• Carregando...
EUA debatem regras para disciplinar o uso de drones: norma mais dura determina que o aparelho precisa ficar  ao alcance da vista do “piloto” durante o voo. | Rafael Freitas
EUA debatem regras para disciplinar o uso de drones: norma mais dura determina que o aparelho precisa ficar ao alcance da vista do “piloto” durante o voo.| Foto: Rafael Freitas

Eles podem ser vistos no ar com certa frequência, monitorando plantações, produzindo fotos e vídeos, e até servindo de atração em desfile carnavalesco, mas ainda precisam se submeter a um marco regulatório para decolarem de vez. Os drones estão no centro de uma intensa discussão nos Estados Unidos e em outros países, como o Brasil, que buscam estabelecer regras específicas para o uso de novas tecnologias, como o polêmico Uber e os chamados carros autônomos, sem motorista (leia mais nesta página), mesmo que elas venham a bater de frente com o interesse de grandes empresas.

Autorização

A Anac explica que não existe qualquer restrição à compra de um drone, mas reforça que a operação do aparelho depende de uma autorização específica da agência. O certificado concedido pela Anac permite apenas operações experimentais sobre áreas não densamente povoadas – ou seja, não permite o uso com fins lucrativos e nem operações em áreas urbanas. Além disso, também é preciso obter uma autorização do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea).

Os drones, utilizados cada vez mais para fins comerciais, têm sido alvo de órgãos regulatórios devido a sua crescente popularização e aos riscos que trazem quando usados em ambientes urbanos. Em janeiro, uma série de normas foi proposta pelo órgão regulador de aviação dos EUA, após uma onda de vendas de drones no país durante o Natal, como presentes recreativos. A intenção é obrigar os “pilotos” a obter certificados especiais para operar os aparelhos e permitir que as aeronaves voem somente durante o dia, longe de pedestres.

Casa Branca

Em janeiro deste ano, o uso de um drone chegou a colocar em xeque o aparato de segurança que envolve um dos homens mais poderosos do mundo, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Na madrugada de uma segunda-feira, um pequeno drone escapou dos radares da Casa Branca – que podem interceptar ameaças como mísseis e aeronaves – e caiu no jardim da residência presidencial, após seu dono perder o controle do equipamento.

A regra mais dura, porém, especifica que os drones precisam se manter, durante todo o voo, ao alcance da vista dos operadores – o que complica seriamente os planos de empresas que apostam nos drones para oferecer serviços de inspeção de gasodutos e redes de energia ou entregar encomendas, como a Amazon.

Restrições

A regulação proposta ainda precisa passar por revisões e audiências públicas, mas a expectativa é que entre em vigor até o início do ano que vem. Como de praxe, as discussões legais nos Estados Unidos devem influenciar os marcos de outros países, como o Brasil. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) apresentou no ano passado um esboço de regras para uso de drones, que estabelecem três categorias conforme o porte dos aparelhos – a ideia é que elas sejam mais rígidas para drones maiores. O voo de um aparelhos até 25 quilos, por exemplo, estaria liberado em locais públicos, desde que autorizados anteriormente pelo órgão público responsável pelo local e sem que o drone sobrevoe pessoas não envolvidas na operação.

A Anac chegou a prever que as propostas fossem postas em audiência pública e formalizadas ainda no ano passado, mas, questionada pela reportagem, não deu mais prazo para a conclusão das discussões. “O que existe hoje no Brasil sobre drones são regulações genéricas. Mas a questão é muito mais complexa e envolve não só o uso comercial, teoricamente correto, mas também ameaças à segurança e à privacidade dos cidadãos. Uma das alternativas, que Portugal está trabalhando, é criar um registro com uma identificação precisa dos proprietários dos drones, na linha de uma regulação que não seja restritiva, mas salvaguarde a privacidade das pessoas”, avalia a advogada e consultora da Associação Brasileira de Direito da Tecnologia da Informação e das Comunicações, Silvia Barbuy Melchior.

Pesquisador diz que não existe estrutura técnica para monitorar drones

É muito complexo fazer o controle dos drones no ar. Não há equipamentos capazes de fazer esse controle aéreo.

