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Carlos Eduardo Chaves , Sérgio Rogal e Marcus Vinícius Figueredo , da Hi Tecnologies: profissionalizar a gestão foi uma necessidade | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
Carlos Eduardo Chaves , Sérgio Rogal e Marcus Vinícius Figueredo , da Hi Tecnologies: profissionalizar a gestão foi uma necessidade| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Opinião

Os valores da governança

Empresas de pequeno porte demonstram algumas problemáticas quando falamos de gestão. Ousaria até apontar que entre os erros recorrentes está achar que existe um momento certo para profissionalizar a gestão empresarial.

O que muitos pequenos empresários não levam em consideração é que os valores da boa governança devem fazer parte do DNA de toda e qualquer empresa, independentemente do seu porte. E quando falamos em governança, não estamos falando em complexos modelos organizacionais. A CDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – classifica a governança corporativa como o conjunto de relações entre a administração de uma empresa, seu Conselho de Administração, seus acionistas e outras partes interessadas. Ou seja, nada mais é que as relações de uma empresa com todos os seus públicos.

Diversos motivos levam 30% dos empresários a fecharem suas portas no primeiro ano de atividades. Porém, uma gestão preparada, com um planejamento estratégico definido, alinhado aos objetivos da empresa, e pensado para atender todos os seus públicos, pode ser a grande sacada de sucesso.

Os valores da governança corporativa podem ser traduzidos em ações como aprimorar a cultura organizacional e investir na transparência da gestão, na estruturação corporativa, na capacitação e comunicação com stakeholders. Essas iniciativas, por mais que possam ser familiares às grandes organizações, são inovadoras em termos de gestão no segmento das pequenas e médias empresas e podem garantir um crescimento sustentável ao negócio.

Norman de Paula Arruda Filho, presidente do ISAE/FGV e professor do mestrado profissional em Governança e Sustentabilidade do ISAE.

Resultados

Modelo é adaptável às realidades empresariais

Para quem leva o orçamento na ponta do lápis, investir em um modelo de governança pode parecer distante da realidade da pequena empresa ou de um negócio familiar. De acordo com especialistas, o investimento custa menos do que uma consultoria e traz resultados concretos, como ganho de receita e de margem, mais retorno sobre o capital investido, otimização de recursos por melhor acompanhamento de projetos e perenidade dos negócios.

"Cada empresa precisa desenvolver suas práticas de governança, adaptáveis às suas demandas e realidades. Não há receita de bolo", explica o diretor do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) para o Paraná, Marcelo Bertoldi. O IBGC oferece material e cursos sobre o tema. Tem representações em sete estados e ainda promove eventos itinerantes pelo país. A adoção da governança corporativa pode ser uma saída também para equilibrar interesses e mediar conflitos durante o processo de sucessão em uma empresa familiar. A participação dos acionistas – sejam fundadores ou herdeiros – nas decisões estratégicas do negócio é uma forma de envolver, identificar e desenvolver os talentos que serão necessários para perpetuar o empreendimento. "Nem sempre o herdeiro será o sucessor. Na governança, assume a direção quem for mais bem preparado para a função", explica o consultor Eduardo Valério.

Ninguém cria uma empresa com prazo de validade. O objetivo é que o negócio atravesse gerações. Para isso, além de uma boa ideia, recursos para investir e estratégia de mercado, o empreendedor precisa também de um modelo adequado de gestão empresarial. O mais comum é o fundador centralizar as decisões operacionais e de planejamento, pelo menos até que a empresa cresça e exija maior complexidade na sua organização. "No início, dono e gestor são a mesma figura. Aos poucos, a necessidade de profissionais externos para ocupar funções estratégicas vai aparecer", explica Eduardo Valério, presidente da consultoria J.Valério.

Na maior parte dos casos, é somente quando o fundador precisa compartilhar decisões e dividir o comando com auxiliares ou outros sócios é que surgem os primeiros problemas. Em alguns casos, a confusão no desempenho dos papéis de cada um pode ameaçar a continuidade dos negócios. "Não raro, empresas com bom potencial de mercado são extintas por desentendimentos entre os sócios que não conseguiram estabelecer suas funções e responsabilidades", explica a consultora do Sebrae-PR Rosângela Angonese.

