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No último dia 4, a revista Forbes anunciou uma façanha que deveria ser admirada por todos os brasileiros: Luana Lopes Lara, uma catarinense de 29 anos, de classe média, tornou-se a bilionária “self-made” (ou “não-herdeira”) mais jovem do mundo.
Cofundadora da Kalshi, uma plataforma de mercados de previsão que permite apostas reguladas em eventos como eleições, inflação ou mudanças climáticas, Luana acumulou uma fortuna estimada em cerca de US$ 1,3 bilhão – equivalente a mais de R$ 7 bilhões na cotação atual. Sua trajetória é um exemplo clássico de visão, risco e execução.
Mas, em vez de aplausos unânimes, o que se seguiu foi uma enxurrada de críticas. Nas redes sociais, fóruns e colunas de jornais, Luana foi rotulada de “arrogante”, "privilegiada” e “exploradora de apostas”. Acusações de que a Kalshi nada mais é do que uma “casa de bets disfarçada” pipocaram, questionando o mérito de sua riqueza. Outros a acusam de ignorar desigualdades por defender o capitalismo e a meritocracia como motores de ascensão social.
O ressentimento se alastrou rapidamente, via mídia e redes sociais. No YouTube, vídeos desconstroem sua narrativa como “propaganda capitalista”, omitindo que ela trabalhou 80 horas semanais antes do sucesso.
Uma entrevista na GloboNews exemplifica o viés: a repórter perguntou se ela teria chegado lá “vindo de outro contexto”, sugerindo que sua origem catarinense de classe média seria um trampolim invisível – como se fosse fácil alguém da classe média se tornar bilionário, ou como se ser catarinense fizesse alguma diferença.
Em suma, o que poderia ser uma história de inspiração tornou-se mais um ringue de debates, revelando que a cultura do ressentimento e da inveja, ainda que venha disfarçada de crítica social, está profundamente enraizada no Brasil.
O caso de Luana, filha de pai engenheiro e mãe professora, não é apenas uma história de sucesso; é um espelho que reflete tensões profundas da sociedade brasileira.
O fenômeno da demonização do sucesso alheio não é novidade por aqui: ele pulsa nas veias da nação, perpetuando a mediocridade coletiva. Todos os relatos sobre casos de sucesso econômico são invariavelmente recebidos com o argumento de que a ascensão individual é sintoma de um sistema injusto. O sucesso de um é sempre visto como roubo aos outros.
“Não somos casa de apostas”, Luana se deu ao trabalho de explicar em entrevistas, destacando o foco em educação financeira e previsão de riscos. Mas a discussão não é sobre dinheiro, educação financeira ou ética empresarial; é sobre emoções baratas e ostentação de virtude de justiceiros sociais. O debate sempre migra para ataques pessoais e linchamento moral.
Em vez de inspirar jovens a empreender, o ressentimento promove a narrativa de que o sucesso é inalcançável sem privilégios ocultos
Por que Luana desperta rancor? Em parte, a resposta está na desigualdade da sociedade brasileira. Em um país de mobilidade social baixa, o triunfo de Luana não é percebido como inspiração, mas como humilhação. A inveja se manifesta em memes, comparações absurdas e no impulso de reduzir o sucesso alheio a surtos de sorte ou vantagem indevida.
Não se trata de negar a desigualdade no acesso à educação e outros fatores perversos da sociedade brasileira. O problema começa quando a desigualdade estrutural se torna pretexto para negar todo e qualquer mérito individual. Meritocracia, no Brasil, virou um palavrão.
Psicologicamente, isso se explica pela “mentalidade de escassez”, conceito explorado pelo economista Daniel Kahneman. Em nações prósperas como os Estados Unidos, onde Luana enriqueceu, a abundância estimula a colaboração, pois o sucesso de um beneficia todos. Já no Brasil, a escassez gera um jogo de soma zero: a vitória de um é sempre percebida como a derrota de outro.
O país que pune o mérito
Um estudo da FGV de 2023 mostrou que 62% dos brasileiros invejam o rico mais do que admiram o empreendedor, contrastando com 28% entre os americanos. Não é coincidência que Luana tenha triunfado lá fora. Os Estados Unidos recompensam o risco, enquanto no Brasil startups enfrentam burocracia, impostos vorazes e um ecossistema que prefere se aliar ao Estado a apostar no risco da inovação.
Em vez de inspirar jovens a empreender, o ressentimento promove a narrativa de que o sucesso é inalcançável sem privilégios ocultos. Sociedades que nutrem a cultura da inveja investem menos em educação e capital humano, pois o foco vira nivelar por baixo, em vez de elevar o padrão de todos. No Brasil, isso se reflete na fuga de cérebros: jovens de talento prosperam no exterior porque sabem que, no país, o ambiente é hostil ao empreendedorismo.
O ressentimento também alimenta o populismo, favorecendo políticos que exploram a inveja: “Os ricos roubam de vocês!”. O resultado: políticas que taxam o sucesso, em vez de fomentá-lo.
Políticas assistencialistas exploradas por populistas usam a inveja para justificar mais intervenção, mas ignoram que riqueza se cria, não se redistribui infinitamente. Isso perpetua a pobreza: em vez de emular Luana – incentivar a estudar, arriscar, inovar – preferimos demonizá-la. Não é à toa que, no Brasil, o PIB per capita é de US$ 9 mil, contra US$ 76 mil nos Estados Unidos.
Comparações internacionais reforçam o argumento. Em países como a Coreia do Sul ou Singapura, bilionários como os fundadores da Samsung são heróis nacionais, inspirando gerações e impulsionando o PIB. Lá, a inveja é canalizada para a imitação, não para a destruição. No Brasil, acontece o oposto: o ressentimento cria normas culturais que demonizam os que enriquecem e desestimulam o empreendedorismo, levando à estagnação econômica.
Em vez de celebrar conquistas como a de Luana, que poderia motivar milhares de jovens a perseguir sonhos globais, optamos pelo cinismo. Isso não resolve desigualdades, ao contrário; as agrava, ao desestimular a criação de riqueza que beneficiaria todos, via empregos e impostos.
Imaginem um Brasil em que bilionários self-made sejam modelos, não alvos. Em que a inveja vire inspiração e o ressentimento vire resiliência. Luana Lopes Lara não é vilã; é um espelho que reflete o que o Brasil poderia ser: audaz, inovador, global. O rancor destilado contra ela nas redes não é sobre apostas ou privilégios; é medo daquilo que seu brilho revela sobre nós.





