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Nos códigos inconfessáveis da imprensa tradicional, Nicolás Maduro nunca é o criminoso chefe de cartel. No máximo, pode aparecer como líder autoritário — dependendo da direção do vento e da presença ou não do Brasil na paisagem. O Prêmio Nobel da Paz concedido a María Corina Machado colocou essa imprensa em uma sinuca de bico.
A primeira saída encontrada foi destacar que o Nobel não foi para Trump. Há sempre um jeito de tentar despistar o público sobre o centro do problema. Como se sabe, Donald Trump — aquele que acaba de obter um acordo de paz na Faixa de Gaza — é o espantalho de plantão no álbum de figurinhas da imprensa. Mas aí María Corina dedicou o prêmio ao presidente dos EUA. E agora?
Bem, se a principal opositora à ditadura de Maduro está alinhada com Trump, sobrou criticar o Nobel. “A política foi colocada pelos diretores do prêmio acima da paz!” — disparou Celso Amorim, o chanceler informal do reino petista. As manchetes logo ecoaram a tirada do assessor especial de Lula, como se ela fizesse algum sentido. Se política e paz fossem coisas antagônicas, Mahatma Gandhi teria que ser riscado da história.
Ponha-se no lugar dos jornalistas que produzem o noticiário da imprensa tradicional. Não deve ser nada fácil. O regime bandoleiro que sequestrou a Venezuela está cercado pelos homens da lei, na operação norte-americana em desenvolvimento no Mar do Caribe.
Tudo bem que, para a imprensa brasileira, não é difícil chamar bandido de mocinho, mas tudo tem limite. Haja rebolado semântico para conjugar o Lula herói da democracia com o Lula aliado de Maduro
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Uma saída esperta foi enfatizar o papel do presidente brasileiro como guardião da soberania nacional diante da pressão exercida pelo governo Trump. Afinal, aí está o vilão providencial. Mas e se Trump liga para Lula e surge uma “química”? O que fazer? Para tudo existe solução. Nesse caso, as manchetes passaram a informar que o telefonema amistoso entre Trump e Lula “enfraqueceu o bolsonarismo”. Por falta de espantalhos, eles não sofrem.
Então, ficamos assim combinados: Lula, o PT e o regime que os sustenta são o Bem. Este é o referencial básico de valor da imprensa tradicional. Se a realidade começar a atrapalhar demais esse código moral, pior para a realidade. Como mostra o Nobel concedido a María Corina, se necessário, até a paz pode ser criminalizada.





