Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Geopolítica

Os cinco blocos políticos do século 21

Mapa-múndi feito com dados naturais da Terra, projeção Eckert 4, meridiano central 10° leste. (Foto: Ktrinko/Wikimedia Commons)

Ouça este conteúdo

Há diversas maneiras de classificar países: por região, desenvolvimento econômico, regime, cultura etc., mas com as mudanças na política mundial, há necessidade de se definirem países por blocos políticos que transcendem diversas outras categorizações.

Como essas associações são políticas, elas podem mudar rapidamente e são inteiramente subjetivas. Entretanto, as tendências que observamos no início do século 21 são claras e precisamos entender quem são os jogadores entrando nessa nova era.

Como os países vão se comportar nesse século? Existem cinco categorias distintas de países, que se distinguem no cenário mundial, cada vez mais conturbado:

1. Globalistas

Os países dessa categoria, relativamente fáceis de identificar, são dominados pela social-democracia, baixo nível de religiosidade, uma população que não cresce, economias ricas e primordialmente urbanas, com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) alto. 

Sua política interna é relativamente estável; a sociedade, majoritariamente ateia, como já mencionado, é profundamente institucionalizada e se atém a pautas globais e acordos multilaterais, negociados em plataformas supranacionais. Ao mesmo tempo, são países extremamente democráticos, com muita transparência, baixa corrupção e detém sistemas políticos abertos e representativos.  

Ou seja, possuem uma política nacional de pautas globalizadas e, ao mesmo tempo contam com estrutura representativa próxima da realidade local, dos distritos, dos pequenos municípios. No centro há uma elite tecnocrata aliada a grandes oligarquias econômicas que dominam a política nacional, mas nos rincões locais há muita abertura democrática e autonomia local. 

Temos como exemplos vários países europeus como França, Alemanha, Holanda, Inglaterra, dentre outros. A característica principal é a ausência de uma liderança política carismática forte e o compromisso com um movimento globalista, antinacionalista. 

2. Multipolares

A segunda categoria de países que divide o mundo hoje são os países não alinhados ao globalismo, notadamente os que acreditam numa nova ordem multipolar, sem hegemonias. Rússia e China lideram esse grupo, que conta com a Arábia Saudita como expoentes influentes. Reforçam a ideia de BRICS como plataforma alternativa à ONU.

A maioria dos países que compõem esse bloco, porém, são considerados ditaduras de diversas espécies. São blindados de interferências externas, mas sem interesse de controle e influência internacional tanto quanto os globalistas. 

Por isso, não sofrem as consequências da agenda política das organizações globalistas, como a ONU, por exemplo, mas participam de todas elas e até têm influência em algumas delas. Defendem sua própria soberania, mas usam as plataformas globalistas para fragilizar e manipular a de outros países para obter resultados favoráveis aos seus regimes.

O controle de estado, sobretudo em seu território, é muito forte.  São modelos políticos centralizados e de extrema concentração de poder em pequenos grupos. A economia interna é controlada no molde fascista, por regulamentação e tributos. 

Na economia externa, seus métodos se parecem mais com o modelo do império inglês do século 19, ou seja, buscam controle de ativos econômicos estratégicos em outros países.  

Ao contrário dos globalistas, que detém uma agenda política supranacional clara, os multipolares não interferem aberta ou diretamente em outros países como os globalistas. É um modelo dissimulado. 

A influência e o controle de outro país são atingidos por meio de linhas de crédito, financiamento de obras públicas ou posse de ativos estratégicos. Subvertem os outros de modo mais tradicional, através de controle dos portos, de infraestrutura, financiamentos, oligopólios e corrupção dos governos locais. 

Todos esses fatores garantem um controle “de facto” de outro país, evitando a exposição do embate político. Internamente, têm um IDH muito mais baixo que os globalistas, instituições frágeis com ditadores fortes. É uma organização típica de países fascistas, com planejamento político central e predomínio de um só grupo e pouca liberdade individual.

Dominação e dependência: os multipolares oferecem uma narrativa distinta dos globalistas, no entanto, têm o mesmo objetivo de controle mundial. A diferença está no método: a subversão política dos globalistas é visível através do controle midiático da opinião pública, enquanto a dos multipolares é velada, por acordos econômicos.

Globalistas e multipolares, essas suas grandes forças que hoje dominam o mundo, compartilham uma origem comum, o movimento internacional comunista, liderado por Trotsky e Lenin, de um lado; e o fascismo, que deriva desse mesmo movimento liderado por Stalin, Hitler e Mussolini. Na raiz dessa diferença está o aspecto internacional versus o nacional do movimento. E esses aspectos perduram até hoje.

