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Em sua segunda semana de governo, o presidente Donald Trump aplicou mais um duro golpe na estrutura de poder do ramo estadunidense do Establishment oligárquico anglo-americano, com o fechamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).
Desde a sua fundação, em 1961, a USAID elevou quase à categoria de arte a habilidade dos EUA para disfarçar como ajuda humanitária, proteção do meio ambiente, e outras pautas legítimas, a sua capacidade de exercer influência política em países-alvo da sua agenda hegemônica, com mais eficiência do que os métodos mais diretos empregados por agências de inteligência como a CIA, com a qual, aliás, a USAID mantinha uma estreita cooperação.
Tais eram os casos do controle demográfico (disfarçado de planejamento familiar), proteção ambiental, do identitarismo e da democracia, além de outros, com o objetivo geral de manter sob controle as perspectivas de desenvolvimento dos países-alvo, em especial, daqueles ricos em recursos naturais.
Nas palavras do ex-deputado federal Ron Paul, em um artigo publicado em 3 de fevereiro:
“A USAID é um componente-chave das operações de ‘mudança de regime’ do governo dos EUA em todo o mundo. A USAID gasta bilhões de dólares todos os anos apoiando ‘ONGs’ no exterior que funcionam como governos paralelos, corroendo governos eleitos que os intervencionistas dos EUA querem derrubar. Por trás da maioria dos desastres da política externa dos EUA no exterior, veremos as impressões digitais da USAID. Da Ucrânia à Geórgia e muito além, a USAID está se intrometendo nos assuntos internos de países estrangeiros - algo que enfureceria os estadunidenses se estivesse acontecendo conosco.”
As reações esquizofrênicas de parte da mídia brasileira, principalmente, a que se apresenta como progressista, denotam a eficiência do disfarce, como esta manchete do Brasil247 (05/02/2025): “Em blitz fascista, Musk demite mais de mil funcionários de agência estadunidense”.
No Brasil, a USAID sempre dedicou grande atenção a duas pautas-síntese da agenda hegemônica estadunidense, o controle demográfico e a instrumentalização política da proteção do meio ambiente, que muitos chamam ecofascismo. Um relatório interno de 1997, reiterava os objetivos da agência:
“O programa da USAID se concentra em assuntos globais chave de meio ambiente e saúde, que também são prioridades para o Brasil. O programa também reflete as preocupações tradicionais dos EUA com a dignidade humana e o bem-estar, apoiando a sociedade civil em lidar com a juventude em risco. Igualmente, este período da estratégia presenciará a finalização do bem-sucedido programa de planejamento familiar da USAID, com responsabilidades assumidas por instituições brasileiras. (...)”
Na pauta demográfica, a agência foi importante apoiadora da Sociedade de Bem-Estar Familiar (BEMFAM), braço nacional da International Planned Parenthood Foundation (IPPF), entidade financiada pela família Rockefeller para promover o controle demográfico. A BEMFAM foi alvo de várias acusações sobre esterilizações forçadas de mulheres pobres em estados do Nordeste, que a acompanharam até meados da década de 1990.
A partir da década de 1990, a USAID passou a concentrar-se nas agendas ambiental e indigenista
Em 2005, a surgiu a Iniciativa para Conservação da Bacia Amazônica (ABCI, em inglês), com o propósito de coordenar ações de diversos grupos ambientalistas e indigenistas nacionais e estrangeiros, provendo-os dos recursos e instrumentos de “governança ambiental” para o controle efetivo das formas de ocupação da região, visando a obstaculizar o desenvolvimento do Brasil e seus vizinhos amazônicos, insidiosamente apresentado como uma ameaça à integridade do meio ambiente da região.
O programa contava originalmente com um orçamento de 65 milhões de dólares, a serem aplicados ao longo de cinco anos.
Em maio de 2007, em um artigo publicado no boletim eletrônico Resenha Estratégica do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa), expus o programa em uma edição que circulou rapidamente por todo o país e catalisou uma firme resposta à ABCI por parte de setores do governo brasileiro, via Itamaraty e Ministério da Defesa.
O “mal-estar diplomático” com a embaixada dos EUA, como o qualificou o jornal Correio Braziliense, forçou uma paralisação do programa, que foi posteriormente convertido na Iniciativa para Conservação da Amazônia Andina (ICAA), já sem o Brasil, que era o seu objetivo principal.
Mas a agenda “verde-indígena” da USAID no Brasil prosseguiu, embora com um perfil mais baixo, com a Parceria para a Conservação da Biodiversidade da Amazônia (PCBA), que passou a receber a maior parte dos seus desembolsos no país. Em 2024, foram cerca de US$ 14 milhões dos US$ 22,6 milhões do seu orçamento do ano.
Na PCBA, a USAID tinha como parceiras importantes ONGs integrantes do aparato ambientalista-indigenista que opera no Brasil. Entre elas: Instituto Socioambiental (ISA); WWF-Brasil; Fundação Amazônia Sustentável (FAS); Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB); Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB); Imazon; Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE); Conselho Indígena de Roraima (CIR); Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN); e outras.
O anúncio do fechamento da torneira estadunidense para essa máquina de intervenção política espalhou desalento entre os seus integrantes.
Na verdade, só podemos lamentar que as suas insidiosas atividades tenham persistido por tanto tempo.
Conteúdo editado por: Aline Menezes




