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O presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, gostaria que o mundo acreditasse que o grito de guerra “Morte à América” é apenas uma metáfora. Em entrevista recente ao americano Tucker Carlson, Pezeshkian tentou suavizar o lema mais longevo da Revolução Islâmica, dizendo que ele não se refere ao povo americano, mas sim a um protesto contra a opressão e o imperialismo.
“Você já ouviu falar de um iraniano matando um americano?”, perguntou, com falsa inocência, tentando vender a imagem de um regime injustamente demonizado.
Carlson, que não estava ali exatamente para entrevistar o iraniano, ficou calado. Mas a resposta à pergunta é tão curta quanto objetiva: sim. Muitas vezes.
O Irã não apenas matou americanos. Sempre o fez como parte de sua doutrina de guerra assimétrica. Desde o início da Revolução Islâmica em 1979, o regime dos aiatolás estruturou uma rede de milícias, terroristas e agentes secretos com um único objetivo: expandir sua influência e exportar a revolução islâmica. Para isso, matar americanos (direta ou indiretamente) foi tratado como meio legítimo de ação.
O caso mais emblemático dessa prática ocorreu em Beirute, em 1983. Um caminhão-bomba atingiu o quartel dos fuzileiros navais dos Estados Unidos, matando 241 militares americanos. Trata-se do maior massacre de marines desde a Segunda Guerra.
O FBI identificou o Hezbollah como responsável pelo ataque. O grupo libanês, financiado, armado e treinado pelo Irã, se tornaria o modelo de exportação do terrorismo iraniano.
O ataque à embaixada americana em Beirute, meses antes, em abril de 1983, já havia matado 63 pessoas, entre elas 17 americanos, inclusive funcionários da CIA. Esse duplo atentado revelou não apenas a força dos tentáculos iranianos fora do Golfo Pérsico, mas também o início de uma guerra nas sombras contra os Estados Unidos.
Essa guerra teve continuidade no Iraque entre 2003 e 2011. Segundo o Departamento de Defesa dos EUA, 603 militares americanos foram mortos nesse período por ações diretas de milícias xiitas apoiadas pelo Irã, financiadas e treinadas pela Força Quds, que é a unidade de operações externas da Guarda Revolucionária Iraniana (IRGC).
Essas ações não eram conduzidas por “elementos descontrolados”, como gostam de dizer os porta-vozes de regimes autoritários. Tratava-se de uma campanha coordenada e deliberada, parte da estratégia iraniana de desgaste contra os Estados Unidos.
A atuação iraniana também transpôs as zonas de guerra. Em 2011, promotores federais dos EUA desmantelaram um plano de agentes iranianos para assassinar o embaixador da Arábia Saudita em Washington, num restaurante da capital americana. Se bem-sucedido, o atentado teria causado dezenas de mortes de civis.
Em 2022, o Departamento de Justiça dos EUA denunciou membros da Guarda Revolucionária por planejar o assassinato de John Bolton, ex-conselheiro de Segurança Nacional. Em 2023, Mike Pompeo e outros ex-integrantes do governo Trump permaneciam sob proteção 24 horas por conta de ameaças diretas do regime iraniano.
Após a morte de Qassem Soleimani, chefe da Força Quds, em janeiro de 2020, o Irã retaliou com ataques de mísseis balísticos contra bases americanas no Iraque e intensificou seu apoio às milícias armadas.
O conflito escalou, mas nunca se tornou direto: o Irã prefere agir pelas sombras, mantendo o verniz de respeitabilidade diplomática enquanto seus proxies fazem o trabalho sujo
O regime chegou a divulgar um vídeo em que simula o assassinato do presidente Trump, enquanto ele jogava golfe.
Esse padrão de negar enquanto ataca é típico da política externa iraniana. A violência é terceirizada, mas a autoria, inconfundível. O objetivo não é apenas militar, mas simbólico: demonstrar que os EUA não estão seguros nem mesmo fora dos campos de batalha.
O total de mortos americanos atribuídos ao Irã e seus representantes desde 1979 ultrapassa 860 pessoas. E esse número segue crescendo, silenciosamente, a cada ataque com drone, bomba improvisada ou emboscada contra interesses americanos no Oriente Médio.
Portanto, quando Pezeshkian pergunta com ironia se alguém já ouviu falar de um iraniano matando um americano, ele aposta na ignorância do interlocutor ou na amnésia do Ocidente.
A verdade é que “Morte à América” nunca foi uma metáfora. É uma declaração de intenções. Uma diretriz política. Um mantra repetido todas as sextas-feiras em Teerã e ecoado por seus aliados de Beirute a Bagdá, de Damasco a Caracas.
O Irã é um Estado patrocinador do terrorismo, com um histórico de sangue que não pode ser lavado com entrevistas simpáticas, como essa conduzida por Carlson. Sob a perspectiva do jornalismo, é evidente que se deve ouvir o presidente do Irã.
Mas romantizar regimes ditatoriais e não apertar um líder de um país responsável por centenas de mortes americanas é não apenas desonesto. É propaganda. Uma propaganda muito perigosa.
Conteúdo editado por: Aline Menezes





