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Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Geopolítica e desgoverno

Brasil, inimigo do mundo livre

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. (Foto: SHAWN THEW/EFE/EPA)

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Como se não bastasse o nosso STF se arvorar como poder de censura internamente, externamente nos tornamos inimigos do mundo livre. Em outras palavras, enfiamos o pé na jaca sem sequer ter o benefício de comer a jaca.

Assuntos como Relações Exteriores ou Conflitos Internacionais podem parecer confusos, pois há muitas variáveis a serem consideradas em qualquer análise. Para bem explicar e projetar possíveis cenários para os atuais conflitos no Oriente Médio precisamos reduzir essas variáveis e entender o conflito Israel-Irã. Cinco agentes são parte interessada: Estados Unidos, Israel, Irã, o mercado financeiro e o Brasil.

Estados Unidos cumprem seus objetivos

Foi promessa de campanha de Donald Trump trazer de volta os soldados em áreas de conflito, acabar com guerras internacionais e isolar os EUA de conflitos que foram estabelecidos pelos governos anteriores, a começar com Bush Senior, Bush Junior, Obama e Biden, que adotaram vertente mais intervencionista. A promessa de Trump era exercer uma presidência de paz, e não de guerra.

Uma parte considerável dos conservadores norte-americanos está atenta a essa promessa, a outra é pró-Israel e quer acabar com a ameaça, o Irã. Divididos nesse posicionamento, sabem que seu compromisso foi somente acabar com as bases de refino nuclear do Irã, e não necessariamente promover mudança no sistema iraniano ou aniquilamento completo do risco político que o atual regime impõe na região.

O presidente dos EUA é uma pessoa pragmática, e se houvesse uma chance da oposição do Irã obter capacidade de mobilização e organização da população, para assumir o comando, substituindo o regime, certamente ele teria prolongado por mais tempo a intervenção, mas como essa tendência não se confirmou, Trump houve por bem cortar o mal pela raiz, cumprir a promessa de campanha e também atender ao mercado financeiro, que está olhando os desdobramentos dos conflitos com muito rigor. Esses dois primeiros segmentos foram os primeiros a serem contemplados: a opinião pública - aqueles que não querem a guerra de forma nenhuma -, e o mercado mundial financeiro como um todo.

Irã, mudança de regime?

Um segundo agente está presente, o Irã, cujo modelo de regime já está muito debilitado, com a população mantida sob forte opressão, sem acesso a redes sociais, sem liberdade de expressão, constantemente perseguida pelo Estado. Isso demonstra a fragilidade e a insegurança dos aiatolás, que não se manteriam no poder senão através do medo.

De acordo com informações dos próprios ativistas, a maior parte da população rejeita o atual regime, mas não tem força e organização necessárias para depor o governo e precisa de ajuda externa para fazê-lo. Dessa forma, o povo iraniano sai perdendo com um ataque dos Estados Unidos limitado às usinas de refino de urânio, pois essa ação atinge apenas a infraestrutura, e não o que realmente o ameaça: o poder de repressão das forças de segurança internas. Nesse sentido, os mísseis de Israel têm feito um trabalho sistemático de remover os agentes do regime superior ao dos Estados Unidos.

Em síntese, o regime perdura, mas fragilizado como nunca esteve, só que não pelos ataques realizados pelos Estados Unidos, mas pelos ataques de Israel, que devem continuar, pois esse cessar-fogo entre Irã e Israel não deve se sustentar por muito tempo. Aliás, na história de todos os movimentos terroristas financiados pelo Irã, praticamente nenhum cessar-fogo foi respeitado, portanto, é improvável que este seja honrado. Talvez a única trégua respeitada seja entre Irã e EUA. Vamos ver.

Opção por manter os inimigos longe

O Irã também demonstrou que pretende manter os norte-americanos longe de sua região. E por que esta sinalização é clara? O Irã anunciou quando, como e quais bases americanas iria atacar no Iêmen, dando tempo para que fossem evacuadas, e essas bases já estavam subutilizadas ou mesmo abandonadas, então, o que o Irã promoveu foi  um contra-ataque simbólico, não necessariamente visando destruir a estrutura operacional ou eliminar soldados americanos, e para seguir essa linha, houve cuidado para evitar retaliações.

Note-se que esses dois agentes querem manter distância entre si. Assim como o Irã não quer proximidade com os norte-americanos, os Estados Unidos, e especificamente Trump, preferem ficar longe daquela região, este último em virtude dos compromissos de campanha assumidos. Sabemos que ambos se juraram de morte, odeiam-se e a luta continua, mas não neste momento. 

Acredito que podem estar ocorrendo negociações entre os militares iranianos com os EUA para afastar os aiatolás do comando do país; não está claro, mas é possível, em virtude da troca simbólica que ocorreu, com ambos atacando estruturas de menor relevância do outro. É uma conjectura possível, e o regime dos aiatolás pode estar chegando ao fim. Tanto as forças internas do Irã como os Estados Unidos estão em compasso de espera por um substituto dos aiatolás no poder.

Entre dois cenários, o menos ruim 

É importante vislumbrar dois cenários de mudança no Irã. Caso haja uma substituição forçada, como no Iraque, será um desastre. O Irã pode se tornar um estado falido, com gangues e grupos de interesse assumindo controle e rasgando o território, uma situação de cidadania fragilizada, instabilidade política, e é provável que se neutralize a influência externa, a exemplo do Iraque, que nunca se reorganizou como agente internacional e implodiu devido a questões locais, de corrupção, narcotráfico e terrorismo. Um governo fraco, que levou a região ao caos.

