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Corey Williams, à direita, depois de ser solto da Penitenciária de Louisiana, acompanhado de dois de seus advogados. | Amir AliCourtesy photo
Corey Williams, à direita, depois de ser solto da Penitenciária de Louisiana, acompanhado de dois de seus advogados.| Foto: Amir AliCourtesy photo

Em janeiro de 1998, Corey Dewayne Williams estava no bairro Queensborough, em Shreveport, no estado americano de Luisiana, quando um entregador de pizza foi baleado e morto. 

Na época, Williams era um jovem de 16 anos de idade com deficiência intelectual, de acordo com os registros do julgamento. “Ele ainda chupava o dedão, frequentemente urinava nas roupas e comia lixo e papel”, escreveram seus advogados em um registro. Depois do crime, ele fugiu, e quando a polícia lhe perguntou sobre o assassinato de Jarvis Griffin, o entregador de 23 anos, Williams confessou. E então disse que estava “pronto para ir para casa e deitar”. 

Ele foi acusado de assassinato e julgado, recebendo então uma sentença de morte – que depois seria alterada para prisão perpétua. Mas na terça-feira, mais de duas décadas depois da sua prisão, Williams saiu livremente pela porta da prisão. 

A sua liberdade foi o resultado de uma reviravolta surpreendente na qual as autoridades de Luisiana, que discordaram de recursos do caso durante vários anos, reverteram o curso e chegaram em um acordo com os advogados de defesa. O caso de Williams atraiu um apoio de alto nível, incluindo ex-procuradores públicos federais e funcionários do Departamento de Justiça dos EUA – entre eles Michael Mukasey, ex-procurador geral. Essas pessoas tiveram uma grande influência na solução do caso, principalmente no começo desse ano. 

Acordo

No novo acordo, realizado na segunda-feira, a sentença e a penalização por assassinato de primeiro grau foram retiradas. Williams, agora com 36 anos, foi declarado culpado por assassinato involuntário e obstrução da justiça e foi sentenciado pelo tempo que já cumpriu. 

“Para todos os envolvidos, esse tem sido um caso de doer o coração”, disse Amir Ali, um advogado do MacArthur Justice Center, um escritório de advocacia civil que ajudou a representar Williams. “Era um acordo que não podia ser negado. Dadas as circunstâncias, foi o melhor resultado possível para Corey”. 

Os defensores de Williams entraram com um pedido para que a Suprema Corte dos EUA ouvisse o caso, o que deveria ser respondido pelo estado de Luisiana até a metade de junho. As autoridades do estado decidiram acabar com o caso em vez de levá-lo para a corte suprema. 

Em uma proposta conjunta, os advogados que representam Williams afirmaram que o estado manipulou a investigação do caso, alterando relatos de testemunhas, transcrições e relatórios de polícia. Eles concluíram que os direitos constitucionais de Williams “provavelmente foram violados no julgamento original” e pediram que o juiz retirasse a condenação e a sentença originais. 

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Em resposta a um pedido de entrevista, o escritório do advogado de defesa James Stewart enviou um depoimento de Suzanne Owen Williams, uma promotora assistente, publicado na segunda-feira. 

“Várias questões foram levantadas sobre o caso, inclusive algumas questões legais, mas hoje tudo foi resolvido em um acordo”, ela disse. O escritório de Stewart também ressaltou que, como parte do acordo, Williams concordou em abrir mão de recorrer com alegações de responsabilidade civil. 

Confissão

Williams tinha acabado de completar 16 anos quando Griffin foi morto. Griffin tinha entregado pizzas e retornado ao seu carro quando alguém atirou em seu veículo, de acordo com um resumo do caso feito pela Corte Suprema de Luisiana. Uma das balas perfurou os dois pulmões de Griffin e penetrou parte de seu coração. Depois, alguém roubou o dinheiro e as pizzas que estavam no carro. 

A polícia falou com testemunhas que afirmaram que Williams atirou, o que levou à prisão dele, segundo os registros. De acordo com os advogados de Williams, ele foi para a casa da avó depois do tiroteio; segundo o relatório, a polícia o encontrou “escondido debaixo de um lençol no sofá”. 

Inicialmente, Williams apontou para uma das outras pessoas presentes como culpado. Então, algumas horas depois, ele confessou para a polícia. Williams disse que ele e a outra pessoa resolveram roubar o entregador, mas que ele que atirou quando achou que Griffin estava procurando por uma arma, segundo a Suprema Corte de Luisiana. 

