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Aconteceu de novo. Estava eu lavando a louça quando um pensamento me veio à mente: e se o Bolsonaro morrer? E de novo levei um susto, porque no instante seguinte me vi precisando deixar bem claro para o leitor, sobretudo aquele que leu minha resposta ao Estadão e ainda assim saiu me xingando, que não! Não estou torcendo pela morte do ex-presidente nem nada do gênero. (Bem estranha essa coisa de deixar claro em negrito, mas você entendeu).
Só não deu para evitar se perguntar o que acontecerá ao país se Bolsonaro morrer. Afinal, o personagem em questão é um senhor de 70 anos que passou 12 horas na mesa de cirurgia. Não deu e repare que, em assim pensando, estou reconhecendo a importância política e até histórica de Bolsonaro. O quê? Não quer reparar e prefere insistir em dizer que esta é uma crônica mórbida ou de mau agouro ou coisa parecida? Então tá.
A vida é frágil
Vou pedir só mais uma vez para você deixar essa birra de lado, por favor. E continuarei o texto dizendo que sei que você também pensou isso: e se o Bolsonaro morrer, hein? Se duvidar, você ainda balançou a cabeça, como se o movimento brusco fosse livrá-lo do pensamento incômodo. Acertei? Porque de fato a morte de Bolsonaro é uma dessas variáveis com as quais não trabalhamos quando analisamos questões como a sucessão presidencial, a anistia e o próprio futuro da direita.
Simplesmente partimos do pressuposto de que Bolsonaro estará vivo e atuante em todas essas frentes. O que é um erro, sabemos. Afinal, a vida é frágil, Bolsonaro já tem 70 anos, levou uma facada, come pão com leite condensado, vive uma rotina para lá de estressante, etc. E é neste momento que abro um parágrafo para dizer que, apesar de ter me perguntado... Ops. Esqueci de abrir o parágrafo.
Prost e Senna
Agora sim: apesar de ter me perguntado assim rapidamente e à toa o que aconteceria ao Brasil se Bolsonaro morresse, não consegui imaginar nada além do cortejo fúnebre e do macabro festival de perversidade nas redes sociais. Lula participaria do funeral? Janja exibiria seu mais novo Versace de luto, digo, luxo? Alexandre de Moraes seria como Prost segurando o caixão de Ayrton Senna?
Também pensei na dor da família e foi curioso, porque me dei conta de que nessas horas a gente tende mesmo a esquecer que o ex-presidente é pai, marido, tio, primo e amigo. Papéis, aliás, que tendem a ser bem diferentes da persona pública que estará sujeita ao escrutínio histórico. Mas eu falava do funeral e me perguntava se Alexandre de Moraes ousaria segurar o esquife presidencial.
Bolsonaro x Jair
Sei lá! Só sei que as 12 horas de cirurgia a que Bolsonaro foi submetido, bem como o memento mori, me lembraram da pena que sinto pelo homem – e que até hoje me rende zoações na mesa do bar. Pena? Sim. Vivo dizendo por aí que a facada transformou o político Bolsonaro (antes um mero Jair que vestia paletó de vez em quando) num mito para o qual o Jair (aquele do Vale da Ribeira) não estava preparado. Ninguém está. Mas as pessoas confundem um com o outro e é aí que está a tragédia do personagem.
De qualquer modo, até a conclusão desta crônica Jair Bolsonaro está vivo, se recuperando da cirurgia. Até onde vi, houve algum ruído de comunicação quanto à estadia dele na UTI, mas isso é normal nessas situações. Gostando ou não do ex-presidente, rezemos por ele uma Ave Maria. Agora vou lá terminar de lavar a louça que abandonei para vir aqui escrever.




