No planeta das cidades

Como serão as cidades do futuro?

19/05/2023 19:00
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As cidades do futuro serão como as cidades de hoje. | Reprodução

Em 1925, a revista americana “Popular Science” publicou estudos do arquiteto Harvey W. Corbett e outros sobre cidades do futuro. Deu tudo errado. Quem viu ‘’Os Jetsons” ou “Flash Gordon” sabe que eles imaginavam cidades do futuro com carros voadores e edifícios de 300 andares. Não será nada disso. As cidades do futuro serão como as cidades de hoje.
Para entender por que, é importante ressaltar a diferença entre uma invenção e uma inovação. Uma invenção é um objeto, um gadget, uma “engenhoca”. Celulares, computadores e automóveis são engenhocas. É claro que são engenhocas fantásticas que mudam a vida de milhões de pessoas.
Uma inovação é um processo. Uma cidade não é um objeto, mas contém processos ligados a desafios sociais, econômicos, políticos, físicos e ambientais. As cidades são uma das mais complexas criações humanas. Elas evoluíram como consequência do crescimento econômico global. Quando o Brasil foi descoberto pela Europa em 1500, o PIB mundial era de US$ 250 bilhões. Permaneceu estável até a revolução industrial. Depois, cresceu rapidamente até os atuais US$ 97 trilhões.
Esse impressionante crescimento econômico foi possível devido às economias de escala permitidas pelas cidades, concentrando capital humano, empregos, tecnologia, densidade espacial e acesso a crédito.
Vivemos num mundo em rápida urbanização, afetado por mudanças climáticas, desemprego, degradação ambiental e exclusão social. Atualmente, cerca de 56% da humanidade vive em cidades. Em 2050, serão 70%.
As cidades consomem cerca de 75% da energia primária mundial e são responsáveis por 70% das emissões causadoras do efeito estufa, devido às indústrias e transportes. Por outro lado, as cidades são unidades extremamente eficientes. São motores de crescimento econômico gerando 80% do PIB mundial, enquanto ocupam apenas 2% da área do planeta. Cidades são cenários para inovação e soluções.
A ONU já organizou três conferências sobre cidades. Na primeira, em Vancouver, em 1976, as cidades eram o “inimigo” a ser combatido. Os países acreditavam em impedir a urbanização e o êxodo rural por meio de políticas públicas. Não deu certo. As cidades continuam crescendo. Na segunda conferência, em Istambul, em 1996, os países concluíram que a urbanização é irreversível e ressaltaram a dimensão humana das cidades.
Na terceira conferência, em Quito, em 2016, a “Nova Agenda Urbana” concluiu que as cidades podem e devem ter uma contribuição positiva nas questões sociais, econômicas e ambientais – promovendo equilíbrio social e acesso a serviços, entre outros aspectos.
Existe agora uma oportunidade única: a maior parte do crescimento urbano ocorre em cidades entre 100 mil e 250 mil habitantes. Essas cidades têm a opção de não repetir os mesmos erros cometidos por megacidades no passado. Senão, o futuro será catastrófico.
Invenções digitais talvez possam facilitar algumas decisões, mas não se iludam: o computador nunca irá substituir a estupidez humana. É uma encruzilhada. As decisões políticas sendo tomadas agora em nossas cidades – repito, em 2% da área do planeta – vão definir se teremos um futuro sustentável para todos ou não.
O contraexemplo das megacidades já fala por si: precisamos de mais Curitibas e menos Delhis, Shanghais e Dhakas.
As cidades do futuro não serão inteligentes se os que tomam decisões não o forem. Entender melhor os processos, desenhos e potenciais contidos em cada cidade e depender menos de engenhocas digitais já seria um bom começo.