Pastern é a palavra inglesa para a parte da pata do cavalo que em português se chama quartela. Em termos anatômicos, seria basicamente o peito do pé de um ser humano.
Em 1755, Samuel Johnson publicou o primeiro dicionário da língua inglesa, que compilou e redigiu sozinho. Ali, ele define pastern como “o joelho do cavalo”. Equívoco total.
Logo depois do lançamento, num evento social (sei lá, tipo a Flip da Inglaterra georgiana), uma senhora lhe perguntou por que ele tinha feito uma coisa dessas. A resposta, como inúmeras outras tiradas de um célebre frasista, ficou famosa.
— Ignorância, minha senhora; pura ignorância.
*
Mas, Caetano, porque uma anedota erudita do século XVIII?
Bom, fundamentalmente pra dar uma amaciada na minha própria confissão de tosquice, pura tosquice.
Porque na semana passada, escrevendo sobre o putativo antissemitismo de T. S. Eliot, eu esqueci totalmente que a grafia correta depois da última reforma é essa. Sem hífen. Com dois SS.
Na versão online do texto ainda deu tempo de corrigir, depois que o meu irmão (mais novo e mais esperto) percebeu a esferofagia. Mas o papel vai ficar lá, pra provar que um cabra que é professor do curso de Letras da UFPR comeu bola na ortografia.
Ignorância. Distração. Esquecimento. Tosquice.
Como um usuário da língua portuguesa que passa por uma reforma ortográfica depois de décadas de escrita mais ou menos constante, eu por vezes me embanano. Como professor, eu tenho que zelar pelo uso dos outros. Mas… é humano, né?
*
Agora, olhos nos olhos, isso acarreta o quê?
Deixemos claro. Como eu sempre digo aos alunos, esses detalhes do fundo do baú da ortografia (perfeitamente ilustrados pelas regras de hifenização do português) tem UMA grande serventia: mostrar aos outros que você sabe ortografia!
Errar uma grafia dessas tende a não mudar nada na substância do teu texto, como eu espero ter provado, aliás.
:)
Agora, também não façamos pouco desse elemento de pertencimento. Provar que você sabe é provar que estudou, que está obedecendo a certas regras do jogo. E mostrar que não sabe, só tende a fragilizar tua posição argumentativa ao relativizar aquele pertencimento.
Logo: hífen é importante? Não.
E por isso mesmo é importante. É convenção. É etiqueta. É “bons-modos”. E eu fiz asneira.
*
Diga-se de passagem, essa é uma ignorância que Johnson nunca teria cometido. O inglês, ainda hoje, é uma língua bem desencanada com regras de hifenização.
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