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Foto de Gabriela Biló/ Estadão
Foto de Gabriela Biló/ Estadão| Foto:

Dizem que a imprensa torce contra o governo, atrapalha o governo, quer derrubar o governo. Quanta injustiça. O governo é grandinho o bastante para derrubar a si mesmo. É crescidinho o suficiente para beber e tropeçar nas próprias pernas.

Decerto foi a imprensa que demitiu Sérgio Moro, sabotou as previsões de Paulo Guedes, costurou acordos com o Centrão, desmontou o ministério do Meio-Ambiente, ensinou Abraham Weintraub a escrever, escreveu o roteiro da Regina Duarte, fez apologia ao nazismo como Roberto Alvim: tudo culpa da imprensa.

As sandices dominicais, a zombaria na crise sanitária, as agressões reiteradas, a desinformação sistemática, o gabinete do ódio, o acampamento com militante armado, as conexões com milicianos, os expurgos ministeriais, as rachadinhas do 01, os tuítes do 02, a petulância do 03, o sumiço do Queiroz, o açaí da Wal, os ataques aos poderes, a falta de rumo administrativo, o atentado ao decoro, os apelos à ditadura, as declarações preconceituosas e todas as tramas e subtramas de um governo sem pé-nem-cabeça, que investe contra as instituições e testa os limites da razoabilidade política: tudo culpa da imprensa.

O fato é que a objetividade almejada dos noticiários e a imparcialidade defendida nas opiniões podem conviver muitíssimo bem com um papel ativo na vida democrática de um país. O jornalista não é somente espectador do que reporta. Também é crítico. Paulo Francis era crítico. Henry Louis Mencken era crítico. George Orwell era crítico. Edmund Wilson era crítico. Carlos Lacerda era crítico. Samuel Wainer era crítico. Joel Silveira era crítico. Vladimir Herzog era crítico.

Vale para todos os lados e gostos, da esquerda à direita, dos que apoiam aos que jogam tomates. O que se espera é que a conjunção de fatores objetivos e subjetivos seja honesta, bem-feita e às claras. Sem agendas ocultas, pagamentos por fora, arrependimentos de mentirinha.

Millôr Fernandes amava detestar FHC. Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo foram detratores incansáveis dos governos Lula. Marco Antônio Villa não deu um minuto de sossego ao governo Dilma. Exemplos recentes.

Eu quero derrubar o Jair Bolsonaro. Sim eu disse sim eu quero sim. Sei que não vou conseguir. Não derrubo nem o vereador da cidade onde moro. Portanto, os apoiadores fiquem tranquilos, durmam descansados, que o presidente não cairá por minha causa – mas eu quero. Eu quero e, contrito, peço a Deus – melhor: ao Deus do Antigo Testamento, o Javé dos Exércitos – que Jair Bolsonaro caia antes de 2022. Amém.

Pois o governo afeta a minha vida, o meu bolso, os meus valores, os meus nervos. Se o governo é ruim, absurdo, inconsequente, ineficiente, imoral, eu quero que esse governo caia. Se o Bolsonaro quer derrubar a democracia, por que eu não posso querer derrubar o Bolsonaro? Pelas vias democráticas, legais e institucionais do impeachment ou da renúncia. Sem nota de repúdio. Sem cabo nem soldado. Sem artigo 142. Que caia de maduro. De podre.

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