Os últimos dias foram de estranha impaciência nos domínios do Bolsonarismo. Suas redes, outrora invencíveis, emulam o cheiro de urina e bebida barata de um final de festa dantesco. Não há mais ninguém por lá, apenas vestígios de um passado que acabou.
Sim, amigos, sei que falo metaforicamente, e muitos dirão que a militância continua firme e forte na luta com o presidente. É que surpreende o nível de indignidade de alguns jornalistas e comentaristas políticos, o que, de certa maneira, falseia um clima de “apoio” natural quando o que existe é apenas rapinagem.
O presidente vem sendo comido vivo por seus próprios criadores. A militância erguida do subsolo, sob a batuta infernal de Olavo de Carvalho, terminou por vencer as disputas internas do governo Bolsonaro, restando como viga mestra desse arremedo de presidência. Conforme outros segmentos caíam, eles se fortaleciam; Bolsonaro diminuiu de tamanho, mas eles aumentaram sua participação societária no consórcio governista.
É importante salientar esse equilíbrio de forças, posto que Olavo e os seus, percebendo a queda, começaram a cobrar a fatura. E isso se dá em campos distintos e igualmente importantes: a imposição de uma reação violenta à crise que se desfralda e o apoio incondicional — jurídico e financeiro — à militância acossada pelo assédio de Alexandre de Moraes.
É nítida a percepção dentre eles de que Bolsonaro não é exatamente leal para com os seus. O presidente — o mesmo que trocou de esposa por uma mais nova duas vezes — é pródigo em abandonar aliados, descartar parceiros e olhar para o próprio umbigo tão logo um dilema se apresente. Não que seja novidade: Jair deixou claro para o país, em uma de seus lives, que guarda o filé mignon para os seus filhos caso receba uma visita. Até Queiroz, flertando com delação, percebeu o gosto de coxão-duro na relação.
Olavo e sua turma não terão dó. Exigirão de Bolsonaro um recrudescimento em suas ações golpistas, enquanto sabotam, publicamente, atores políticos que tentam uma via negociada. Jorge Oliveira e André Mendonça foram os alvos da semana. A militância ergueu hashtags pedindo suas cabeças, pouco mais de um mês após assumirem seus cargos. Seria risível, não fosse o governo Bolsonaro.
Num exercício de empatia, é possível compreender seu drama: o bolsonarismo se construiu mediante discurso ofensivo e triunfalista. Eles são “o povo”, eles estão “sempre no ataque”. Nada pode pará-los. Essa é a lógica que aprenderam com Olavo de Carvalho. Faria sentido — com generosidade — caso o governo não tivesse a retaguarda exposta e não fosse esse poço de contradições desde a vitória no pleito de 2018. Agora já era. Ficaram um ano e meio gastando saliva para defender emenda para centrão, minimizando discurso de rachadinha e procurando líder político quando o que tinham, com sorte, era um deputado de baixo clero. A conta viria, cedo ou tarde.
Com a polícia batendo às suas portas, é possível imaginar o desespero: não ha revolução alguma e ainda podem terminar presos. Que sorte de glória é essa? Que triunfo inevitável termina na cadeia com o presidente derrubado? A militância percebe um desassossego do público, um descolamento entre o que é dito e a realidade que os cerca. Surge o desengajamento. A diminuição do faturamento. O dinheiro se esvai — os votos escorrem pelos dedos. Seus filhos também querem filé mignon.
Eis a razão de Olavo cumprir aqui o papel de Cronos: será ele a devorar Jair para manter seu reinado perante a militância. E sua turma tem ciência disso. Já surgem aqui e acolá alternativas a Bolsonaro. Weintraub, o exilado, é uma delas. Olavistas no governo sugerem que deve ser o “povo”, e não o presidente ou exército, a conduzir a tal “revolução”. Recado claro, recado dado: seriam eles a guiar o dito povo — meia dúzia de senhores de idade em rebelião — rumo ao paraíso da militância sem fim.
Há horizonte para o olavismo, visto que o nicho radical — um dia ocupado por integralistas e eleitores de Enéas — existe e prospera. Para Bolsonaro, marcado pelo pior governo já visto desde a redemocratização (sorry Dilma), não posso dizer o mesmo. Perdido em sua confusão mental, um dia o presidente descobrirá que foi usado como totem e bucha de canhão num projeto autoritário que jamais compreendeu de verdade. Quando acordar, terá sido tarde demais.
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