Em uma primeira situação, se o regime republicano for adotado no Irã, como ocorreu no Iraque, significará a falência completa do Estado. Por outro lado, em um segundo cenário, se for restaurada a monarquia iraniana, há um lado positivo, pois ela tem boas referências temporais, lembrando que o Xá Rheza Pahlevi foi deposto há apenas 46 anos, portanto, a geração que viveu os anos de liberdade no Irã nos anos 70 ainda está viva e pode apoiar a volta do regime monárquico.

No entanto, esse apoiamento não é unânime, e institucionalmente inexiste. Está concentrado na opinião pública, pois as instituições estão aparelhadas pelo sistema islâmico, que desde 1979 vem reforçando seu poder. Apesar de o Irã ter separação de poderes, instituições milenares e um certo regramento jurídico aprimorado, é um Estado totalmente aparelhado pela tirania dos aiatolás. Se a monarquia for restaurada, é possível que haja guerra civil entre os apoiadores da monarquia e os apoiadores dos aiatolás, que são dependentes do Estado.

É bom lembrar também que há mais de um milhão de agentes de segurança para repressão, não apenas nas polícias locais, mas nas forças armadas, além de um apoiamento de fiéis islâmicos radicais. Apesar do risco, este seria menos destrutivo se comparado ao estabelecimento de uma república, um sistema estranho à cultura iraniana e persa que poderia causar completo esfacelamento do estado.

Enquanto não houver uma oposição organizada dos iranianos para substituição do poder, a população ainda estará no compasso de espera de uma mobilização e o regime iraniano ganhará tempo de sobrevida, mesmo que enfraquecido.

Israel sobrevive

Um terceiro componente nesse jogo é Israel, que continua com sua missão de sobreviver e o Irã não vai parar com seus embates, sempre querendo desestabilizar o estado israelense. Continuará como protagonista a utilizar seu discurso contra Israel, como tem feito nas últimas décadas no mundo islâmico, apesar de que vários países islâmicos estão abandonando a ideia de atacar Israel, e a nova geração de líderes islâmicos está disposta a manter relações pacíficas, conscientes de que Israel está lá para ficar.

Como o Irã é uma entidade que participa da desestabilização internacional, nunca vai querer deixar Israel se solidificar como país. A missão do regime dos aiatolás sempre foi destruir Israel, muito a mando da Rússia e dos interesses da China, mas como o Irã é um país com recursos naturais e tem uma economia forte e indústria diversificada, capaz de produzir desde drones até armamentos sofisticados, tem sido quase um agente independente na desestabilização do Oriente Médio, impedindo que Israel se pacifique com outros países islâmicos.

Com esse ataque limitado dos Estados Unidos, Israel ganha ou perde? Ela ganha o que seria a maior ameaça: Irã tem armas nucleares destruídas, e temporariamente não pode atacar Israel com elas. Mas perde um agente poderoso como os EUA atuando na mudança de regime do Irã, uma vez que a sobrevivência de Israel diante do regime de aiatolás sempre estará em risco. A avaliação dessa situação é que Israel não sai 100% vitorioso do conflito. Sua segurança nacional foi obtida, sim, por enquanto, mas o cessar-fogo brevemente acabará e devem continuar os bombardeios. Um ganho pela metade, e Israel ainda tem muita história pela frente.

Mercado financeiro em espera

O mercado financeiro não quer um embate de longo prazo, e nem que os Estados Unidos se envolvam. A sinalização de recessão já estava ocorrendo, sinalizada em vários países, a exemplo do Canadá, e o mercado estava sintonizado com os acontecimentos no Oriente Médio.

Caso os EUA se envolvessem na questão, bem como outros países como Rússia e China aderissem e promovessem uma guerra duradoura, certamente o mercado financeiro estaria com uma visão muito negativa desse conflito, possivelmente gerando uma queda de atividade, não apenas no sistema financeiro, mas no sistema econômico, com empresas inseguras para poder investir e crescer. A visão do mercado está em evitar qualquer conflito internacional neste momento, especialmente o que envolva os Estados Unidos. Outra fonte de preocupação para o mercado é alguma possível retaliação do Irã majorando os preços do petróleo, o que poderia comprometer o fluxo e o fornecimento de energia para o mundo.

O Brasil dobra a aposta no perdedor

O Brasil assumiu uma posição contundente do lado do regime dos aiatolás. Está contra Israel e Estados Unidos, o que significa que está também contra o próprio mercado, sem entender os efeitos que sua atitude pode ter diante dos investimentos aqui. Irresponsável, o governo não entendeu que o país poderia sofrer sanções não apenas dos Estados Unidos, como de todos os antigos aliados do Brasil e dos EUA. Essas sanções atingem o governo e arrastam o povo brasileiro, pois o país demonstra estar em conluio com estados terroristas, sendo que já o estava com o narcotráfico. O que o país ganha? Nada, é o bobo da corte, perdendo o embate até para o Irã, que ganhou esse primeiro round do Brasil.

Essa posição de apoiar Irã, Rússia e China em um conflito em que não temos nada a ganhar pode ser tratado por alguns como burrada nas relações exteriores, mas o problema é maior: o país está sendo usado como fantoche para demonstrar sua opção política por países autocráticos como eles, que são maioria no mundo, e têm apoio coeso.

O conflito Irã-Israel não acabou. A novela continua e as nações do mundo livre aguardam um novo regime no Irã. Enquanto os aiatolás estiverem no comando, o mundo estará em risco, não apenas os EUA ou Israel. Todos aguardam no próximo capítulo um desfecho positivo, e de curto prazo.

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