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A clássica comida de estádio sobrevive. Do lado de fora

Guilherme Caldas
Maranguape, há 30 anos na frente da Vila Capanema, mantém a tradição do Pão com Bife (e outras mais)

Houve tempos, no Brasil, em que o futebol era um esporte popular. Não nos entenda mal. A paixão do brasileiro pelo jogo de bola nunca arrefeceu. Mas os clubes, sem exceções, se elitizaram, se afastaram do povão.

Já foi diferente. Até coisa de uns quinze anos atrás, comprava-se um ingresso com os trocados que se tinha no bolso (pra geral ou arquibancada; cadeira social era coisa de piá de prédio). Ir ao jogo era algo tão simples quanto ir à padaria ou ao botequim. Você resolvia ir, e ia. (Já imaginou, precisar ser sócio-torcedor do seu padeiro preferido pra poder comprar os pães dele?)

Naqueles tempos, comida de estádio, em Curitiba, era pão com bife. Um clássico. Discutiam os torcedores de Atlético, Coritiba, Pinheiros e Colorado para saber qual estádio servia o melhor. Nas arquibancadas, vendia-se amendoim na casca.

Passaram-se os anos, Pinheiros e Colorado se fundiram em Paraná Clube, que dominou o futebol paranaense durante a década de 1990. Novos tempos, mas o pão com bife permaneceu. Bravo resistente, no futebol profissional de Curitiba.

Pois semana passada, animados com o inédito título de campeão paranaense da segundona que o tricolor estava prestes a erguer, fomos, Guilherme, Fernanda e eu, à Vila Capanema. Nenhum dos três paranista, nossa visita tinha segundas intenções – aproveitaríamos o ingresso em promoção (Fernanda entrou de graça) para matar a saudade do pão com bife da Vila Capanema.

Mas que pão com bife? Acabou, faz tempo. No seu lugar, um hambúrguer, que não nos seduziu (embora haja quem assegure que leve picanha na elaboração e seja assaz apetitoso). Assim, segue o Paraná Clube os passos de Atletico e Coritiba, que trocaram as clássicas e suspeitíssimas lanchonetes de estádio por descartáveis praças de alimentação inspiradas nas similares encontradas em shopping centers. E tome pizza, hambúrguer, pastel, pipoca. Tudo com sabor absolutamente esquecível e a preços abusivos. Há quem goste, claro. Não é nosso caso.

Rafael Martins
O pão com bife do Maranguape (atenção para o guardanapo preso pelo palito)

Viagem perdida, então? Absolutamente. O Paraná ganhou, afinal. E nós descobrimos duas preciosidades da legítima baixa gastronomia curitibana: Maranguape (localize no mapa), a lanchonete tocada há mais de trinta anos pelo cearense Fernando e a mulher Ivone, quase em frente ao estádio, na Engenheiros Rebouças, e o espetinho do Toninho.

O botequim de Fernando e Ivone é um clássico pé-sujo (com todo o respeito). Os dois colecionam histórias singulares, como se pode imaginar de um casal que há três décadas toca um bar frequentado por torcedores de futebol. Ali, como em boa casa de nordestinos, se bebe jurubeba Leão do Norte (“é uma fruta parecida com o café”, explicou Fernando), conhaque de alcatrão São João da Barra e cachaça Maribondo.

Quando já nos preparávamos pra ir embora é que descobrimos que o Maranguape serve um pão com bife que merece figurar entre os melhores que já experimentamos (e não era fome, pois isso foi antes do jogo). Carne bem temperada, uma rodela de tomate e pão fresco. Tudo por dois reais.

Toninho e a mulher, Maria Aparecida, tem estrada equivalente aos dos colegas do Maranguape. A diferença é que o espetinho deles é vendido na calçada mesmo. Em dias de jogos, montam a barraca próximo à entrada do estádio. Nos demais, ficam perto da rodoviária. Além de um espetinho acima de qualquer suspeita, oferecem um papo bom o suficiente para o torcedor perder o horário do jogo.

O fato de estarem do lado de fora do estádio talvez os coloque a salvo de cartolas e marqueteiros que nos impõem a inevitabilidade do “futebol moderno” e do “torcedor consumidor”.

Na contramão de um futebol cada vez mais sem graça e sem empatia com o povão, Fernando, Ivone, Toninho e Maria Aparecida resistem. São os heróis desta crônica.

Vida longa a eles! Vida longa ao Pão com Bife!

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