época e atualmente não seria mais?

Portanto, política é um assunto mais espiritual do que muitos são capazes de supor. Ela irá definir a forma como viveremos: se poderemos continuar manifestando a nossa fé livremente ou se seremos impedidos de fazê-lo; se os bebês no ventre materno serão ou não sacrificados a Moloque nas clínicas de aborto; se nossas crianças serão obrigadas a aprender ideologia de gênero nas escolas; se as drogas serão liberadas; se o Estado regulará e interferirá em cada vez mais áreas da vida social e privada, da economia etc. Todos são aspectos vitais não apenas para a sociedade como um todo, como também para os cristãos que buscam viver de acordo com a mensagem de Jesus.

Assim, retomando a questão inicial, jamais um crente deverá ser excluído pelo fato isolado de ter votado neste ou naquele candidato. O que deve preocupar a Igreja de Cristo não é a política partidária, mas a disseminação em seu seio de ideologias que contradizem a Palavra de Deus.

O que realmente aconteceu, então?

Em setembro, um vídeo transmitido pela Revista Fórum de uma reunião on-line em que a advogada Laura Astrolabio fala de uma estratégia para se infiltrar nas igrejas evangélicas por meio dos departamentos infantis viralizou nas mídias sociais. Sua ideia era entrar nas igrejas de forma dissimulada, oferecendo-se como professora para as crianças, e até cheguei a mencionar isso em uma pregação.

No dia do primeiro turno das eleições, este jovem, que deu algumas aulas para nossas crianças, postou em sua mídia social fotos que demonstravam sua militância política. Isso causou um imenso desconforto a pais e professores que logo o associaram ao vídeo da advogada, tendo gerado diversos questionamentos quanto às suas convicções cristãs e ao que ele estaria ensinando. Somos muito criteriosos com o ensino na Igreja Oceânica, sobretudo o ensino das crianças.

Eu e o pastor responsável por essa área o chamamos e começamos a conversa perguntando-lhe se havia assistido ao vídeo e como ele achava que pais e professores reagiram ao terem visto suas fotos na internet. Imaginamos que ele faria imediatamente a associação, entenderia a situação e responderia algo do tipo: “Nem tinha pensado nisso!”, “Como podemos resolver essa questão?”, e lhe diríamos para reiterar suas convicções cristãs aos pais e professores da área. Porém, ele demonstrou dificuldade para vincular os fatos. A conversa acabou se estendendo, mas ocorreu dentro da cordialidade esperada e terminou com uma oração nossa, um apelo para que ele prosseguisse caminhando conosco e abraços fraternais. Portanto, ficamos surpresos e imensamente entristecidos ao sermos surpreendidos com sua versão dos fatos através da imprensa.

A Igreja Oceânica sempre esteve atenta a esse assunto? Como vocês foram despertados para isso?

Na verdade, essa nem sempre foi uma preocupação nossa. Até alguns anos atrás, ainda não tinha me aprofundado nessa área até que alguns jovens de nossa igreja passaram a nos procurar, com demasiada frequência, dizendo que estavam sendo perseguidos e humilhados por professores em sala de aula em razão da sua fé. A princípio achei que fosse algo pontual, mas os casos se repetiram em muitas ocasiões, e logo descobri que esse comportamento não era exceção, mas a regra.

Não são raros os casos em que estudantes cristãos de mestrado e doutorado precisam apagar suas mídias sociais para que seus orientadores não saibam que são cristãos, pois há o risco de serem excluídos de programas acadêmicos. Do mesmo modo, crianças têm sido alfabetizadas tendo por base textos sobre ideologia de gênero, e professores das mais diferentes disciplinas não apenas criticam em sala de aula a Bíblia e o cristianismo, mas zombam do próprio único Deus em quem nós cremos.

“O que deve preocupar a Igreja de Cristo não é a política partidária, mas a disseminação em seu seio de ideologias que contradizem a Palavra de Deus.”

Pastor Henrique Callado Bensimon

Vi que precisávamos não somente preparar os pais acerca do cuidado em relação ao que seus filhos estão aprendendo na escola, como também os nossos jovens, a fim de que estejam habilitados a defender a sua fé no ambiente acadêmico no qual têm sido covardemente atacados. Na ocasião, lembrei de um texto muito pertinente da Escritura que diz que em Israel havia um grupo de homens que eram “conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer”. Assim, montamos um grupo com cerca de dez pessoas dentre teólogos, pastores e professores altamente capacitados da igreja para tentarmos entender o que estava acontecendo, a fim de sabermos a maneira correta de agir. Ficamos muito surpresos quando descobrimos que, de fato, esses ataques à fé não eram casos isolados, mas fruto de um movimento conhecido como “marxismo cultural”.

