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Ex-ministro Milton Ribeiro
O ex-ministro da Educação Milton Ribeiro.| Foto: Luis Fortes/MEC

No dia 22 de junho, o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro foi preso preventivamente pelo envolvimento em supostas práticas dos crimes de corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência. Conforme divulgado na imprensa, o magistrado do Distrito Federal entendeu que tanto o ex-ministro como outros dois investigados deveriam ser presos preventivamente, pois poderiam interferir na coleta de provas.

Outros dois investigados não foram presos preventivamente, mas tiveram a prisão domiciliar decretada. No dia seguinte, 23 de junho, o desembargador federal do Tribunal Regional Federal do Distrito Federal (TRF-DF) concedeu habeas corpus ao ex-ministro e aos outros presos, pois entendeu que seria imprescindível que os investigados tivessem recebido cópia da decisão que decretou as prisões.

O desembargador escreveu o seguinte em sua decisão de soltura: “Não existe prisão sem prévia e fundamentada justificativa, a ser conhecida – no mínimo – pelo réu e pelas Cortes de Apelação, haja vista o direito fundamental à ampla defesa (… ) Num Estado Democrático de Direito ninguém é preso sem o devido acesso à decisão que lhe conduz ao cárcere, pelo motivo óbvio de que é impossível se defender daquilo que não se sabe o que é”.

Além disso, o desembargador entendeu que como o investigado não exercia mais o cargo de ministro da Educação, ele não poderia praticar outros atos referentes a esta função; assim, não haveria mais necessidade na prisão, pois, em suas palavras, “a prisão preventiva serve para prevenir, não para punir; serve para proteger e não para retribuir o mal porventura feito”. Importante mencionar que antes do juiz decretar as prisões, o Ministério Público Federal foi ouvido e não concordou com as segregações, requerendo que fossem aplicadas somente medidas cautelares contra os investigados.

Pois bem, vamos analisar agora se seria possível a decretação dessa prisão preventiva.

Os crimes que estão sendo investigados são graves, principalmente o de corrupção passiva, então, a princípio, seria possível, sim, a decretação de uma prisão referente a esses delitos.

A simples alegação de que era um ex-ministro e que poderia vir a destruir provas importantes à investigação, não são suficientes para a decretação de uma prisão preventiva

Contudo, para que o juiz determine a prisão preventiva de investigados não basta que o crime em apuração seja grave. A lei exige a presença de outros requisitos para que os supostos autores do crime sejam presos. De uma forma geral, deve ser demonstrado que de fato um crime ocorreu, apontando-se quais são as evidências que indicam a existência de um crime, e esse requisito se chama “materialidade”.

Além da prova da existência de um ilícito, para que alguém seja preso preventivamente também deverá haver “indícios de autoria”, ou seja, a lei exige que existam indicativos de que o investigado possa ter cometido o crime já demonstrado. Mas não se exige prova inconteste de que foi o investigado quem cometeu o crime, basta que haja indícios.

Uma vez apresentada a prova da ocorrência de um crime (materialidade) e os indícios de que o investigado está envolvido na infração (indícios de autoria), também são exigidos outros requisitos para que uma pessoa seja presa preventivamente. Deve ser demonstrado, por exemplo, que o investigado poderá fugir; ou que ele está ameaçando a vítima ou testemunhas; ou que ele poderá destruir provas.

Esse último requisito foi utilizado pelo magistrado que determinou a prisão de Milton Ribeiro, pois o juiz entendeu que o ex-ministro e os demais ocupavam cargo de destaque no Poder Executivo, e que “estavam inseridos no contexto político do país”, e poderiam interferir na produção, destruição ou ocultação de provas.

Contudo, para se prender preventivamente alguém, é necessário a demonstração concreta que esse alguém pode vir a destruir provas, não bastando uma mera alegação abstrata. Todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas, principalmente aquelas que decretam medidas invasivas, tais como a prisão, a busca e apreensão e as quebras de sigilo.

No meu entendimento técnico e jurídico, o simples fato de um investigado não mais exercer sua função pública não afastaria de imediato a possibilidade de ele ter algum tipo de ingerência na repartição que ocupava. Logo, haveria a possibilidade de um ex servidor ainda ter proximidade com pessoas que eram seus subordinados, e, em tese, vir a ter acesso a determinadas provas e destruí-las ou ocultá-las. Mas para se decretar uma prisão com base nesse argumento deve ser demonstrado de forma concreta qual poderia ser a ingerência do ex servidor, e também sobre quais pessoas. A simples alegação de que era um ex-ministro e que, em tese, poderia vir a destruir provas importantes à investigação, não são suficientes para a decretação de uma prisão preventiva.

Por outro lado, entendo que cópia da decisão que decretou a prisão deveria ter sido entregue a todos os que foram presos, para que eles tivessem conhecimento não apenas dos crimes pelos quais estavam sendo investigados, mas também dos motivos de suas prisões.

Foi divulgado na imprensa que o magistrado não deu à defesa acesso imediato à sua decisão com base em entendimento semelhante do ministro Alexandre de Moraes. Mas esse procedimento não encontra fundamento na nossa legislação e muito menos na Constituição, pois viola claramente o Princípio Constitucional da Ampla Defesa.

Por isso foi correta a decisão do TRF que soltou o ex-ministro e os demais investigados, pois, de fato, deve ser entregue aos investigados a decisão que motivou a prisão, para que eles tenham conhecimento não só dos crimes que estão sendo investigados, mas também dos motivos que levaram o magistrado a determinar uma prisão preventiva.

Em relação à investigação em si, todos os fatos devem ser apurados de forma ampla e irrestrita, independentemente do cargo e poder dos envolvidos. O crime de corrupção e os demais relacionados a eles são extremamente graves e devem ser investigados a fundo, para que os responsáveis sejam processados criminalmente e os não envolvidos no caso tenham a investigação contra si arquivada.

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