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Nesta semana um caso ganhou muita repercussão na imprensa e nas redes sociais: um homem agrediu uma criança de quatro anos na festa junina de uma escola particular em Vicente Pires (DF). Isso aconteceu no último domingo (15). Os alunos faziam uma apresentação quando o homem entrou no palco, empurrou a criança e a repreendeu duramente.
No começo da semana ouvi alguém comentando sobre o caso e achei um absurdo, mas não fui mais a fundo. Até que vi um vídeo, em uma rede social, que mostrava os outros pais reagindo e agredindo aquele homem, que era pai de outro menino da mesma turma. Confesso que na hora pensei: “Merecido. Bateu em uma criança”.
Mas fiquei intrigado e quis entender melhor o caso... Vi, então, que a coisa era um pouco mais complexa. O pai que empurrou a criança alegou que seu filho vinha sendo alvo constante de bullying e de agressões físicas e psicológicas por parte do colega, o que foi confirmado pela escola.
“Por diversas vezes a família buscou o amparo da instituição de ensino, notificando o corpo docente e solicitando providências imediatas. Contudo, o que encontraram foi uma postura de omissão, silenciamento e conivência, que contribuiu para a perpetuação das agressões”, diz uma nota divulgada pela advogada do rapaz.
A nota também diz que o que aconteceu naquela festa foi mais um dos vários episódios de bullying, e que o pai perdeu a cabeça quando o colega “enfiou deliberadamente o dedo no olho” da criança, “sem qualquer interferência, contenção ou ação por parte dos responsáveis pela segurança ou direção da instituição”.
Bullying sem nenhuma intervenção
De fato, o vídeo mostra que a criança agredida pelo homem é notavelmente maior do que as demais e fica a todo momento perseguindo e empurrando o filho do homem que a empurrou – o outro menino, aliás, é um dos menores da turma. Por algum tempo nada acontece. Nenhuma intervenção das professoras, nem dos pais do menino que estava incomodando o outro.
Abrindo parênteses, eu sempre costumo falar para o meu filho – que tem a mesma idade dos dois envolvidos na confusão – que ele tem total autorização para se defender caso algum colega tente machucá-lo, mas não tem nenhum direito de iniciar uma agressão sem motivo. Aliás, essa é a conduta mais comum que tenho visto entre os pais com quem convivo.
Mas ali essa intervenção não aconteceu. O vídeo mostra, em determinado momento, que a perseguição e os empurrões do menino maior chegaram a tal ponto que o colega deixou a fileira da apresentação, sendo seguido pelo outro. Uma professora, então, intervém, apenas para colocá-los novamente na fileira. Bastou ela virar as costas para o bullying continuar, até o momento em que o menino maior coloca os dedos nos olhos do menor, e o pai reage.
Ele, claro, agiu de maneira desproporcional. Não há o que se defender quando um adulto empurra com força uma criança de quatro anos. Mas, sinceramente, nessa história há mais de um culpado.
Aquele pai foi defenestrado pela imprensa e pela opinião pública, e seu filho foi sumariamente expulso da escola. A pergunta é: foi só ele quem errou?
Os verdadeiros culpados e as vítimas da história
É fácil condenar a atitude daquele pai. Ao longo da semana ele foi praticamente chicoteado em praça pública. Por outro lado, também há quem questione a conduta dos outros pais que partiram para cima dele. Mas a verdade é que nenhum deles é o culpado por criar o caos naquela festa.
A meu ver a escola é, de longe, a principal culpada. Além de não coibir o bullying e expulsar uma criança de três anos que nada fez, a instituição divulgou uma nota bastante agressiva, esquivando-se de toda a responsabilidade e transferindo-a unicamente para o pai do menino.
“A maldade não está nas crianças, que agem movidas pela pureza e pela inocência próprias da infância”, diz a nota. Discordo. Crianças podem ser bastante cruéis umas com as outras, e é no mínimo perigoso quando uma escola fecha os olhos para isso.
Aliás, possivelmente foi essa visão míope sobre a capacidade humana de fazer o mal desde cedo que permitiu que uma criança fosse alvo de bullying por meses sem uma intervenção objetiva e eficaz por parte da escola.
Se em uma festa na frente de todos os pais uma criança empurra deliberadamente a outra e enfia o dedo nos seus olhos sem que nada aconteça, o que não deve ocorrer no dia a dia?
O segundo culpado, a meu ver, é a família da criança que praticava bullying. Segundo a nota divulgada pela escola, essa família já tinha sido chamada para tratar dessas agressões, mas aparentemente nada foi feito. A liberdade com que o menino empurra o outro denota que ele não tem nenhum receio de consequências.
Duas vítimas
E as vítimas dessa história toda? O menino alvo de bullying sem dúvidas é a principal, pelas várias razões ditas até aqui. Mas penso que o outro também é. E não só por ter sido agredido por um adulto – é óbvio que isso deixa um trauma –, mas porque uma criança que cresce sem limites vai pagar um alto preço lá na frente.
Em resumo, é um caso triste e complexo, que vai muito além de simplesmente jogar pedras no homem que empurrou a criança. Ele, infelizmente, chegou ao limite – e reagir quando a situação chega a esse ponto costumar trazer consequências.
Mas não precisa ser assim: para quem é pai ou mãe, essa história mostra a importância de estar sempre atento ao que acontece na escola e criar maneiras de fazer com que a criança se sinta sempre confortável para expressar como está se sentindo.
O bullying pode passar despercebido pela família, e claramente muitas escolas se esquivam de combater esse problema. Faça sua parte!