Em linhas gerais, esse movimento entendeu que, como consequência da Revolução Industrial, a produção de riqueza atingiu níveis nunca antes obtidos e, assim, os trabalhadores vieram a ser bem remunerados e passaram a usufruir de uma vida mais confortável. Logo, dificilmente encontrariam motivação para empreender uma revolução armada. Como Paul Kengor explica: “Em vez de organizar os trabalhadores e as fábricas, os lavradores e os camponeses, os campos e as fazendas, eles organizariam os estudantes e a academia, os artistas e a mídia, e a indústria cinematográfica”.

Como o marxismo cultural opera e influi efetivamente na vida das pessoas?

A chamada Escola de Frankfurt nada mais foi do que uma filial do Instituto Marx-Engels de Moscou. O velho marxismo acreditava que poderia chegar ao poder pela revolução armada. Tinha por foco apenas a estatização da economia e a distribuição de renda, mas acabou desacreditado. Os seus mentores, então, entenderam que, para conquistar o poder, havia a necessidade de ser feita uma releitura dos princípios de Karl Marx. Surgiu, assim, o chamado “novo marxismo”, a “nova esquerda” (New Left). Os líderes desse movimento, dentre os quais podem ser destacados Max Horkheimer, Theodor Adorno e Herbert Marcuse, abandonaram completamente os limites morais da civilização ocidental. Chegaram a tal nível de imoralidade e perversão que até mesmo o ateu Sigmund Freud os descreveu como “moralmente insanos” e “completamente loucos”.

Estes homens viram nas universidades a base a partir da qual lançariam sua revolução: surge, então, o termo “marxismo cultural”. A fim de disseminar suas ideias, eles buscam estrategicamente a mais influente escola de Pedagogia do mundo: a Universidade de Columbia. Instalam-se nela e, desde então, passam a influenciar a formação de grande parte dos professores de todo o mundo.

O italiano Antônio Gramsci foi outro dos principais pensadores associados a esta escola. No seu entender, a luta não deveria mais ser dos trabalhadores contra os empresários, mas das minorias contra as maiorias “opressoras”: os negros deveriam se levantar contra os brancos, homossexuais contra héteros, mulheres contra homens etc. Nesse sentido, vemos que a ideia do discurso “nós” contra “eles” não é nova. A concepção de Gramsci e seus discípulos era de que tudo deveria ser questionado, a começar pelos princípios morais absolutos. Com isso, passaram a atacar continuamente a cultura judaico-cristã, base da sociedade ocidental. Se o comunismo não obtivera êxito em sua dominação, exceto em casos pontuais, como o leste europeu, Cuba, Venezuela e Nicarágua (estas duas mais recentemente), a causa do “fracasso”, na ótica gramsciana, foi tributada à resiliência dos principais pilares do Ocidente: a família, a igreja e a escola. Para o “sucesso” desse projeto de poder, portanto, o ataque deveria ser direcionado a essas instituições, a fim de enfraquecê-las e entregar o indivíduo à influência do Estado. As bases judaico-cristãs da sociedade ocidental deveriam ser substituídas pela veneração do Estado com proliferação das ideias coletivistas; um traço, aliás, que se mostrou marcante no fascismo.

Não se trata de um projeto vago ou “teoria da conspiração”. É algo bem concreto e que pode ser claramente percebido em nosso dia a dia. Por exemplo, em agosto de 2018, foi amplamente repercutida a publicação (apagada alguns dias depois, mas, como se diz, o print é eterno) de certa jornalista no Twitter em que dizia: “A principal função da escola é proteger os filhos dos pais. Criança não é propriedade do pai. Tem direito a ter acesso a pessoas, às informações e pontos de vista que o pai nem conhece e nem valoriza. A existência da escola particular já é uma afronta grande o bastante. E note que não é proteger de pai ruim: é proteger de todos os pais. Pai e mãe não é benção, é mal necessário”. Ora, essa jornalista expressa o ideal marxista de crítica a todas as áreas da existência humana – nesse caso, de um conceito fundamental e tão básico como a família e a educação dos seus filhinhos.

Se por algum tempo esse movimento passou despercebido, hoje podemos ver com clareza correntes políticas que têm entrado com força nas escolas para influenciar nossas crianças, têm atuado para disseminar pautas que afrontam os valores judaico-cristãos, contribuem para deteriorar a família como instituição e têm voltado seu foco para restringir a liberdade de culto e de crença nas igrejas.

Acredito que isso tende a se intensificar daqui para a frente. Vejo, não em todas as igrejas, mas naquelas que procuram ser fiéis às Sagradas Escrituras, a última resistência a esse movimento tão nefasto à sociedade, e por isso os ataques a elas serão cada vez mais ferozes.

