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Se não são a mesma farinha, estão no mesmo saco

(Arquivo Gazeta do Povo) (Foto: )

Rachel Sheherazade há não muito tempo era a musa jornalística da direita. Ao menos da direita mais barulhenta e ativa nas redes sociais. Jornalista corajosa e avessa ao politicamente correto. A mulher-maravilha do reacionarismo. Era tudo isso. Não é mais.

Bolsonaro e Lula: os “opostos” cada vez mais parecidos

Sheherazade teve o despudor de sugerir que Lula e Bolsonaro são opostos cada vez mais parecidos entre si. O crescimento patrimonial da família Bolsonaro, com quase três décadas prestadas de serviço público, com quase três décadas de vencimentos pagos pelo contribuinte, chamou sua atenção. Seriam farinha e votos do mesmo saco.

Bastou isso para que fosse execrada, enxovalhada, ridicularizada. Tudo, de repente, passa a ser questionado: sua coragem nunca foi coragem; sua ousadia não era ousadia; sua beleza nem bonita é. Agora ela é covarde, vendida, feia. Pois Sheherazade está certa, ainda que pelos motivos errados.

Talvez o patrimônio da família Bolsonaro não seja tão grande assim: há muitos Bolsonaros na casa do pai, e os vencimentos, auxílios e demais benesses da vida pública de cada um deles, somados todos, justificariam o crescimento patrimonial. São bons administradores do dinheiro (público) que receberam (licitamente). Palmas para eles.

Mas se Lula e Bolsonaro não são exatamente a mesma farinha e os mesmos votos, estão no mesmo saco. Qualquer crítica que se faça a Lula, justa ou injusta, comprovada ou não, desperta ira e revolta em seus correligionários. O mesmo acontece com Bolsonaro. Qualquer tentativa de fazer de Lula uma figura de carne, ossos e ambição provoca, nos entusiastas, ânimo de fazer inveja a cruzados. O mesmo acontece com Bolsonaro.

Lula já se disse tão perseguido quanto Jesus Cristo. Bolsonaro gosta que o chamem de mito. Lula e Bolsonaro não se acostumam com o contraditório, a irreverência, o questionamento. Acreditam, e seus militantes acreditam ainda mais, que a ascensão política se faz, se deve fazer, com a mais inquebrantável das fés.

Ambos creem que o aplauso das multidões legitima qualquer ato, qualquer mandato, qualquer eleição. Estou de acordo que, por enquanto, o patrimônio pode separar Lula de Bolsonaro. Do primeiro sabemos a suspeitíssima origem; do segundo ainda não temos indícios de ilicitude. Mas se o patrimônio os separa, o populismo os une.

A sanidade em política deveria ser medida com a régua do ceticismo. Se é preciso, de tempos em tempos, apostar na loteria do voto, que se aposte com a mesma íntima desconfiança que se tem na loteria em sentido estrito: alguém há de ganhar, provavelmente não serei eu. Políticos devem, no máximo, ser tolerados; adorados, nunca. Pois o populismo é o saco no qual são misturadas todas as farinhas. Depois de certo tempo na vida pública, fica muito difícil separar uma farinha da outra.

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