
Geralmente um cabôco tranquilo, sem altos nem baixos, muito pelo contrário, Beronha chamou a atenção do professor Afronsius e Natureza Morta. Estava meio abalado. Motivo:
– Não param de inventar coisas, só pra infernizar a vida dos outros. Biltres, canalhas!
E explicou: foi à farmácia e não encontrou o que procurava. Desodorante. Um mísero desodorante.
– Só havia prateleiras invadidas e lotadas com um tal de antitranspirante. Desodorante que é bom, neca. Nem pra remédio.
O sagrado banho de sábado
De nada adiantou a explicação que ouviu: desodorante perfuma e reduz os odores das axilas, mas não impede a transpiração. Já o antitranspirante, com um ingrediente ativo, trata de diminuir a transpiração. Garante a proteção contra o suor e elimina as bactérias que causam o mau odor. O produto forma uma película bloqueadora que impede a saída do suor.
Nosso anti-herói de plantão deu com os ombros, mas com o devido cuidado de só levantar os braços até uma altura aconselhável:
– Tudo bem. Eu vou continuar tomando banho todo o sábado. Precisando ou não…
Agora, uma coisa que ele não aceita mesmo é restaurante, com serviço à la carte, por quilo ou prato feito, servir pastel de banana na mesma fornada das comidas de sal:
– Pastel ou não, banana só na sobremesa.
O outro lado dos odores
Voltando aos odores, professor Afronsius e Natureza recorreram ao livro Aroma – a história cultural dos odores, de Constance Classen, David Howes e Anthony Synnott, lançado no Brasil em 1996, pela Zahar editora. Temos lá dois registros deveras interessantes: no verão de 1858, o mau cheiro em Londres tornou-se simplesmente insuportável. Tão nauseabundo que os nobres sugeriram que o Parlamento fosse transferido para outra cidade.
E um estudo inglês sobre a higiene, de 1842, registra a resposta de um operário quando perguntado sobre o banho:
– Eu nunca lavo meu corpo. Deixo que minha camisa faça a sujeira desaparecer com o atrito, a minha camisa mostra bem isso. É claro que lavo o pescoço, as orelhas e o rosto.
Torcendo o nariz
Mostra ainda o livro que os pobres não separavam – nem podiam fazê-lo – as funções e os odores de suas casas em compartimentos diferentes (quarto, banheiro, cozinha, sala de jantar), como faziam as “classes endinheiradas”. A Casa Grande.
Desse modo, na área da senzala, os cheiros se misturavam indiscriminadamente “nos apertados lares dos pobres”, aumentando a repulsão sentida em relação a eles pela “sensibilizada burguesia”, que associava “promiscuidade olfativa com promiscuidade moral”.
E um perfumista vitoriano chegou a afirmar:
– As classes inferiores têm nariz, mas não cheiram.
Todos, no entanto, pobres ou ricos, morreram do mesmo jeito. Bastou pintar o número da senha. Foram chamados um a um.
ENQUANTO ISSO…




