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Paulo Filho

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Tensão global

Do “Departamento de Guerra” ao desfile militar: EUA e China mandam seus recados

EUA assumem o discurso da guerra e a China exibe seu arsenal nuclear: sinais claros de que o mundo caminha para uma era mais tensa e instável. (Foto: Vincent Thian/Aaron Schwartz/EFE/EPA/POOL)

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O Departamento de Defesa dos EUA mudou de nome. À porta do Secretário Pete Hegseth, a placa já foi alterada: “Secretário da Guerra”. O simbolismo da mudança, efetivada na última sexta-feira, dia 5 de setembro, reflete, sem nenhuma sutileza, as transformações em curso no mundo.

Na semana passada, acontecimentos separados por milhares de quilômetros, ocorridos nas Américas e na China, exemplificaram a piora dos humores globais.

No Caribe, os EUA empregaram, pela primeira vez, suas forças armadas para realizar um ataque com um míssil e destruir uma lancha que transportava, segundo divulgado pelo governo norte-americano, onze narcotraficantes e uma carga de drogas que teria saído da Venezuela com destino aos EUA.

A destruição da embarcação, em vez da prisão dos traficantes e da apreensão das drogas, mostra uma mudança radical nas regras de engajamento e nos procedimentos adotados pelos EUA no enfrentamento do tráfico de drogas em seu território.

Foi a primeira ação conhecida que atendeu à nova política, anunciada há pouco mais de um mês, quando se divulgou que o presidente Trump havia assinado uma ordem autorizando as forças armadas a utilizarem a força contra determinados grupos de narcotraficantes equiparados a grupos terroristas. As autoridades do país passaram a se referir a esses grupos como “narcoterroristas”.

O “Tren de Aragua”, grupo criminoso venezuelano incluído nessa lista americana dos narcoterroristas, foi apontado como o responsável pela lancha destruída. As imagens monocromáticas, captadas pelas câmeras de visão noturna do vídeo da destruição da embarcação, gravadas a partir de drones e embarcações da Marinha dos EUA, foram imediatamente divulgadas para servirem de alerta: os EUA não hesitarão em utilizar seu poder militar, especialmente em seu “quintal” – expressão usada pelo Secretário da Guerra, Pete Hegseth – para fazer valer seus interesses.

Quase ao mesmo tempo, do outro lado do mundo, os chineses transmitiam uma mensagem desafiadora ao poderio militar norte-americano: a de que pretendem assumir o papel de “novo xerife na cidade”.

O desfile militar realizado em comemoração aos 80 anos da vitória chinesa sobre os japoneses na Segunda Guerra Mundial foi planejado e executado para mostrar ao mundo o poderio do arsenal chinês.

Os chineses, como de costume, não economizaram no treinamento para a parada militar, na qual mais de dez mil militares desfilaram com precisão milimétrica diante de líderes de quase trinta países no palanque. Entre eles estavam, ao lado de Xi Jinping, em posição de destaque, Vladimir Putin, da Rússia, e Kim Jong-un, da Coreia do Norte.

Vale destacar que esses três líderes nunca haviam se reunido em um mesmo evento. A última vez em que os chefes dessas três potências nucleares estiveram lado a lado foi há sessenta e seis anos, ainda no contexto da Guerra Fria.

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Mas o que realmente chamou a atenção foi o desfile das modernas armas das forças armadas chinesas, todas de fabricação local. Pela primeira vez, foram apresentados em conjunto mísseis balísticos, de cruzeiro e hipersônicos, todos capazes de transportar ogivas nucleares, que podem ser lançadas a partir de plataformas terrestres, navais ou aéreas – a chamada tríade nuclear. Dentre esses, o míssil balístico DF-5C ganhou destaque, em razão de seu alcance, capaz de atingir qualquer alvo no planeta.

Para além dos mísseis, os chineses mostraram uma família completa de drones – aéreos, terrestres e navais –, novas armas que utilizam energia dirigida, como lasers e micro-ondas; um carro de combate de quarta geração, com defesas ativas antidrones e armas automatizadas, entre várias outras.

Os episódios protagonizados por EUA e China na última semana, embora distintos, convergem em uma mesma direção: a centralidade das demonstrações de força na política internacional. De um lado, os EUA assumem o discurso da guerra, inclusive contra o crime organizado em seu entorno imediato. De outro, a China exibe um arsenal que a credencia a rivalizar diretamente com Washington.

O simbolismo da nova placa à porta do Secretário da Guerra e a precisão coreografada da parada militar em Pequim deixam claro que a disputa entre as grandes potências ingressou em uma fase mais assertiva – e perigosamente instável.

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