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Naqueles dias, tempos depois de cometer o maior dos pecados, eu costumava chegar em casa geralmente bêbado e cheio de angústia. Ia até o aparelho de som, onde estava sempre o mesmo CD, e ouvia a mesma música. A voz e o violino, em um dueto que clamava aos céus, diziam:
Erbarme dich, mein Gott,
Um meiner Zähren Willen!
(Tende piedade, meu Deus,
por causa das minhas lágrimas!)
A ária Erbarme Dich é um dos momentos culminantes do oratório A Paixão Segundo S. Mateus, obra-prima da música ocidental composta por Johann Sebastian Bach, em 1727. Pode parecer estranho que um jovem comunista, ateu e pecador encontrasse conforto e consolação na música sacra do século XVIII, mas não existem coisas estranhas demais para Deus.
Foi assim, pela música, que comecei a libertar minha alma das trevas.
Bach descreve a dor e o arrependimento de Pedro após negar Cristo por três vezes, no pátio de Caifás. O apóstolo ouve o galo cantar três vezes, relembra as palavras de Jesus e chora amargamente. Muito tempo depois, vim a entender que aquelas lágrimas têm um significado universal: são as lágrimas do perdão.
Antes, na adolescência, eu ouvia Cálice, de Chico Buarque e Gilberto Gil, os dois velhos compositores que ontem subiram ao palco para defender a censura e a punição de inocentes. Lembro-me de colocar o LP na vitrola e me espantar com os versos que parodiam o sofrimento de Cristo no Jardim das Oliveiras. A cada vez que ouvia Cálice, sentia-me mais distante de Deus:
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
As lágrimas de Pedro, em Erbarme dich, levam ao arrependimento e ao perdão. As lágrimas de Cálice conduzem ao desespero. No fim, o que resta é a morte:
Quero cheirar fumaça de óleo diesel
Me embriagar até que alguém me esqueça
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Cálice é o avesso do perdão. Não por acaso, tornou-se a trilha sonora perfeita para aqueles que desejam vingança, humilhação e a morte dos inimigos nos dias de hoje.
No mesmo domingo em que a esquerda se reuniu para ouvir as velhas canções da MPB, mais de 200 mil pessoas escutavam, em silêncio e lágrimas, as palavras de Erika Kirk. Relembrando as palavras de Cristo no Calvário — pois, ao contrário do que diz a canção, o Filho de Deus não rejeitou o cálice da dor —, a esposa do jovem Sócrates do nosso tempo perdoou o assassino do marido. E observou que uma das principais missões de Charlie era resgatar jovens das trevas do desespero e da morte. Muito antes do poder político e da vitória no debate, Charlie Kirk buscava a salvação. E a obteve.
Naquele momento, lembrei-me da ária de Bach e compreendi que o mundo só será salvo pelo cálice do perdão. Tende piedade, meu Deus, por causa das nossas lágrimas.
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