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DVD de Rafinha Bastos tem venda proibida por conter piada sobre deficientes intelectuais

Uma liminar da 2ª Vara Cível da Capital de São Paulo determinou que o DVD A arte do insulto, de Rafinha Bastos deve ser retirado de comercialização. A ação foi proposta pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) por entender que houve insulto “à honra e à imagem” das pessoas com deficiência intelectual que foram chamadas de “retardados” no vídeo.

Com a decisão Rafinha não só terá que retirar o DVD de comercialização, como também tomar as medidas necessárias para que o material não seja veiculado na TV e internet. Após recolher as cópias, ele deve apresentar à Justiça comprovantes de que tomou a providência.

Caso não o faça em 20 dias, a multa diária será de R$ 20 mil. Rafinha também terá que pagar R$ 30 mil por cada menção que fizer a Apae, ou pessoas com deficiência de forma de maneira degradante, por palavras, escritos, objetos, gestos ou expressões corporais. Cabe recurso.

Além disso, o juiz determinou a expedição de ofícios às Lojas Americanas, FNAC, Submarino, Saraiva e Livraria Cultura, para que não comercializem o DVD.

Reprodução / Divulgação
A capa do DVD “A arte do insulto”, de Rafinha Bastos

De acordo com os autos, a Apae reclama que em dado momento do show, Rafinha Bastos faz a seguinte piada: “Um tempo atrás eu usei um preservativo com efeito retardante … efeito retardante … retardou … retardou … retardou … tive que internar meu pinto na Apae… tá completamente retardado hoje em dia … eu tiro ele prá fora e ele (grunhidos ininteligíveis).” Durante os grunhidos, ele faz gestos desconexos simulando ter alguma doença mental.

Esse movimento é muito interessante e nos convida a uma conversa que pode ir além da piada do humorista. Na minha opinião, o centro do debate não deve ser esse.

Recentemente eu ministrei uma oficina ao lado de uma mãe de um rapaz com deficiência intelectual, então eu reconheço o quão ofensiva uma piada como essa é. Se a piada fosse sobre cadeirantes, eu não teria achado a menor graça, do mesmo jeito como eu não vi graça nenhuma na piada sobre a Apae.

A retirada de circulação do produto é uma resposta que demonstra muita força, uma rede de contatos bem orquestrada e poder de fogo de todos que trabalharam nessa ação. A Apae usou recursos legais e estava dentro do seu direito de indignação, se mobilizou e venceu (dentro do seu propósito). A proibição de comercialização do DVD abriu precedentes para a discussão sobre censura e sobre o que é politicamente correto.

Eu assisti ao trecho com a tal piada e vi outras passagens de A arte do insulto. O humorista faz piada com muitos outros grupos de minoria, todas em tom ácido, que é o estilo dele. Depois, vi entrevistas com o Rafinha Bastos e fica claro que ele não se importa com os processos e com as críticas que fazem em relação ao trabalho dele. A proibição da comercialização vai doer no bolso dele, mas não vai fazer com ele pare de fazer piadas assim e nem que pessoas parem de rir disso.

Eu também assisti à matéria protagonizada pelo próprio Rafinha Bastos sobre as dificuldades que pessoas com diferentes deficiências enfrentam diariamente em São Paulo e eu o achei brilhante naquele trabalho. Mesmo assim, eu não iria a um show stand up dele, porque eu não gosto desse tipo de humor. Posso não gostar do Bastos como humorista, mas gosto do trabalho jornalístico que ele faz. São coisas diferentes.

Acho fundamental ter em mente que piadas sobre minorias é uma questão cultural mundial, não só do Brasil. Um comentário sobre um dos textos que noticiaram a retirada do DVD do mercado foi muito pontual e levantado por um professor. Ele comenta que se essa onda mais forte do politicamente correto estivesse em voga no século passado “Noel Rosa não comporia a música Gago Apaixonado, Luiz Caldas não cantaria Nega do Cabelo Duro, Jose de Vasconcelos não imitaria um gago narrando partida de futebol, Costinha não faria piadas (e trejeitos!) de ‘bichinha’”.

Eu estudei a minha vida toda em um mesmo colégio, o Instituto Educacional Parthenon. No final do meu Ensino Médio, 10% dos alunos daquela escola tinham algum tipo de deficiência e estavam incluídos de maneira natural, porque o Parthenon era uma escola regular. Mesmo convivendo com pessoas com deficiência diariamente e terem amigos deficientes, muitos dos alunos não deficientes chamavam o Parthenon de Apaerthenon, pejorativamente. Essa cultura vem de onde?

A proibição da venda de A arte do insulto é uma forma de protesto, é um “não”. Representa o sentimento de milhares de pais, mães, amigos, namorados e namoradas e profissionais que trabalham com o deficiente intelectual. Mas mostra que a nossa sociedade está realmente mais madura e repudia, com sinceridade, a discriminação? É censura? Qual a sua opinião?

#Enconte o jornalista Rafael Bonfim no Facebook. Clique aqui para acessar o perfil.

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