• Carregando...
Da esquerda para direita: Ana Paula Maia diz não estar particularmente interessada no universo feminino; Verônica Stigger trabalha em sua primeira novela, Opisanie Swiata | Esquerda: Marcelo Correa/Divulgação. Direita: Divulgação
Da esquerda para direita: Ana Paula Maia diz não estar particularmente interessada no universo feminino; Verônica Stigger trabalha em sua primeira novela, Opisanie Swiata| Foto: Esquerda: Marcelo Correa/Divulgação. Direita: Divulgação

Em breve

Verônica Stigger: diferentes formatos narrativos

Verônica Stigger já tem três livros prontos, aguardando publicação. Previsto para o ano que vem, Sul reúne contos longos – ao contrário de Os Anões (já lançado), assim batizado por seus textos curtos. "Continuo a trabalhar com os diferentes formatos literários: um conto em forma de peça de teatro, outro de poema em tercetos, e outro de conto propriamente dito", adianta a escritora.

Antes, porém, deve sair Massamorda, em fase de finalização. "Trata-se de um livro pequenininho, reunindo também três textos com formatos diferentes, numa espécie de antecipação de Sul", diz.

Além desses, há a coleção de tercetos Delírio de Damasco, originada de uma instalação artística que fez para o Sesc. "São extraídos de fragmentos de falas alheias, entreouvidas nas ruas ou mesmo no meu círculo de amigos ou familiares."

Se não bastasse, Verônica trabalha ainda em sua primeira novela, que pretende batizar de Opisanie Swiata (ou "descrição do mundo"), a tradução para o polonês de Il Milione, livro de viagens de Marco Polo. "A idéia é acompanhar o deslocamento do protagonista, Opalka, um cinquentão, desde sua Polônia natal até a floresta amazônica", conta. Dentro dos contornos da novela, ela quer brincar com formatos como o relato de viagens, a carta e o diário. "Este fôlego mais estendido é uma experiência nova para mim. Vamos ver no que vai dar".

Contra qualquer possibilidade de estereótipo, a escritora carioca Ana Paula Maia destrincha universos masculinos marginais em sua prosa seca, desde sua estréia literária, em 2003, com O Habitante das Falhas Subterrâneas, quando ainda escrevia sob o impacto da leitura de O Apanhador dos Campos de Centeio, de J. D. Salinger.

Muito depois, ao encerrar a Saga dos Brutos, neste ano, com a publicação de Carvão Animal (Record), já liberta das primeiras influências, a carioca se detêm sobre homens cujas profissões geram desprezo e sequelas – e que se mantêm semi-invisíveis na ordem social.

É o caso dos abatedores de porcos, que os distribuem para frigoríficos e se entretêm apostando em rinhas de animais na novela pulp Entre Rinhas de Cachorros e Porcos Abatidos (primeira parte da trilogia), ou dos lixeiros, desentupidores de esgotos e quebradores de asfalto mal pagos que povoam os capítulos de O Trabalho Sujo dos Outros (a segunda parte). "Como um sujeito aguenta fazer isso? Quem é esse sujeito que faz isso", costumava se indagar a autora.

Ana Paula mesmo responde a essas perguntas ao longo de seus livros, que se constituem de aguçadas investigações do cotidiano desesperançado dos outros – seres o mais distante possível da realidade dela.

Não é diferente com os protagonistas de Carvão Animal. Na companhia de Ernesto Wesley, conhece-se o lado menos vibrante do dia a dia de um bombeiro: o contato repetido com o fogo que tatua queimaduras no corpo, o risco de morte contínuo e as visões disformes de pessoas carbonizadas fundidas com metal sob altas temperaturas. "É tão real que fica no abismo do absurdo", reconhece a autora, e confessa ter se assustado com o que escrevia. "Houve imagens que custei a esquecer."

O método de trabalho de Ana Paula comporta uma pesquisa extensa sobre cada assunto, o que faz de suas descrições desconcertantemente realistas. É a opção de quem dispensa a retórica, as digressões e os adornos poéticos em favor da brutalidade crua do real. Reduzidos os corpos a blocos disformes ou a pó, o que sobra entre os destroços de humor negro, em seu livro, é o desamparo humano.

A autora aprendeu em vídeos e manuais que encontrou na internet como se dá a cremação dos mortos, com riqueza de detalhes ("Enquanto um corpo é carbonizado, as extremidades se contorcem e encolhem", escreve). E leu no jornal sobre a explosão de um forno crematório. Juntou, assim, as informações necessárias para criar o outro protagonista de Carvão Animal, Ronivon, irmão de Ernesto e operador do forno crematório de uma cidade onde já não há espaço para os mortos no cemitério. "Essa é uma realidade para o futuro", prevê.

Ana Paula pesquisa porque não gosta de inventar. "A ficção é um bom lugar para eu entender melhor o mundo ao meu redor. É um ensaio sobre a vida, a minha e a dos outros, principalmente. Geralmente uso a ficção para extrapolar a realidade, para ir além dos limites perceptíveis", diz.

Se seus protagonistas são invariavelmente homens, é porque já tentou escrever do ponto de vista feminino e falhou. Sem o distanciamento que o outro gênero exige, não se sente capaz de retratar personagens. Ela conta que leu pouca literatura feita por mulher – e, com o que leu, não vislumbra possibilidade de diálogo literário. Suas referências passam antes por Salinger e Campos de Carvalho.

"O universo feminino, por ser o meu universo habitual, rotineiro, não gera em mim nenhum interesse em desbravá-lo. Gosto do outro na ficção, na investigação. O outro é também o outro gênero, ou seja, o masculino. A exploração de um território que não é o meu, mas a literatura me permite aproximação e entendimento. Não gostaria de ser um homem, mas adoro narrar a vida de homens através da literatura. Quando me aproximo dos outros, aproximo-me mais de mim mesma", sintetiza.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]