Um modelo de gestão que ameniza esse tipo de conflito é o da governança corporativa. Organizados em conselhos de administração, finanças e auditorias, gestores, fundadores e executivos compartilham decisões sobre o desenvolvimento dos negócios, dando mais transparência e clareza à administração empresarial. É um requisito desejável para atrair investidores e uma exigência para a entrada da empresa no mercado de capitais.

Associada à gestão de grandes empresas e, mais recentemente, a companhias de tecnologia, a governança pode – e deve – ser aplicada em empresas de todo porte e segmento. Mas ainda é incomum nas pequenas organizações. "Ainda não é tendência, mas deveria ser uma orientação frequente para empresários iniciantes. Exige maturidade emocional para delegar poder e compartilhar o comando do próprio negócio. Se for formatado assim desde o início, a evolução do modelo é natural", explica Rosângela.

Definição de papéis

Os conceitos de governança podem ser aplicados em diferentes fases do empreendimento. No início, as práticas ajudarão a definir os papéis dos sócios, evitando fins precoces por desentendimentos. Em um nível de organização mais complexo ou em uma fase de expansão, um conselho consultivo pode ser um bom começo para aplicar o modelo.

"Assim os sócios terão oportunidade de pensar como acionistas e executivos para decidir sobre interesses maiores da empresa: para onde ir e como chegar lá", explica Sidney Severini, presidente da Severini Soluções Empresariais, de São Paulo.

Em um conselho consultivo, dois ou três sócios e dois executivos ou dirigentes podem deliberar sobre os negócios. "Eles serão responsáveis pela construção e execução do plano estratégico da empresa. Para isso, há ferramentas de controle e registro, como atas e indicadores que apontam a evolução do método", explica.

Startups são exemplo de organização e transparência

Abreviações como CEOs e CFOs são usadas para designar as funções dos dirigentes de jovens empresas, especialmente as startups, ligadas à área de tecnologia. Mais do que estrangeirismos, são uma importante sinalização para o mercado de que aquela organização tem princípios e práticas de governança corporativa, exigida pela natureza do modelo de negócios em tecnologia, em que o investimento externo, muitas vezes, é condição essencial para seu desenvolvimento.

Por definição, a governança implica em uma gestão transparente, necessária para conquistar aportes financeiros. "Startups nascem com o embrião da governança por uma questão de sobrevivência. Como atrair o investidor anjo, por exemplo, sem abrir os resultados, perspectivas, potencial de negócio ou estar disposto a ouvir orientações e conselhos de profissionais experientes?", observa o consultor Sidney Severini.

A Hi Tecnologies, fabricante de monitores médicos portáteis, começou com cinco alunos de Engenharia da Computação da PUC-PR, em 2004. Logo nos primeiros meses de funcionamento, os sócios perceberam que teriam problemas de administração, caso não se organizassem.

A decisão para formalizar a governança foi tomada em 2008, quando já eram apenas três dos cinco fundadores. "O plano era tornar a empresa uma corporação e abrirmos capital em dez anos. Foi quando profissionalizamos a gestão", explica o presidente do Conselho de Administração, Marcus Vinícius Mazega Figueredo.

Expansão

O plano está em franco desenvolvimento. A Hi Tecnologies produz até 300 monitores portáteis por mês e está em 100 instituições de saúde em 15 países. Tem 20 funcionários, cem representantes comerciais e um escritório nos EUA para prospecção de clientes. As unidades custam a partir de R$ 3 mil, mas uma versão customizada do produto pode chegar a R$ 20 mil. "Estamos em uma rampa de aceleração do faturamento, com bons resultados", diz Figueredo, sem revelar valores.

Hoje, o Conselho de Administração da empresa é formado por cinco integrantes, com dois dos sócios fundadores, um executivo e dois consultores externos. As reuniões de acompanhamento ocorrem a cada duas semanas e o conselho presta contas trimestralmente. "Com os planos estratégicos definidos e o envolvimento de todos nesse projeto, a empresa anda sozinha. Não é fator determinante para o sucesso, mas é um bom começo", diz Figueredo.

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