Alessandro Mendes, pesquisador da Universidade do Vale do Paraíba.

Segundo as regras em vigor no Brasil, cada voo com drone precisa receber autorização prévia da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea). No entanto, a ausência de restrições à compra desse tipo de aparelho, que já é vendido pela internet e até em lojas de brinquedos, dificulta a fiscalização dos órgãos, que, muitas vezes, só tomam conhecimento dos voos quando a operação gera repercussão na mídia –caso dos drones usados no desfile de Carnaval da Portela, neste ano.

Especialistas e pesquisadores duvidam que a implantação de regras, por si só, sirva para controlar o uso dos aparelhos. Mais uma vez, a fiscalização deve esbarrar na falta de infraestrutura técnica. “É muito complexo fazer o controle dos drones no ar. Não há equipamentos capazes de fazer esse controle aéreo. Uma torre em um aeroporto, por exemplo, não consegue captar se existe um drone na rota de aviões”, afirma o pesquisador Alessandro Correa Mendes, da Universidade do Vale do Paraíba (Univap), que coordena um grupo de trabalho e pesquisa sobre as aeronaves.

Para Mendes, a regulação da Anac deve possivelmente caminhar no sentido de restringir definitivamente o uso dos drones em áreas urbanas, além de exigir alguma espécie de certificação dos pilotos. “Me preocupa muito as pessoas comprando esses equipamentos achando que são brinquedos. Pilotar esse equipamento não é uma tarefa fácil, é preciso uma vivência em aeromodelismo. E a impressão que tenho é que só será tomada alguma decisão [da Anac] se ocorrer algum problema sério”, reforça. (RW)

Empresas de tecnologia e do setor automotivo já estão desenvolvendo veículos inteligentes, sem necessidade de motoristas. | Arnd Wiegmann/Reuters

Legislação deve ser entrave para produção de carros autônomos

Apesar de ainda incipiente, a produção de carros autônomos –movidos por sensores e sem volantes ou pedais – já consome investimento e pesquisa de empresas da área automotiva e de tecnologia, como Renault, Google, BMW, Baidu e, ao que indicam boatos recentes, a Apple. O próprio presidente-executivo da Renault-Nissan, Carlos Ghosn, afirmou ano passado que os primeiros veículos “sem motorista” devem virar realidade em países como França, Japão e Estados Unidos já em 2018.

Na mesma fala, Ghosn destacou que a avançada tecnologia necessária para transformar a previsão em realidade está longe de ser o maior entrave. “O problema não é tecnologia, é legislação, e toda a questão da responsabilidade que vai junto com esses carros transitando por aí. Especialmente quem é responsável, uma vez que ninguém está dirigindo eles”, disse.

A preocupação do executivo é consenso entre pesquisadores –embora o assunto ainda seja pouco citado como prioridade dos órgãos de regulação dos países. Pesquisa conduzida ano passado com 200 cientistas, acadêmicos e especialistas de todo mundo pelo Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos (IEEE) mostrou que, na visão dos entrevistados, a responsabilidade legal, os fatores políticos e a aceitação do consumidor são consideradas os maiores entraves para a adoção em massa dos carros autônomos.

Para a maioria dos entrevistados (75%), a aprovação de uma legislação nos Estados Unidos permitindo o uso de veículos sem condutor pode demorar até mais de 20 anos. A lentidão em oferecer uma resposta e um arcabouço legal tanto aos consumidores quanto às empresas que oferecem serviços e produtos disruptivos tem sido uma barreira comum para a adoção de novas tecnologias, lembra o gestor do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio, Luiz Moncau.

“Vemos muito o poder público errando a mão e sendo reativo em relação à tecnologia, com uma certa aversão ao novo. Isso gera insegurança jurídica, porque muitas empresas não tomam o risco de empreender em determinadas áreas porque não sabem se essa máquina ou serviço poderão ser usados depois”, afirma Moncau. “Em certos momentos, não ter regra é bom porque permite o livre desenvolvimento do mercado, mas em outros, é ruim, porque esse mesmo mercado não sabe como agir”, completa. (RW)

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]