A ideia era de uma simplicidade quase infantil: tirar uma selfie com o ministro Alexandre de Moraes e, a partir dela, descrever a proximidade com ele que é hoje O Homem Mais Poderoso do Brasil, vários degraus acima do presidente Jair Bolsonaro. E, como você acompanhará nos parágrafos seguintes, quase deu certo. Quase, porque me atrapalhei com o celular e, depois, cometi o erro maior de me sentar e ouvir o que Alexandre de Moraes tinha a dizer. Foi (é!) assustador.
Eram 9 horas de uma manhã gelada e úmida quando Alexandre de Moraes chegou ao campus da Universidade Positivo, onde estava sendo realizado o 8º Congresso de Direito Eleitoral. O carro onde estava o ministro veio escoltado. E a presença de policiais e do giroflex por um breve momento contrastou com a incrível falta de segurança do evento. Não havia nenhuma preocupação quanto à possibilidade de um incidente violento - ou cômico.
Ao perceber a movimentação no acesso ao prédio, liguei o celular. Mas me distraí por uns segundos e, quando percebi, Alexandre de Moraes estava diante de mim, a calva totalmente exposta ao frio curitibano. Recebido por uma moça do evento, ele avançou sem maiores simpatias. Absorto que estava com aquela carranca suprema ali perto de mim, até me esqueci da selfie.
Alexandre de Moraes seguiu adiante, sem nem olhar para os lados. Era como se não houvesse nada nem ninguém ao redor. Como se o ser humano tivesse vendido a alma à “instituição”. Não deu para ver se ele tinha dentes brancos, amarelados ou cariados, porque ele não sorriu. Perfume eu não senti nenhum – se bem que tive Covid há alguns dias e meu olfato está prejudicado. “Que vida!”, pensei. Mas eu sempre penso isso.
Para minha surpresa, não foram muitas as pessoas que se aproximaram do ministro. Até os outros repórteres pareciam intimidados. Isso me deu certa margem de manobra para tirar a tão sonhada selfie. Ah, se ao menos eu não tivesse me atrapalhado todo com o celular. Mas confundi a foto com o vídeo e me embananei todo com a câmera da frente e a de trás. Resultado: quando consegui me posicionar e mirar o celular, o ministro desapareceu por uma portinhola.
Acabou precocemente a aventura original. Ao estudar o resultado (que ilustra essa crônica), decidi dar ao ministro Alexandre de Moraes uma segunda chance de tirar uma selfie comigo. “Te pego na saída”, pensei. Ou talvez tenha dito baixinho, mas não no tom ameaçador com que você certamente leu. Entrei no auditório e me sentei no fundão, como convém. E agora começa a parte assustadora da crônica.
A parte assustadora
Depois dos rapapés de praxe, Alexandre de Moraes assumiu o microfone e se pôs a falar em frente a um painel que exibia os patrocinadores do evento, entre eles grandes bancas como Pinheiro Neto e Tozzini. Não dá para negar: fala bem, o homem. Uma pena que ele cative a plateia não por sua inteligência ou perspicácia, e sim pelo medo que suas palavras instigam em qualquer um que tenha apreço pela liberdade.
Liberdade essa que, fica claro, Alexandre de Moraes não entende. E, ao que parece, não há ninguém neste mundo capaz de fazê-lo entender. Ao descrever o cenário histórico da nossa “democracia”, do golpe militar que pôs fim à Monarquia até os dias atuais, ficou claro que Alexandre de Moraes privilegia o olhar marxista e se vê como um “agente transformador”, destinado a guiar a sociedade rumo ao Progresso. E, para isso, ele sente que precisa tolher essa tal liberdade que nós, pobres mortais, não sabemos utilizar.
O que mais me chamou a atenção, porém, foi o tom de certeza tola com que Alexandre de Moraes expressa suas ideias. “As redes sociais, que surgiram para disseminar ideias democráticas, foram cooptadas por forças antidemocráticas”, disse ele em certo momento. Um ministro do STF. Para em seguida dizer que as revoluções sangrentas da Primavera árabe foram “primaveras democráticas”.
Não há nada mais perigoso do que um tolo cheio de convicções, como parece ser o caso. A não ser, talvez, um tolo cheio de convicções e ainda por cima conspiracionista. Alexandre de Moraes acredita piamente na existência de uma máquina de extrema-direita (para ele a direita é sempre extrema) cuja função é desestruturar o Estado Democrático de Direito.
Para ele, as relações democráticas são como uma novela. O STF faria parte de um núcleo de resistência. O núcleo do bem. Já a “extrema-direita”, o núcleo do mal, se dividiria em vários núcleos menores, dedicados à tal desestruturação do Estado Democrático de Direito por meio das fake news. Incapaz de entender como funciona a livre circulação de ideias, sobretudo de ideias contrárias às dele, Alexandre de Moraes vê a existência de uma estrutura hierárquica contendo um núcleo de produção, um núcleo de divulgação, um núcleo político e um núcleo financeiro. Ou seja, toda uma estrutura que conspira contra o que ele entende por democracia.
Além de conspiracionista, Alexandre de Moraes é um animal encurralado que, ao que parece, fará de tudo para impedir que a elite reinante da qual ele faz parte perca o poder. “Esse obstáculo logo será superado”, diz ele em tom mais de ameaça do que de profecia. Fica subentendido que essa superação se dará por meio da derrota de Jair Bolsonaro e por meio da regulação das redes sociais – que Alexandre de Moraes vê como favas contadas – e do retorno da informação centralizada. Uau.
Nessa hora, saí do auditório. Fiquei pensando na pergunta que pretendia fazer ao ministro, se houvesse oportunidade: “O senhor acredita que o Brasil estará pacificado no dia seguinte à eleição, independentemente do resultado?” Acho que, de certa forma, um ministro do Supremo Tribunal Federal e futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral que se orgulha de ser protagonista de uma “turbulência virtuosa” é resposta o suficiente para minha pergunta.
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