Alinhados ao aspecto internacional socialista de Lenin e Trotsky, estão os globalistas, enquanto alinhados à ideia nacional fascista de Stalin, Hitler e Mussolini estão os multipolares

No fundo, essas suas vertentes visam ao controle e à hegemonia. Nenhuma das duas promove economias livres, democracias soberanas, liberdade individual ou autodeterminação dos povos, ao contrário, são apenas duas propostas distintas de controle.

3. Soberanistas

Essa é uma categoria que está sendo resgatada, portanto, é mais rara e menos óbvia. São países que não sofrem influência dos blocos dominantes dos globalistas e multipolares. Possuem autonomia real. 

Esses países até participam de fóruns internacionais com os globalistas, são amigos e parceiros dos multipolares, mas só respeitam e prezam por suas instituições, suas agendas políticas e estão em alerta constante de violação da sua soberania nacional. E são poucos os países que têm o privilégio de estar nessa categoria: EUA, Inglaterra, Israel, Índia e Japão. 

Um dos principais expoentes dessa categoria sempre foram os Estados Unidos, por sua constituição e história de isolamento político. No entanto, desde o início da década de 90 do século passado, com a ascensão de George Bush, os Estados Unidos passaram a ser um grande promotor do globalismo.

Recentemente, com Donald Trump na presidência, o país voltou à sua vertente histórica soberanista, voltada a defender suas próprias instituições, origem, cultura, idioma, e não depender ou sofrer interferência de ninguém. 

Outro país de tradição soberanista que se perdeu é a Inglaterra, em que pese ainda ter um longo caminho para se re-solidificar como país independente, tomou um passo importante quando saiu da sufocante União Europeia e promoveu o BREXIT. 

Atualmente, o país ainda vive sob o domínio político dos globalistas, mas perdendo terreno rápido para um movimento popular soberanista liderado pelo mesmo protagonista do BREXIT: Nigel Farage.  

Israel é um notável exemplo de país que, apesar de seu pequeno tamanho, manteve-se soberano desde sua fundação e não sucumbe à pressão de qualquer organização internacional. 

Para se firmar como país independente, travou sérios embates contra potências europeias, assim como contra países maiores e vizinhos na sua região. Israel reforça a regra de que a soberania começa pela capacidade defensiva.

A Índia também é um país jovem; só obteve sua independência em 1947. É uma democracia imperfeita, mas desde cedo tem trabalhado para se firmar como país independente e soberano. 

Historicamente, a Índia sempre teve aversão profunda contra a colonização inglesa e o domínio europeu de qualquer espécie. Mas após sua independência, ela reforçou a sistematização de suas defesas, mais em função das ameaças regionais à sua soberania, notadamente Paquistão e China, potências nucleares e com muita população, e que disputam partes de seu território. 

A ameaça dos vizinhos afetou positivamente toda a percepção de como evoluir como país: defenda-se ou deixe de existir.

O Japão fecha essa lista, mas talvez seja o país com mais história de isolamento político de todos. Chegou a se firmar como império regional no século 19 conquistando e controlando a maior parte da Ásia com países de populações muitas vezes maiores. 

Depois da Segunda Guerra Mundial, teve sua política externa limitada e tutelada pelos EUA, mas sempre manteve sua política interna aberta somente aos grupos políticos locais, e em função disso se reergueu como potência mundial no final do século 20. 

Na América Latina, a Argentina deu os primeiros passos para se posicionar como soberanista, com Javier Milei. É possível que seja o primeiro país da América Latina a sair dos blocos dominantes dos globalistas e multipolares. 

A vertente soberanista é a mais apropriada para o Brasil, e temos tudo para sermos um dos expoentes dessa categoria, mas ainda estamos na categoria abaixo. Os vícios do sistema político brasileiro destroem qualquer chance de o país ter soberania. 

VEJA TAMBÉM:

4. Vassalos

Países vassalos não comandam seu destino, pois não têm instituições idôneas. Têm elites políticas e econômicas corruptas e um sistema político fechado e sob o comando de oligarquias, algumas delas criminosas. 

Os países vassalos são facilmente influenciados ou mesmo controlados diretamente pelos globalistas, multipolares e soberanistas.

