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Meus queridos sete leitores, hoje eu queria falar de duas mulheres: Nadine e Juliana.
Nadine Heredia é ex-primeira-dama peruana condenada por lavagem de dinheiro no mesmo caso que envolveu a Odebrecht. Depois de ser condenada, pediu asilo ao governo brasileiro. E o que aconteceu? Em questão de poucas horas, meus caros, POUCAS HORAS, um avião da Força Aérea Brasileira lá estava, prontinho para buscá-la. Quase um serviço de táxi VIP, com tapete vermelho simbólico e tudo mais. O ministro das Relações Exteriores, em um gesto de solicitude bolivariana, defendeu o uso da aeronave oficial como a “única forma” de trazê-la. Rápido, eficiente, quase teletransportado.
Juliana Marins é uma jovem brasileira de 24 anos, cheia de vida, que fazia uma viagem dos seus sonhos. Ela não era ex-primeira-dama, não tinha condenação nas costas, não era figura política com contatos nas altas esferas. Juliana era apenas uma cidadã comum, trilhando um vulcão na Indonésia, o Rinjani. Caiu. Ficou presa por quatro longos dias. Quatro dias de agonia, de frio, de dor, de desespero. Quatro dias em que seus familiares imploraram por ajuda, por uma resposta, por um alento. E o que o governo brasileiro fez? Ah, a diplomacia entrou em campo, sim, a Embaixada em Jacarta se movimentou, claro. Mas e a celeridade? E a eficiência? E o avião da FAB? Nada disso.
A diferença não está apenas na rapidez da resposta, mas na essência das personagens. Nadine, comprovadamente culpada, com uma pena de 15 anos nas costas por um crime que afronta a sociedade, recebeu tratamento de Estado. Não vou nem entrar no mérito do asilo em si, mas a logística, a presteza, o “pode entrar que a casa é sua”, tudo foi assustadoramente rápido para alguém em sua situação.
Juliana, por sua vez, não era criminosa. Era uma vítima de um acidente, uma tragédia. Uma filha, uma amiga, uma cidadã que, em tese, deveria contar com o amparo de seu país em momentos de extrema necessidade no exterior. Não pedia asilo, precisava de resgate. E o que recebeu foi uma espera angustiante, que terminou em morte.
Quem vale mais para o governo brasileiro? Uma criminosa condenada, por mais que a defesa alegue perseguição, ou uma jovem inocente em risco de vida?
A resposta, meus sete leitores, parece ter sido dada no vulcão da Indonésia e no aeroporto de Brasília. E é uma resposta que, sinceramente, me deixa com um gosto amargo na boca e a sensação é a de que vivemos no país das inversões.
O país em que o advogado contrata um advogado para defendê-lo do juiz que também é vítima, promotor, investigador e corregedor do caso.
O país em que um homem contrata maquiadores com dinheiro público para que os outros o vejam como mulher, e ameaça de prisão aqueles que disserem que ele nasceu homem.
O país que condena uma mãe de família a 17 anos de prisão por manchar uma estátua com batom e coloca em liberdade os degoladores de uma jovem.
O país responsável por permitir que uma ditadura teocrática desenvolva a bomba atômica e depois se revolta quando a fábrica da bomba atômica é atacada.
O país em que um humorista é preso por contar piadas e o corrupto condenado a 400 anos de prisão é libertado para rir da nossa cara.
O país que não perdoa o sujeito que devolveu uma bola furtada, mas descondena o sujeito que destruiu o país.
O país que condena velhinhos à prisão e deixa em liberdade os ladrões de velhinhos.
O país em que as Nadines encontram refúgio e as Julianas encontram a indiferença.
O país em que todos são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros.