“Estou cansado”, ele teria dito então para os policiais, segundo um relatório. “Estou pronto para ir para casa e deitar”. 

Confissões falsas são uma característica recorrente em muitos casos que envolvem pessoas condenadas por crimes que foram absolvidas mais tarde. No ano passado, 139 pessoas inicialmente condenadas foram absolvidas; sendo que uma em cada cinco fez uma confissão falsa, de acordo com registros nacionais. 

A batalha judicial de Williams se prolongou enquanto ele ainda continuava preso. Em 2002, a Corte Suprema de Luisiana reafirmou a sentença de Williams mas enviou o caso para uma instância inferior para determinar se ele poderia ser executado.

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No mesmo ano, a Corte Suprema dos EUA decidiu no caso Atkins versus Virginia que executar alguém com retardos mentais violava a proibição constitucional contra punições cruéis e incomuns. A partir disso, foi decidido que Williams se enquadrava nessa descrição, fazendo com que recebesse a sentença de prisão perpétua. 

Vítima de armação

Os defensores de Williams disseram que o caso é problemático desde o começo. “Nenhuma evidência material” ligava ele ao assassinato, eles disseram, acrescentando que foram encontrados vestígios do sangue de Griffin na roupa da pessoa apontada inicialmente por Williams como o responsável pelos tiros. O dinheiro e as pizzas roubados também foram encontrados perto da casa dessa mesma pessoa. Outras questões foram levantadas, apontando para que, apesar da jurisprudência exigir evidências materiais para se realizar a sentença e a punição de um caso, as autoridades de Luisiana disponibilizaram apenas resumos das entrevistas com testemunhas, não as entrevistas completas. 

Essa questão foi central para a carta arquivada na Suprema Corte dos EUA apoiando Williams assinada por funcionários do Departamento de Justiça e ex-procuradores. Na carta, 44 pessoas – democratas e republicanos – disseram temer que “nesse caso, os promotores estaduais fizeram uma interpretação muito restrita de suas obrigações”. 

As entrevistas com as testemunhas, eles argumentaram, mostravam que Williams poderia ser vítima de uma armação, e que, se as entrevistas estivessem na íntegra, haveria “uma grande chance do veredito ser diferente”. 

Existem várias questões quanto ao caso, incluindo a confiabilidade da confissão de Williams, disse Mary McCord, professora visitante de direito da Universidade de Georgetown e ex-chefe da Divisão de Segurança Nacional do Departamento de Justiça, uma das pessoas que escreveu a carta. 

“Eu já fui promotora e certamente já acreditei em confissões durante a minha carreira”, ela afirmou em uma entrevista. “Mas esse é um dos motivos pelos quais as confissões devem ser confirmadas pelas evidências: porque existem vários motivos pelos quais confissões não são confiáveis… e uma razão bem importante é a ocorrência de uma deficiência intelectual por parte da pessoa que faz a confissão”. 

Liberdade

McCord chamou o caso de “farsa” e disse que estava feliz que Luisiana não tentou lutar para manter Williams preso. Ela disse que a única coisa que a perturba quanto ao resultado é que a Corte Suprema não vai rever o caso, o que poderia dar um esclarecimento maior quanto ao tipo de informação que foi negada. Ainda assim, ela disse, isso poderia ter mantido Williams preso ainda por muitos anos. 

“Esse é um homem jovem que já foi mantido preso por um grande período de tempo, inicialmente no corredor da morte e depois por prisão perpétua em um ambiente bem pesado”, ela disse. 

Uma equipe de advogados, incluindo Blythe Taplin e Ben Cohen, da organização sem fins lucrativos Promise of Justice Initiative, passou anos representado Williams, reexaminando o caso, escrevendo petições e trabalhando para assegurar a liberdade. A mesma juíza de Luisiana que aprovou a liberdade dele, Katherine Dorroh, já tinha recusado antes alegações que favoreciam Williams. 

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Ali, um dos advogados de Williams disse que o caso era “uma tragédia completa” e que valia a pena aceitar o acordo – mesmo com a manutenção da acusação de culpa – para poder libertar Williams agora. Quando ele saiu da prisão na manhã de terça-feira, ele já tinha passado mais tempo da sua vida preso do que solto. 

“Corey é uma das pessoas mais amáveis que você pode conhecer”, disse Ali. “Ele estava maravilhado por poder ir para casa… como você pode imaginar, depois de passar 20 anos preso sem motivo, a alegria de ser libertado é difícil de ser contida”.

Tradução por Gisele Eberspächer

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