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Consumo
Redução na inflação e nos juros, renegociação de dívidas e a proximidade do fim do ano devem ajudar o consumo no segundo semestre, dizem especialistas.| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

O consumidor começou o segundo semestre um pouco mais otimista. Em julho, o índice de confiança alcançou o maior nível desde janeiro de 2019, segundo sondagem do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). A intenção de consumo das famílias também cresceu em julho, de acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. (CNC).

A expectativa é de que esse cenário favorável prevaleça nos próximos meses. As projeções para inflação caíram nas últimas semanas e as de crescimento econômico aumentaram. Entre os fatores que ajudam a explicar um maior otimismo para o segundo semestre estão:

  • o recuo da inflação nos últimos meses;
  • a expectativa de queda nos juros;
  • a resiliência do mercado de trabalho;
  • o aumento nas transferências de renda por parte do governo;
  • o programa de renegociação de dívidas, que deve "limpar nomes" de parte dos consumidores negativados; e
  • a proximidade do fim de ano, quando o consumo tradicionalmente cresce.

Mesmo assim, diante de um cenário mais favorável do que se esperava, o momento segue sendo de cautela. A inadimplência teve uma pequena queda em junho, mas ainda está em níveis elevados.

“Ainda é cedo para confirmar uma melhora sustentada da confiança dos consumidores, principalmente porque a situação financeira das famílias ainda registra nível bastante insatisfatório, sendo um dos problemas do consumidor o alto endividamento”, diz Anna Carolina Gouvea, economista do Ibre/FGV.

Recuo da inflação favorece o consumo

Um dos fatores que está impulsionando a melhoria na confiança dos consumidores é o recuo da inflação nos últimos meses. Há um ano, o IPCA – indicador oficial do comportamento dos preços – estava em 11,89% ao ano. Em junho, ele chegou a 3,16%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Itens relevantes na cesta de consumo das famílias tiveram queda nesse período ou aumentaram menos que a inflação. É o caso da alimentação no domicílio, que ficou 2,88% mais cara nos últimos 12 meses. Itens como carnes, tiveram uma queda média de 6,73% nos preços. Os óleos ficaram 22,43% mais baratos.

As despesas com transporte também estão pesando menos no bolso do consumidor. Nos últimos 12 meses, elas caíram 5,68%, puxadas pela retração no preço dos combustíveis, que foi de 26,35%.

Mas um cenário de inflação mais contida não deve mudar certos hábitos que o consumidor adquiriu durante o período de preços mais elevados. O diretor de análises avançadas da Kantar, Rafael Kröger Couto, cita as compras mais fragmentadas, a visita a mais pontos de venda e a busca por marcas mais baratas. A isso, se soma o lançamento de embalagens menores por parte das empresas. “Muitas vezes a pessoa não abre mão da marca”, diz.

A expectativa de queda nos juros

A expectativa de uma queda a partir de agosto, ainda que tímida, na taxa Selic, atualmente em 13,75% ao ano, também abre espaço para que os juros comecem a cair para o consumidor final. "Isto pode contribuir para abaixar um pouco os juros praticados pelas instituições financeiras e pelo comércio", diz a economista Izis Ferreira, da CNC.

A taxa média mensal praticada pelo comércio era de 5,61% no mês passado, segundo a Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). No caso do cartão de crédito, eram 14,86% mensais.

Segundo a economista, a eventual queda nos juros pode contribuir para destravar as vendas de produtos de maior valor agregado, como móveis, eletrodomésticos, material de construção e veículos. Esses itens, cujo consumo é mais dependente de crédito, têm registrado queda nas vendas.

A resiliência do mercado de trabalho

Outro fator que pode manter as expectativas favoráveis para os consumidores é a resiliência do mercado de trabalho, mesmo com a perda de ritmo na criação de empregos formais. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram uma criação de 1,65 milhão de postos de trabalho com carteira assinada nos 12 meses encerrados em maio. A expectativa é de encerrar o ano com a criação de 1 milhão de oportunidades.

Para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a política de valorização do salário mínimo e a situação do mercado de trabalho, com formalização na ocupação, implicam uma sustentação do crescimento da massa de rendimentos ampliada por benefícios sociais, viabilizando o consumo das famílias.

“O mercado de trabalho vem apresentando um quadro de queda da desocupação, expansão da população ocupada e aumento de rendimentos acima da inflação”, diz relatório do instituto.

Segundo Ferreira, da CNC, há também maior segurança em relação ao emprego, e as expectativas de melhoria profissional cresceram, principalmente entre consumidores de baixa renda. “É um reflexo da geração de vagas formais, em setores como serviços e construção civil, que contrataram mais pessoas de menor nível de escolaridade e renda. Isto acaba facilitando os planos para o consumo”, diz.

O aumento nas transferências de renda por parte do governo

Quem também deve continuar influenciando positivamente no consumo são as transferências de renda por parte do governo, como o Bolsa Família. O benefício teve, em junho, o maior valor médio da história: R$ 705,40 por família. Foram quase R$ 15 bilhões em repasses do governo federal, que contemplam 54 milhões de brasileiros.

“O poder de compra da massa de rendimentos tem crescido substancialmente, sobretudo quando são considerados os efeitos dos benefícios sociais, ainda que esta expansão tenha se dado a taxas decrescentes nos últimos meses”, dizem os economistas do Ipea.

Renegociação de dívidas

Programas de renegociação de dívidas, como o Desenrola, lançado recentemente pelo governo federal, também podem ajudar para um melhor desempenho do consumo no segundo semestre deste ano.

Mas o impacto desta medida pode ser mais tímido devido à elevada inadimplência. Dados da Serasa mostram que em junho havia 71,45 milhões de negativados, o que equivale a 43,78% da população adulta do país. A inadimplência da carteira de crédito das pessoas físicas estava em 4,25% em maio, de acordo com o Banco Central. É a mais alta desde maio de 2016.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estima que o programa de renegociação de dívidas, que abrange aquelas contraídas até dezembro, tem o potencial de limpar o nome de 2,5 milhões de pessoas em sua primeira fase.

Segundo a Serasa, mais de 1 milhão de negociações relacionadas a dívidas com bancos e outros segmentos foram realizadas nos sete primeiros dias do Desenrola – 61% mais que no mesmo período de junho (dias 19 a 25).

“Para a baixa renda e a classe média acaba sendo um alívio. Mas não basta apenas negociar, é preciso pagar as pendências para não ser negativado novamente”, diz Ferreira, da CNC.

Ela acredita que os impactos do programa de renegociação de dívidas deverão ser sentidos mais para o último trimestre do ano, que concentra datas favoráveis ao comércio como a Black Friday e o Natal.

A economista ressalta que, também, vai ser preciso uma ajuda das instituições financeiras, que estão mais seletivas na concessão de crédito e vem aumentando os spreads (diferença entre os juros cobrados de quem pega dinheiro emprestado e o custo de captação da instituição financeira).

Proximidade do fim de ano ajuda no consumo

Outro fator que deve ajudar é a sazonalidade. “Tradicionalmente, o consumo das famílias tem crescimento maior no segundo semestre, devido ao recebimento do 13.° salário e às despesas com as festas de final de ano”, afirma Marcos Pazzini, sócio da IPC Marketing e responsável por um estudo que mapeia o consumo no Brasil.

A consultoria projeta um crescimento de 1,5% no consumo neste ano, atingindo R$ 6,7 trilhões. “Os resultados do primeiro trimestre de 2023 mostraram um crescimento do PIB acima do esperado (+1,9%), mas o consumo das famílias cresceu apenas 0,2% nesse período”, diz o responsável pelo estudo.

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