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| Foto: Alexandre Moreira/Divulgação

Cinquenta anos se passaram desde que Maria Bethânia substituiu Nara Leão no mítico espetáculo Opinião, empreitada de Oduvaldo Vianna Filho (Vianinha), Ferreira Gullar, Paulo Pontes e Armando Costa. No palco, estavam Zé Kéti e João do Vale. Chovia muito naquele 13 de fevereiro de 1965. A garota magrela de 17 anos cantou “Carcará” como um trovão e, basicamente, a música brasileira nunca mais foi a mesma depois daquilo. A baiana comemora cinco décadas de música com o show Abraçar e Agradecer, que apresenta no Teatro Positivo, em Curitiba, na noite deste sábado (25) – os ingressos estão esgotados. De sua casa no Rio de Janeiro, Maria Bethânia conversou com a Gazeta do Povo “As pessoas não estão aguentando mais o sufoco desse imediatismo.”

O que você lembra do início da carreira, época retratada tão bem no documentário Bethânia Bem de Perto [de Eduardo Escorel e Julio Bressane]?

São as melhores lembranças. Era um período muito bonito porque todos os artistas se visitavam e viviam meio juntinhos. A vida era quente. E nós criamos o Opinião, primeiro espetáculo contra a ditadura.

No filme, você parece desconfiada quando um empresário estrangeiro oferece dinheiro e um contrato para seus primeiros shows fora do país. Isso mudou?

Nada. Eu continuo desconfiada de tudo. E só falando português.

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Sim, é um show comemorativo. Me comove bastante porque cheguei onde cheguei só por causa do meu ofício. E também pelos mestres que tive, minha família, amigos e o Brasil real.

O que é o Brasil real?

É o Brasil que eu amo e que quase ninguém fala porque interessa a pouca gente. O Brasil do índio, da natureza, da nobreza da floresta e das águas. E de seu povo, do gaúcho ao sertanejo. O resto está cacarejando.

Ainda sabemos fazer canções?

A canção nunca deixou de existir. Tenho recebido coisas interessantíssimas de grandes artistas. Mas estou de saco cheio desse mundinho rapidinho, em que nem dá tempo de terminar alguma coisa e já se tem que começar outra. A arte depende do ócio, da reflexão, da observação. É igual a um exercício. Você quer ficar bombado, malhado? Tem que fazer exercício. Arte é isso. Se deixar tocar. Mas agora há uma urgência. Acho que as pessoas não estão aguentando mais o sufoco desse imediatismo, dessa rapidez.

Você passou por diversos movimentos da música brasileira, mas sempre manteve uma identidade artística.

Não gosto de ficar amarrada a nada. Meu único objetivo é ser livre. Se me amarro, me acomodo com o grupo, fico prisioneira. Por mais que tenha vivido profundamente o movimento dos anos 1960, a música de protesto, por mais que tenha participado do teatro com o Chico [Buarque], do Tropicalismo de Caetano e Gil, mantive uma distância necessária, apesar de estar sempre perto.

É mais fácil ser artista hoje do que há 50 anos?

Nunca é fácil. Sempre é delicioso e sempre paga-se um preço muito alto. Não me queixo absolutamente, mas às vezes é cruel. Há que ser corajoso, para se entender e se expressar. Isto custa caro e às vezes você acha que não vai aguentar. Aí vem uma sensação de que você balança, balança, mesmo não sabendo se há uma rede ali embaixo.

O que você ouve hoje? Algum artista em particular lhe chama a atenção?

Termino este meu espetáculo com uma música inédita chamada “Silêncio.” É da Flávia Venceslau, uma paraibana que mora na Bahia. Não a conheço, foi o Chico César que me indicou. É uma boa novidade. Uma moça que tem a compreensão do seu lugar, da sua música, da sua gente, do seu sotaque. Mas ouço tudo que me mando. Leio tudo que me mando. Quando sinto que é para cantar, coloco no repertório. E, como disse, não precisa ser alguém conhecido.

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