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Leonardo Coutinho

Leonardo Coutinho

Brasil, América Latina, mundo (não necessariamente nesta ordem)

Violência política

Fogo nos fascistas? A esquerda vai mesmo continuar com esse discurso?

Charlie Kirk morreu após ser baleado no pescoço durante um evento na Universidade Utah Valley, nesta quarta-feira (10). (Foto: Gage Skidmore/Wikimedia Commons)

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O assassinato do americano Charlie Kirk não deve ser visto como “mais um” episódio de intolerância. É um marco: um influenciador conservador, pai de família, abatido por tiros de um atirador posicionado à distância durante um evento universitário, não pode ser banalizado nem ter a culpa transferida para a vítima, como muitos estão tentando fazer.

Quem acha que se trata de exceção precisa atualizar o mapa da violência política. Em 14 de junho, a líder democrata da Câmara de Minnesota, Melissa Hortman, e o marido foram executados em casa. Em seguida, um senador estadual e sua esposa foram baleados e sobreviveram.

O atirador não era exatamente um opositor político. Era um eleitor do Partido Democrata insatisfeito com as posições recentes de seus correligionários, que não eram suficientemente radicais para o seu gosto.

Também não podemos fingir que a tentativa de matar Donald Trump em 13 de julho de 2024, no comício de Butler (Pensilvânia), foi um ponto fora da curva. Investigações do DHS e do Senado detalharam falhas de segurança e reconstruíram como o atirador se posicionou em um prédio fora do perímetro, ferindo o ex-presidente na orelha e matando um apoiador. Meses depois, houve outro incidente grave em um clube de golfe.

A temperatura está subindo. E quem está tocando fogo é aquele que, ao se olhar no espelho, vê a imagem de um defensor da democracia e de um guerreiro contra o “fascismo”.

Em 2022, depois do vazamento do rascunho de um voto na Suprema Corte, manifestantes pró-aborto passaram a cercar residências de alguns membros do tribunal. Em um caso mais extremo, um homem armado foi preso em frente à casa do juiz Brett Kavanaugh com a intenção confessa de assassiná-lo.

O editorial do New York Times sobre a morte de Kirk acerta em um ponto: a violência política, hoje, é um fenômeno transversal. Pesquisas mostram que a parcela de americanos dispostos a considerar a violência “necessária” para “salvar o país” cresceu.

Em 2024, uma sondagem nacional apontava um quinto do eleitorado; em janeiro de 2025, uma pesquisa de campo em uma marcha progressista encontrou um terço dos participantes com essa disposição. Isso não é uma amostra do país. É um diagnóstico da esquerda americana — ou, pelo menos, do que a esquerda americana está se permitindo transformar, por meio da infiltração do discurso de ódio travestido de defesa da democracia.

Há números mais duros. A Reuters contabilizou mais de 1.300 episódios de violência política desde 2021 e cerca de 150 apenas no primeiro semestre de 2025. Think tanks como Brookings alertam: respostas seletivas — como condenar quando “é o outro” e relativizar quando “é o nosso” — ajudam a empurrar o país para uma espiral de retaliações. Esse é o roteiro clássico da erosão democrática.

O que liga esses pontos? A desumanização. Quando se reduz o adversário a rótulos como “fascista”, “nazista” ou “gado”, como no caso do Brasil, cria-se o álibi moral para esmagá-lo. A lógica é antiga: se o outro é um perigo existencial, qualquer meio vale.

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Nada disso invalida causas nem criminaliza protestos pacíficos. O que está em jogo é outra coisa: a fronteira civilizatória que separa o conflito democrático — muitas vezes duro, polarizado e barulhento — da violência como método.

Quando partidos, imprensa, influenciadores e autoridades naturalizam termos que animalizam pessoas, eles estão terceirizando a execução para o radical solitário de amanhã. Esse radical lê a guerra moral, conecta os pontos errados e puxa o gatilho.

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