“Vi que precisávamos não somente preparar os pais acerca do cuidado em relação ao que seus filhos estão aprendendo na escola, como também os nossos jovens, a fim de que estejam habilitados a defender a sua fé no ambiente acadêmico no qual têm sido covardemente atacados.”

Pastor Henrique Callado Bensimon

Quais têm sido as consequências reais desse movimento?

O mais assustador é que Gramsci afirmou que a revolução estaria consolidada e seria vitoriosa quando as pessoas estivessem lutando por ela sem consciência de o estarem fazendo. É precisamente esse cenário que temos visto de forma bastante clara.

Precisamos entender que um profissional formado sob a influência do marxismo cultural se vê não como um mero trabalhador capacitado, mas como um verdadeiro missionário ou um “persuasor permanente”, nas palavras de Gramsci. Ele deve usar suas atividades profissionais e toda a sua influência para difundir seus valores e suas ideias. Essa é a razão por que certos formadores de opinião nem sequer são capazes de discernir a maneira antiética e desonesta de agir que pauta a sua conduta.

Muita gente formada sob a égide do marxismo cultural não teve a oportunidade de ouvir, ler e pensar no contraditório. Acredita sinceramente em seus professores, chegando a se opor à sua igreja, a seus pastores e até mesmo a suas famílias. Atribuem mais crédito ao que aprendem em sala de aula de um professor desconhecido que ao que aprendem em suas casas, de seus próprios pais, e em suas igrejas, dos seus irmãos na fé.

Preocupados com os efeitos nocivos desta ideologia no seio do Corpo de Cristo, fizemos duas palestras sobre este tema em 2018 e outras duas mais recentemente. O foco está em mostrar, sempre à luz das Sagradas Escrituras, que há ideias políticas e sociais que não são compatíveis com o Evangelho. Mostramos que o crente, em seu processo de santificação, deve ter a sua esperança em Cristo e no porvir, mas não pode desistir de testemunhar a sua fé e de se conduzir neste mundo de acordo com os princípios cristãos. O crente deve ser o mesmo em casa, na igreja, na escola, em seu trabalho e no relacionamento com seus amigos. Deve estar capacitado para não ser levado por vãs doutrinas e ter o claro discernimento, dado pelo Espírito Santo, a fim de identificar ensinamentos que, embora “sedutores”, tenham por objetivo final a substituição do Deus eterno, pelos deuses das ideologias seculares.

A informação de que um jovem alegou ter sido expulso da Igreja Oceânica, no auge de um momento de muita tensão em virtude do período eleitoral, propagou-se com muita rapidez. Qual foi o resultado disso?

De fato, houve uma matéria em um veículo de imprensa sobre essa alegação na manhã de quinta-feira, 20 de outubro. Ela foi replicada rapidamente em outros sites e jornais durante o dia. Antes do meio-dia eu já havia recebido mensagens do Canadá, da Inglaterra, da Austrália, de Portugal, da França, dos Estados Unidos e de quase todos os estados do Brasil perguntando o que estava acontecendo, mas, nos dizeres de um professor que participou desse processo desde o início, “Diante de um episódio assim, para os amigos não há necessidade de explicar, e para os inimigos não adianta comentar”. A verdade é que sofremos uma tentativa de linchamento público. O que de fato me entristeceu foi que algumas pessoas, sem ao menos terem o cuidado, a cautela e a prudência de ouvir o que a igreja tinha a dizer, colocaram-se na posição de juízes e resolveram condenar a igreja de forma precipitada.

No entanto, nosso Deus é tão bom que fez mover um grande apoio à igreja e abriu diversas portas para que a verdade fosse restabelecida. O que fora uma tentativa de linchamento se tornou a possibilidade de falar do Evangelho e da influência que as Sagradas Escrituras devem exercer em todos os setores da nossa vida. A verdade é que, como nosso Senhor Jesus ensinou, as portas do inferno jamais prevalecerão contra a igreja de Cristo.

Aproveito este momento para reafirmar que meu primeiro compromisso é com o meu Deus, que O temo e a Ele sempre buscarei agradar. Nossa fé está solidamente amparada nas Escrituras Sagradas sem qualquer relativização; por elas pautamos nossas decisões e atitudes, e jamais nos omitiremos na orientação de nossos membros acerca de ideologias que as afrontem.

A verdade é que sofremos ataques infundados e desonestos por meio de ilações que não encontram nenhum amparo na verdade. Contudo, não fiquei propriamente surpreso, pois a Escritura Sagrada nos adverte que “todos os que desejam viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos”. Eu ficaria preocupado se a mídia secular estivesse nos elogiando.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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