A revista Playboy americana vai deixar de publicar fotos de mulheres nuas em suas páginas a partir de março.
No Brasil, o diretor de redação da publicação, Sérgio Xavier, afirma que ainda não houve comunicado aos parceiros e que até o momento não há nada decidido. “A Playboy tem a tradição de respeitar muito os mercados locais, deixar que cada país decida o que é melhor e como fazer”, afirma o executivo à reportagem.
De acordo com ele, a questão do nu precisa ser pensada melhor. “A Playboy é mais do que uma revista de nu. Ela discute o comportamento masculino. Fala de moda, bebidas, viagens e tem nas entrevistas longas e profundas uma marca importante. Sempre discutiu direitos civis, racismo, liberdade. Isso não mudou nem mudará”, ressalta.
Xavier acredita fazer sentido a proposta de Hugh Hefner, o criador e editor-chefe da revista nos EUA. “Estamos gradativamente perdendo com o nu. Precisaremos pensar em como fazer a transição”, constata.
Influência
É difícil, em um mercado de mídia que foi tão fragmentado pela web, imaginar as dimensões da influência da Playboy em seu pico.
Um juiz decidiu, em um caso famoso, que negar uma versão da revista em Braille aos deficientes visuais representava violação dos direitos de que eles desfrutam sob a primeira emenda à constituição dos Estados Unidos (que garante a liberdade de expressão).
A revista publicou contos de escritores como Margaret Atwood e Haruki Murakami, entre outros, e seus entrevistados incluíram Malcom X, Vladimir Nabokov, Martin Luther King e Jimmy Carter, que admitiu durante a conversa que sentia desejo, em seu coração, por outras mulheres que não sua cônjuge.
Madonna, Sharon Stone e Naomi Campbell apareceram na revista quando estavam no auge da fama. Sua edição de maior sucesso, a de setembro de 1972, vendeu 7 milhões de cópias.
Mesmo as pessoas que desgostavam da revista lhe dedicavam atenção – a líder feminista Gloria Steinem se infiltrou em uma das casas noturnas de Hefner, inspiradas pela revista, disfarçada como garçonete, para escrever um artigo de denúncia.
Mercado nos EUA
De acordo com o New York Times, os executivos da revista admitem que ela foi deixada para trás pelas mudanças que ajudou a liderar. “Aquela batalha foi travada e vencida”, diz Scott Flanders, o presidente-executivo da companhia. “Agora, as pessoas estão a um clique de qualquer ato sexual concebível, e de graça. Ou seja, a coisa se tornou obsoleta, a esta altura”.
Para uma geração de homens dos Estados Unidos, ler Playboy era um rito cultural, um prazer ilícito consumado à luz de lanternas, destaca a reportagem do New York Times. Agora, todo adolescente tem um celular dotado de conexão à internet. Revistas pornográficas, mesmo as estabelecidas como Playboy, perderam seu valor de choque, seu valor comercial e sua relevância cultural.
A circulação da Playboy nos Estados Unidos caiu de 5,6 milhões de exemplares em 1975 para cerca de 800 mil agora, de acordo com a Aliança de Mídia Auditada. Muitas das revistas que surgiram inspiradas por ela já desapareceram.
Concorrência
Ainda que números detalhados sobre publicações adultas não estejam disponíveis, muitas das que restaram persistem em forma severamente diminuída, e são vendidas apenas em lojas especializadas. A Penthouse, talvez a mais famosa rival da Playboy, respondeu à ameaça da pornografia digital publicando material mais e mais explícito. E nunca conseguiu se recuperar.
Esforços anteriores de reformulação da Playboy, o mais recente dos quais realizado há três anos, não pegaram. E aqueles que acusam a revista de explorar mulheres dificilmente se deixarão dissuadir por uma reforma modesta. Mas, de acordo com pesquisas da revista, o logotipo da Playboy é um dos mais reconhecíveis do planeta, em companhia dos logotipos da Apple e Nike.
Desta vez, enquanto a revista busca concorrer com veículos novos como a Vice, diz Flanders, ela tentará responder a uma pergunta crucial: “Sem a nudez, o que resta?”
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