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Não sei o que aconteceu. Mas hoje tirei o dia para pensar em todas as coisas ruins que escrevi. Na vida. E não foram poucas. Textos escritos às pressas ou no calor do momento, inclusive usando clichês abjetos como este. Crônicas desesperadas, escritas para dialogar e tentar amainar o desespero do leitor. (Olha a incoerência aí!) Algumas ironias desastradas. Umas confissões desnecessárias (tipo esta?). E até textos agradáveis na forma e no conteúdo, mas escritos sob efeito dos vapores tóxicos de uns ressentimentos e mágoas mal disfarçados.
Sei que é normal e comum, ainda mais quando se está falando num número que já ultrapassou o milhar. E não estou escrevendo isso para que me passem a mão na cabeça ou coisa parecida. Sei que mais acerto do que erro. Mas erro. E por isso hoje achei que valia a pena escrever esta reflexão que compartilho com o leitor que me quer bem e, já que não posso escolher a plateia, com o leitor que não me quer tão bem assim. Sou falho. Insuportável e humanamente falho. E reconhecer isso pode até libertar, mas dói. Ah, se dói.
Incontornável, como se diz
E, se dói, é porque sei o quanto me dedico a cada texto. Você não faz ideia! A cada palavra, frase, parágrafo. Até nas ilustrações e legendas. A cada firula que me ocorre e a cada ideia que tento desenvolver para dar ao leitor um momento para ele fugir do noticiário pesado. Às vezes rindo, às vezes espumando de raiva – desde que essa raiva seja daquelas bem ridículas, passageiras e inócuas. Por vezes provocando também. E se provoco é porque gosto de ser provocado. Como assim você não gosta de ser provocado? De ver reviradas as suas certezas (que às vezes também são ou eram as minhas)?
Mas eu dizia que dói e dói também porque às vezes, bem de vez em quando mesmo, a comunicação entre nós fracassa. A metáfora... não encaixa. A ironia escapa. A referência sutil ou explícita foge. O adjetivo pesa e o advérbio, capaz de mudar tudo, passa despercebido ao leitor. São os famosos ruídos de comunicação que a gente aprende na faculdade e aos quais tenta não dar muita atenção, senão a gente pira. Por fim, tem aquela coisa de algumas almas serem incomunicáveis, como já dizia o poeta. Acontece. É incontornável, como está na moda dizer.
Autoflagelo público
Nada disso, porém, exime o autor da culpa por suas falhas e é nessa culpa que mergulho hoje, sem saber direito o que fazer com ela. Nem como defini-la direito. É culpa de intenção? Culpa de preguiça? Culpa de vaidade? Pedir desculpas, acho, é o caminho mais simples e óbvio, mesmo que não adiante muito. E, no mais, a quem? A você? A mim mesmo? Em todo caso, me desculpe. E agora pronto. Pode se divertir com as pedras que você tem à mão aí.
Também me ocorre às vezes aplacar essa culpa apagando um texto, riscando-o da memória, enchendo o lixo com bolas e mais bolas de papel virtual e amaldiçoando o dia em que me sentei para escrever aquilo. Tenho vontade de pesquisar se a legislação me dá o direito ao esquecimento e se vou ter que contratar advogado para isso. Mas, pensando um pouquinho melhor, de que adianta o espetáculo do autoflagelo público? Para nada.
Tinta do arrependimento
Então talvez seja o caso de apagar também esta crônica amarga, escrita com a tinta do arrependimento e a pena da melancolia, numa caligrafia hesitante sobre um pergaminho de culpa. Mas não. Vou deixá-la aqui quieta neste meu cantinho privilegiado (ao qual sou grato), como um registro dos erros pretéritos, sim, mas também como um lembrete dos inevitáveis erros futuros.
Sou falho. Erro, erro muito, erro demais para o meu gosto. Por mais que eu queira acertar, erro, e vou continuar errando. Porque sou humano e, infelizmente, suscetível a umas tentações bem bestas. Inclusive a do elogio. Mas só de saber e reconhecer isso... Sei lá. Estou tentando encontrar um motivo, um bom motivo, para ter escrito sobre meus erros, culpas e arrependimentos. Tanto os literários quanto os jornalísticos. Ainda mais hoje. Até porque o que me resta, dizem, é fazer o meu melhor, sempre com a melhor das intenções, mas sabendo que falharei. Invariavelmente falharei.