Os vassalos não influenciam a agenda política internacional, no entanto, sofrem todo o efeito dela. Na maior parte, são países emergentes, com história repleta de falhas no sistema político, permitindo a agentes externos terem mais influência e comando que sua própria população. 

Países vassalos são dominados majoritariamente por globalistas e multipolares, porém alguns sofrem influência dos dois grupos. É o caso do Brasil. 

Sem defesa ou política externa assertiva, nem economia estável e saudável, o Brasil não sabe usar seu poder de barganha natural e sucumbe aos países que sabem

Não é um país soberano e aceita as agendas internacionais sem resistência. 

Os países vassalos são maioria no mundo. Recentemente percebemos como a Ucrânia é totalmente dependente dos blocos maiores. Também vemos o quanto o Canadá está prestes a cair nessa vala, bem como a África do Sul; ambos notadamente pela fragilização de suas economias e deterioração de sua política interna nas mãos dos globalistas, no caso do Canadá; e multipolares, no caso da África do Sul.  

Ódio mútuo: Importante ressaltar que os grupos Globalista e Multipolar se odeiam, pois estão competindo pelo controle mundial. Cada dia mais essas disputas amadurecem no uso de alguns países como proxy. 

A guerra com a Ucrânia, que é um país vassalo, tornou-se epicentro de conflito entre esses dois blocos. Exemplo muito claro das disputas entre globalistas e multipolares. 

O mesmo ocorre no Oriente Médio, que sempre foi uma região vassala desses dois grupos majoritários, com influência de um e de outro. Ao mesmo tempo, o Oriente Médio conseguiu subverter as forças globalistas, diminuindo seu poder, ao infiltrar-se nos conselhos da ONU e inverter praticamente o direcionamento desses conselhos supranacionais para refletir a realidade dos países muçulmanos. 

Essa dinâmica continua, e eles não são ainda países soberanos, mas alguns estão próximos de atingir uma política soberanista mais clara, como a Arábia Saudita, sobretudo em virtude da riqueza de seus recursos financeiros e naturais, como o petróleo. São exemplos isolados, pois dificilmente a maioria dos países da África e do Oriente deixará de ser vassalos.    

5. Fracassados

Os estados fracassados são aqueles que simplesmente não funcionam mais e os problemas de opressão e guerra civil são predominantes. Notoriamente são fontes de fortes movimentos migratórios. O domínio é por meio de facções: oclocracia.  

O país existe no papel, mas ninguém o respeita, dentro ou fora de suas fronteiras.  Há gangues regionais rivais cujas ações não são contidas pelo estado, que passa a ser mais uma gangue dentre as demais fontes de poder. Ou seja, a ideia de país implode e a área passa a ser um mero território. 

Nesse grupo de países, não há líder, instituição ou governo que de fato representem a população da região. Há diferentes facções que dividem e disputam o controle interno. 

Vários países vassalos estão próximos de se tornar estados fracassados. Na mesma moeda, muitos estados fracassados não têm a mínima chance sequer de se tornarem sequer vassalos. Subverter e fragilizar um país é rápido, ao passo que o fortalecer requer décadas.  

Entre os países fracassados estão regiões como Síria, Líbano, Líbia e Iraque, no Oriente Médio; assim como Congo e Somália, além de vários outros países na África. Na América Latina, a Venezuela é o melhor exemplo de estado fracassado. Mas há vários outros estados vassalos candidatos a se tornarem fracassados, como Colômbia, Nicarágua e Bolívia. 

Os estados fracassados são zonas de conflitos e facilmente explorados pelos agentes internacionais mais fortes. Agentes externos às vezes preferem que um país vassalo se torne um estado fracassado, pois não quer compartilhar poder.

Quem é quem na geopolítica? 

Essas cinco categorias apresentam um panorama da dinâmica para o século 21. Entender as interações entre elas e como cada uma se comporta facilita saber quem é quem nesse jogo, bem como a profundidade de suas capacidades individuais. Também ajuda a analisar quais riscos podem existir entre nações em conflito. 

Quando se trata de conflitos entre estados vassalos, sabemos que são uma proxy de blocos mais poderosos. A guerra consome uma enormidade de recursos e nenhum país pobre consegue sustentá-la por muito tempo, o que exige engajamento de outros países nos conflitos armados. 

Os três primeiros grupos - globalistas, multipolares e soberanistas - estes, sim, têm capacidade econômica e bélica de levar adiante sua defesa em esforço contínuo. O resto é vassalagem e manipulação. 

Conteúdo editado por: Aline Menezes

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.