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Romeu Zema: gosta de poesia, jovem?| Foto: Reprodução

O governador de Minas Gerais e, dizem, candidato à Presidência em 2026, Romeu Zema, caiu numa pegadinha intelectualoide: deram a ele um livro da grande poetisa Adélia Prado. E ficaram só esperando o tecnocrata reagir como reagem normalmente os tecnocratas. Isto é, ficaram esperando que Zema exibisse toda a sua (dele) “ignorância poética”. O que de fato aconteceu. “Ela trabalha aqui?”, perguntou ele, fazendo a festa de quem estava louco por uma oportunidade para chamá-lo de “burro”.

O caso me lembrou outro semelhante, quando Sergio Moro foi exposto ao ridículo por Pedro Bial, que lhe fez uma pergunta nessa mesma linha. Moro, um tecnocrata assim como Zema, não soube responder. Não porque os dois sejam burros, palavra que, neste contexto, é sinônimo de incompetência e corrupção intelectual. E sim porque tanto Moro quanto Zema são, repito, tecnocratas, frutos de um tempo que fomenta o conhecimento técnico em detrimento desse conhecimento mais etéreo – que aqui vou chamar de sabedoria.

A reação foi a que se esperava, mas com uma pitada extra de hipocrisia. A esquerda que rejeita os tecnocratas liberais e conservadores, mas idolatra os tecnocratas comunistas e progressistas, correu para falar da ignorância literária do governador de Minas Gerais. Mas, epa!, tem um detalhe aí: para os padrões de quem quer ver Zema pelas costas, Adélia Prado é uma “reaça” e, portanto, uma inimiga.

A desatenção a esse detalhe é sintomática. Longe de ser popular, para essa esquerda que corre apontar o dedo e chamar o governador de Minas Gerais de burro, ignorante, onde já se viu?, Adélia Prado é um nome a ser decorado como “representante da poesia feminina”. Ou algo assim e nada mais do que isso. Mas duvido que os bibliófilos vermelhinhos tenham se detido já sobre um poema da mulher à qual o próprio entrevistador se refere como “uma escritora muito conhecida de Divinópolis”.

Tiririca

A história-de-rodapé seria apenas uma exibição do intelectualismo vazio da esquerda. Mas quem tiver olhos de ver que veja: a ignorância literária de Zema, ainda que inofensiva, diz muito sobre os políticos a que estamos de alguma forma submetidos. E repare que Zema, até onde sei, não é desses políticos que fazem da ignorância e da simplicidade intelectual estandartes do populismo. Zema não é nenhum Tiririca. Nem Lula.

Há neste caso dois aspectos que já mencionei neste espaço. Primeiro, o baixo nível cultural da nossa elite, seja ela econômica, política e jurídica. O que é absolutamente normal e nos leva necessariamente ao segundo aspecto. Hoje em dia, o mundo da política (no qual se pode incluir sem medo os juízes) privilegia os mais suscetíveis às tentações do poder e do dinheiro. Isto é, os que tendem a ignorar a sabedoria e exaltam o conhecimento.

Traduzindo-me: a política contemporânea tende a atrair aqueles que mais facilmente se deixam corromper pelos valores mundanos, sobretudo pela noção de sucesso, seja ele financeiro, político e ideológico. Em geral, são pessoas cujo entendimento do mundo ignora coisas como honra, bem comum e verdade e se atêm a coisas como eficiência e sucesso. A política, salvas as raras exceções que, infelizmente, não me ocorrem no momento, atrai quem já é de certa forma escravo da política e, mais uma vez, do que ela representa: poder e dinheiro. Pessoas que, não raro, estão dispostas a tudo para conseguir mudar o mundo de modo que ele se adeque a uma visão muito própria de felicidade. De Paraíso.

Apesar disso, ouso estourar a bolha do cinismo para dizer que prefiro um tecnocrata poeticamente pouco instruído, como Romeu Zema, a tecnocratas leitores de dramalhões sociais contemporâneos, distopias e poesia marginal. Afinal, tecnocratas do primeiro tipo ao menos têm uma visão da realidade baseada na exatidão ilusória dos relatórios e números. Enquanto os tecnocratas do segundo tipo se deixam levar pela fantasia ideológica e, quando percebem, é tarde demais e já estão elaborando um plano para purificar a humanidade. Vade retro!

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